O PLP 108, em tramitação no Senado, propõe criar a Câmara Nacional de Integração do Contencioso do IBS e CBS para resolver divergências interpretativas entre esses tributos gêmeos. À primeira vista, parece uma solução inteligente. Na prática, pode se tornar um pesadelo burocrático que compromete a eficiência do sistema tributário.
Problema fundamental: ampliação excessiva de competências
A proposta comete um erro conceitual grave ao permitir que qualquer divergência sobre “legislação comum” seja levada diretamente à Câmara Nacional, mesmo quando ocorre apenas entre órgãos de um único contencioso. Isso significa que uma divergência entre câmaras recursais do IBS sobre tema comum não será mais resolvida pela Câmara Superior do IBS, mas sim pela Câmara Nacional.
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O resultado? O recurso de uniformização – mecanismo natural para resolver divergências internas – perde quase toda sua utilidade. É como criar um tribunal superior para resolver brigas de vizinhos que poderiam ser solucionadas no condomínio.
Dicotomia problemática: legislação comum vs. específica
O PLP 108 cria uma distinção artificial entre legislação comum e específica que gerará mais problemas do que soluções. O exemplo mais emblemático é o “local da operação” – tecnicamente legislação comum, mas na prática relevante apenas para o IBS.
Para a CBS, o local da operação é sempre “território nacional”. Para o IBS, é questão central que define alíquotas e distribuição de receitas entre estados e municípios. Faz sentido levar divergências sobre esse tema para julgadores federais que não têm interesse prático na discussão? Obviamente não.
Fracionamento processual: caos anunciado
Imagine um processo com divergências sobre legislação comum E específica. O contribuinte terá que fracionar seus recursos: parte vai para a Câmara Nacional (recurso especial), parte para a Câmara Superior específica (recurso de uniformização). Um mesmo caso pode ter três órgãos decidindo aspectos diferentes, criando potencial para decisões contraditórias.
É a receita perfeita para transformar um processo simples em uma maratona burocrática interminável.
Sobrecarga e morosidade: efeito dominó
Ao drenar competências das Câmaras Superiores específicas, o PLP 108 criará um gargalo na Câmara Nacional. Questões que poderiam ser resolvidas rapidamente por especialistas em cada tributo ficarão empilhadas em um órgão sobrecarregado com composição mista.
O resultado será exatamente o oposto do pretendido: mais morosidade, não menos.
Solução ignorada: uso residual
A solução é simples e óbvia: usar a Câmara Nacional apenas quando realmente necessário. Primeiro, esgotar os recursos de uniformização em cada contencioso. Só depois, se ainda houver divergência entre decisões definitivas do IBS e CBS, acionar a Câmara Nacional.
Essa abordagem preservaria a especialização técnica, evitaria sobrecarga e manteria a simplicidade processual. Mas aparentemente, simplicidade não está na moda.
Conclusão: oportunidade desperdiçada
A integração dos contenciosos do IBS e CBS é necessária e bem-vinda. Mas não a qualquer preço. O PLP 108, em sua versão atual, transforma uma necessidade legítima em uma engenharia burocrática desnecessariamente complexa.
É hora de repensar a proposta antes que ela se torne lei. O contribuinte brasileiro merece um sistema mais simples, não mais complicado. A reforma tributária deveria facilitar a vida das pessoas, não criar novos obstáculos burocráticos.