No Brasil, decisões judiciais ou episódios de tensão institucional sempre foram parte do cenário político-econômico. Mas, nos últimos anos, essas ocorrências ganharam nova dimensão, não apenas repercutem no discurso público, mas impactam diretamente nas decisões empresariais, desde investimentos, estrutura de contratos, até a forma como empresas gerenciam risco e reputação.
Um julgamento de ex-presidentes ou sentenças com forte apelo simbólico, por exemplo, podem reforçar ou abalar percepções de segurança jurídica. Investidores estrangeiros e instituições financeiras olham atentamente para como as regras são aplicadas, para a previsibilidade dos atos do Estado e para a independência do Judiciário. Quando essa previsibilidade parece ameaçada, custos implícitos aumentam: prêmio de risco, taxas de financiamento, taxas de câmbio, seguro político etc.
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Além desses custos implícitos, choques institucionais no Brasil podem ser observados nos dados de mercado, o prêmio de risco do país historicamente se amplia durante crises judiciais ou políticas, como no auge da Lava Jato ou em decisões relacionadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro, sinalizando um risco ao país maior.
A volatilidade cambial frequentemente acompanha crises institucionais, afetando diretamente empresas com exposição em moeda estrangeira. E, quando os investidores percebem imprevisibilidade judicial, os spreads das taxas de juros locais se alargam, elevando o custo de capital e tornando o financiamento mais caro.
Esses impactos não ocorrem apenas nos grandes negócios de M&A ou em setores fortemente regulados; reverberam em contratos privados, concessões, parcerias estratégicas, licitações públicas, internacionalização e até no planejamento tributário. Uma empresa que já previu investimento em expansão, nacional ou internacional, pode repensar o cronograma ou adiar expansões diante de julgamentos ou decisões que sinalizem instabilidade institucional.
A consequência é que cada vez mais, no Brasil, empresas reconhecem que não há “parte técnica” pura: o ambiente político-legal faz parte do custo de fazer negócio. Nesse cenário, emergem demandas por consultoria estratégica que vá além da mera operação ou finanças, que inclua gestão de riscos institucionais, modelagem de cenários regulatórios, due diligence reputacional, compliance robusto e antecipação de litígios.
É por isso que muitas empresas estão incorporando salvaguardas em seus contratos para lidar com a incerteza institucional. Cláusulas de arbitragem, a escolha de legislação internacional como regência e uma redação mais flexível de força maior tornaram-se cada vez mais comuns. Ao mesmo tempo, os investidores exigem que o planejamento de cenários incorpore riscos político-legais, além das premissas operacionais ou de mercado. A credibilidade de um projeto ou operação agora depende não apenas dos fundamentos de negócio, mas também da robustez de sua modelagem de risco institucional.
Empresas brasileiras e multinacionais que atuam no país têm destacado, de forma recorrente, que riscos políticos, regulatórios e reputacionais estão entre as principais fontes de incerteza nos negócios. Nesse ambiente, aspectos como governança, transparência, controles internos e litígios inesperados se tornaram variáveis centrais na avaliação de projetos e contratos.
Um caso que ilustra bem como a política e a interpretação legal podem alterar expectativas de mercado envolve a Lava Jato. Ao longo de mais de uma década, a operação revelou esquemas de corrupção envolvendo grandes empresas e agentes públicos, gerando punições, bloqueios de bens e alterações contratuais significativas.
No entanto, muitas decisões foram posteriormente anuladas ou revisadas pelo STF, e diversas condenações perderam validade. A consequência foi uma percepção de instabilidade jurídica e uma crescente dificuldade para investidores e empresas nacionais e internacionais confiarem plenamente no sistema judicial brasileiro. A surpresa não foi apenas o impacto econômico inicial, mas o fato de que entendimentos antes considerados consolidados foram revertidos, criando incerteza sobre contratos, investimentos e direitos societários.
O ponto é que, em casos de grande porte como as observadas na Lava Jato, a interpretação de leis e contratos não é puramente técnica: fatores institucionais e o contexto político, como períodos de instabilidade, pressões sobre o Judiciário e alterações de entendimento nas cortes superiores, podem influenciar diretamente o resultado.
Esse tipo de influência política na justiça brasileira gerou críticas e questionamentos sobre a imparcialidade do sistema judicial, afetando a credibilidade de decisões previamente consideradas consolidadas. Quando o ambiente político está instável, decisões judiciais com impacto econômico relevante podem ser interpretadas pelo mercado não apenas como resultado de análise técnica, mas também como reflexo do contexto político-institucional, aumentando a percepção de risco e a cautela de investidores.
Essa percepção é corroborada por análises internacionais que destacam a crescente preocupação com a estabilidade política e institucional no Brasil. O Financial Times, por exemplo, destacou recentemente que a condenação do ex-presidente Bolsonaro, embora cercada de críticas sobre falhas processuais, simboliza o quanto a polarização e os desafios à democracia brasileira têm colocado o país em um momento crítico de sua trajetória institucional.
Para investidores, esse tipo de instabilidade reforça que eventos políticos internos podem ter repercussões significativas no ambiente de negócios, afetando diretamente a confiança e a previsibilidade econômica.
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Para as empresas, a lição é clara: fortalecer governança e compliance não é apenas uma questão de obrigações regulatórias, mas também de sinalizar resiliência e credibilidade a credores, investidores e parceiros de negócios em períodos de deterioração institucional. Transparência na comunicação e planejamento de cenários testados sob estresse ajudam a preservar o acesso a financiamento.
Empresas que conseguem demonstrar disciplina em governança e adaptabilidade em estratégia se destacam quando a volatilidade aumenta, garantindo a continuidade de relacionamentos e projetos.
Em suma, eventos com forte impacto jurídico ou político não são apenas “assuntos de política”; são marcos que reconfiguram premissas de negócio. Quem antecipa, modela, estrutura e comunica bem, ganhando credibilidade e adaptabilidade, estará muito melhor posicionado para prosperar nesse ambiente volátil.