Transição energética depende do transporte, diz diretor do Sistema Transporte

“A eficiência do Brasil passa pelo transporte”, afirma Vinícius Ladeira, diretor adjunto nacional do SEST SENAT e líder do projeto COP 30 no Sistema Transporte. No contexto do combate às mudanças climáticas, o diretor aponta o papel central do setor de transporte e garante que há um consenso na área a respeito da necessidade da transição energética: “É um assunto que não tem como andar para trás”.

Com a proximidade da 30ª Conferência do Clima, a COP, que acontece este ano em Belém, e a urgência em se tratar temas como a transição energética e a descarbonização, Vinícius Ladeira falou ao Estúdio JOTA sobre as principais iniciativas do setor, os desafios e as soluções encontradas por eles.

De acordo com Ladeira, a COP 30 é uma oportunidade para que novas medidas de mitigação passem a ser implementadas. “Nossa expectativa é que essa agenda tome força e o setor se posicione de uma forma muito clara”, diz. “Podemos e queremos muito contribuir”, completa. Confira a entrevista na íntegra a seguir:

Qual é a agenda e o posicionamento do Sistema Transporte sobre a transição energética no país?

O Sistema Transporte tem o papel de protagonista na interlocução estratégica entre os setores privado, público, a academia e a sociedade. Temos o trabalho de articular posicionamentos variados em algo único e consensual. Fazemos a interlocução acontecer para que os assuntos caminhem, para tirar iniciativas do campo das ideias e torná-las real.

E o Sistema está envolvido na questão ambiental há muitos anos, não é algo recente por causa da COP no Brasil. O Sistema Transporte, formado pela Confederação Nacional do Transporte, o SEST [Serviço Social do Transporte], o SENAT [Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte] e o ITL [Instituto de Transporte e Logística] atua há anos para levar o setor para uma coisa que a gente viu que não tem volta, que é a transição energética. Nossa atuação é mais propositiva do que reativa.

Quais as iniciativas do setor para a descarbonização?

Articulamos 50 instituições de diferentes modais na Coalizão para a Descarbonização dos Transportes, por exemplo, com o objetivo de traçar um plano estratégico com um consenso do que seria melhor para a sociedade como um todo. O movimento caminhou para um equilíbrio entre os modais do setor. Isso é importante, pois o transporte rodoviário tem um peso grande, enquanto o ferroviário e o aquaviário, têm uma pegada de carbono menor. Então, um dos pontos é impulsionar o crescimento dos modais aquaviário e ferroviário, sem decrescer o rodoviário. Tem espaço para todos.

Outra iniciativa é a renovação acelerada de frota. Caminhões antigos são mais poluidores, emitem mais carbono, então é importante focar na substituição das frotas por veículos mais modernos.

Destaco que não existe uma solução única para o setor que enfrenta um problema que é muito complexo. São várias ações que precisam ser feitas para a descarbonização do setor. 

Quais os principais desafios para a descarbonização?

O principal desafio está em trilhar um novo caminho. É preciso olhar para o futuro, criar soluções e esperar que elas sejam eficientes lá na frente. Entendemos que as dificuldades de desenhar uma política pública são reais, mas o poder público é quem pode flexibilizar normas e criar incentivos e o Sistema Transporte deve analisar se as ações fazem sentido economicamente. 

Quais as soluções e o que é necessário para viabilizá-las?

Precisamos olhar cada uma das soluções. Por exemplo, o diesel verde, que tem características muito semelhantes ao diesel de petróleo, não exige a troca de motores. Isso permite o uso desse combustível em ônibus e caminhões que já estão rodando.

Outro ponto são os veículos elétricos. Acreditamos que os veículos rodoviários elétricos serão os mais eficientes para pequenas distâncias e dentro das cidades, até porque existe a necessidade de infraestrutura de carregamento. Para distâncias superiores a 500 km, o ideal é apostar na cabotagem e nas ferrovias – modais com emissões menores e maior eficiência logística.

Qual é a percepção geral entre os diversos atores do setor a respeito da transição energética? Há um consenso de que se deve apostar em novas fontes de energia ou ainda há resistência?

Existe uma clareza do setor de que a transição energética é um tema sem retorno. A transição energética vai acontecer e é bom que seja com a nossa participação. 

A Coalizão para a Descarbonização dos Transportes foi pensada neste sentido. O documento assinado por 50 atores diferentes mostra que o setor quer fazer parte da discussão sobre a transição energética.

Todos os integrantes foram uníssonos em dizer que precisamos propor soluções. Está muito claro que precisamos caminhar para a descarbonização do setor. Assim, caminhamos na direção da opinião da sociedade.

Como o assunto será abordado na COP30 pelo Sistema Transporte e o que mais será apresentado pela instituição na conferência?

A participação da COP vem ocorrendo há alguns anos por entender que é um posicionamento estratégico importante do setor. Já participamos de outras edições, com um fortalecimento na COP do ano passado, e a gente já participa por exemplo do Pacto Global [iniciativa de sustentabilidade corporativa da ONU].

Leia mais: Setor de transporte foca em inovação logística na COP30

Soltamos um edital pedindo cases de sucesso do setor e estamos na fase de avaliação dos exemplos escolhidos que serão apresentados na COP. Uma das histórias de destaque é a de uma empresa brasileira que faz reciclagem de veículos antigos. A renovação da frota, que falei anteriormente, depende da retirada de veículos antigos de circulação com uma destinação adequada. Expor esse e outros exemplos pode resultar na atração de investidores estrangeiros e de oportunidades de negócios.

Vamos levar os casos reais para a Estação do Desenvolvimento que é o espaço que organizamos, onde haverá debates com instituições públicas. Possivelmente, também teremos participação na Blue Zone e Green Zone – locais para negociações entre governos e delegações, e para realização de eventos, exposições e debates.

Qual a expectativa do Sistema Transporte a respeito do que se pode atingir na COP30?

Todos os olhares estarão focados na COP30, mas pensamos no pós-evento, no que vai ficar quando a conferência terminar. Nossa expectativa é de que a agenda tome força e o setor se posicione de uma forma clara. 

O embaixador [André Corrêa do Lago, presidente-designado da COP30] falou [em evento do Jota no dia 29 de agosto] que essa é a COP da implementação. Muito se discutiu e chegou o momento de trazer soluções e buscar caminhos para que as mudanças aconteçam. 

Como se dá, na prática, o papel de mobilizador e articulador multissetorial do Sistema Transporte para implementar iniciativas de descarbonização, tendo em conta a complexidade de convergir tantos agentes econômicos, com perfis e interesses diversos e, por vezes, contraditórios?

É uma função de articulação profunda que precisa respeitar interesses divergentes, porque os setores atuam em frentes divergentes. Queremos atuar nas convergências. Por exemplo, no Plano Clima conseguimos nos posicionar de forma harmônica, trazendo um posicionamento do setor. É um papel de entender as dificuldades e qual seria o posicionamento do setor.

A eficiência do Brasil passa pela eficiência do transporte. Outros setores da economia também estão na mesma caminhada e todos eles, sem exceção, em algum momento passam pelo setor de transportes. O Brasil não pode ser mais eficiente, se o setor de transporte não for mais eficiente.

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