Na sessão desta quarta-feira (10/9), na 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luiz Fux votou pela absolvição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no julgamento da trama golpista de 2022. Ele divergiu do relator, Alexandre de Moraes, e do ministro Flávio Dino, que já haviam se manifestado pela condenação.
O placar está em 2×1 pela condenação do ex-presidente, integrante do núcleo 1 – apontado como crucial na trama golpista. Faltam apenas os votos dos ministros Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, presidente da 1ª Turma.
“Não há provas suficientes para imputar a Jair Messias Bolsonaro os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Resta, então, a imputação do delito de organização criminosa, a respeito do qual já esclareci que um suposto plano criminoso, por si só, não basta para caracterizá-la”, disse Fux.
O julgamento continua nesta noite com a leitura do voto de Fux sobre os demais réus. Até o momento, ele se manifestou pela absolvição de Bolsonaro e do almirante Almir Garnier. No caso do réu colaborador Mauro Cid, Fux votou pela condenação pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
As divergências de Fux não param por aí. Ao julgar as preliminares do caso, o ministro Fux afirmou que o caso deveria ser anulado porque o STF não teria competência pra julgá-lo. Na visão do ministro, a competência seria da primeira instância.
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As opiniões de Fux sobre os atos de Jair Bolsonaro
Dentre outros pontos, Fux afastou a responsabilidade de Jair Bolsonaro pelos atos de 8 de janeiro. Ele entendeu que não há nexo causal entre os discursos do ex-presidente durante a campanha e a invasão das sedes dos Três Poderes em 2023. “Ainda que se pudesse sustentar que houve incentivo à violência, seria necessário demonstrar que o resultado foi consequência provável e previsível daquela manifestação de vontade”, afirmou.
O ministro também rejeitou a acusação de que Bolsonaro teria utilizado a Abin de forma ilegal para estruturar uma “Abin paralela”. Para ele, a atuação do órgão, ainda que por meios reservados, limitou-se à coleta e análise de informações previstas em lei, sem aptidão para configurar crime contra o Estado Democrático de Direito. “A atividade de inteligência, ainda que com desvio de finalidade, não tem nenhuma aptidão para configurar o crime previsto no artigo 359-M do Código Penal”, afirmou ao descartar as imputações.
O questionamento das urnas eletrônicas e a atuação da Justiça Eleitoral também foram temas discutidos por Fux em seu voto. Para ele, a simples apresentação de ações ou representações ao TSE não pode ser criminalizada como atentado ao Estado Democrático de Direito, já que constitui exercício da garantia constitucional de acesso à Justiça. “Representar o Tribunal Superior Eleitoral não é crime, é garantia de acesso à Justiça”, afirmou. O ministro acrescentou que, em seu interrogatório, Bolsonaro “reforçou sua postura de boa-fé” e que sua intenção era buscar a verdade dos fatos sobre o funcionamento do sistema de votação.
Fux também analisou as acusações de que a Polícia Rodoviária Federal (PRF) teria atuado para dificultar a votação de eleitores no dia 30 de outubro de 2022. O ministro destacou que o Ministério Público não apresentou provas de ciência ou participação de Bolsonaro nesses fatos, restringindo-se a atribuir condutas a Anderson Torres, Silvinei Vasques e outros ex-integrantes do governo. “Quanto a isso, o Ministério Público, em momento algum, apresentou provas da ciência ou da participação de Jair Bolsonaro nos fatos”, afirmou, ao rejeitar a responsabilização do ex-presidente.
Quanto à minuta do golpe, Fux afirmou que ela não passava de uma carta de lamentações e, quando muito, teria sido apenas mera cogitação ou atos preparatórios, de forma que a conduta relacionada não seria punível. “Aconteceu alguma coisa? Nada. Não há nenhum elemento indicando que essa versão da minuta tenha sido apresentada a Jair Bolsonaro ou aos comandantes das Forças Armadas”, afirmou. Ele ressaltou que as reuniões apontadas pela PGR ocorreram em novembro de 2022, mas a primeira versão da minuta só teria surgido em dezembro, o que demonstra contradição na narrativa acusatória.
Na sequência, o ministro destacou os depoimentos de Cid e de comandantes militares, que reforçaram a ausência de atos executórios. “O presidente não assinaria esse documento”, declarou Cid, ao afirmar que qualquer medida dependeria de ordem formal de Bolsonaro. Para Fux, esses relatos evidenciam que as discussões permaneceram no campo da mera cogitação, sem que houvesse efetiva preparação para um golpe.
Demais réus
Luiz Fux votou pela condenação do colaborador Mauro Cid pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Segundo ele, o cotejo das acusações com as provas nos autos comprova a participação do ex-ajudante de ordens no plano golpista, sendo que a própria colaboração premiada resultou em “autoincriminação involuntária”.
O ministro ressaltou que o crime de golpe de Estado está absorvido pela tentativa de abolição violenta, afastando condenação específica nesse ponto. Já quanto às acusações de organização criminosa e de dano qualificado, absolveu Cid, ao afirmar que não há provas de que ele tenha integrado grupo estruturado para a prática indeterminada de crimes.
No voto sobre o almirante Almir Garnier, o ministro Luiz Fux afastou todas as imputações. O então chefe da Marinha, segundo Fux, não convocou as tropas para apoiar o golpe de Estado, de forma que entre apoio à tentativa golpe e prestação de auxilio há uma enorme distância que não foi percorrida pelo réu.
“Os pensamentos e desejos criminosos escapam à consideração do Direito Punitivo – a participação em reuniões e a colocação das tropas à disposição só seriam punidas se houvesse início de execução dos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado”, afirmou.