Sem Magnitsky contra Moraes, bolsonarismo busca hospedeiro para sobreviver

Jair Bolsonaro preso, Flávio presidenciável, Tarcísio fazendo corpo mole, Eduardo fazendo jus à alcunha de bananinha, Carla Zambelli renunciando ao mandato de deputada federal, Trump e Lula com a química lá no alto, Moraes sem Magnitsky.

O ano termina em baixa para a extrema direita brasileira perante seus pares globais, sem que isso necessariamente signifique o empoderamento da atual coalizão de centro-esquerda que governa o país. Tampouco são definitivos os prognósticos sobre o fortalecimento da democracia brasileira. Ainda navegamos em meio à tormenta, que não dá sinais de arrefecimento. Prova disso é aprovação do infame PL da Dosimetria, que beneficia não somente o ex-presidente e demais golpistas de 8 de Janeiro, mas também criminosos comuns.

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A própria escolha do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) como candidato do campo bolsonarista, que domina a direita brasileira, sugere uma mudança de tática para que o reacionarismo volte ao poder. Corroer as instituições por dentro e, portanto, desmantelar a democracia aos poucos é a principal característica da chamada ultradireita contemporânea, que se divide entre direita radical (que não busca o autoritarismo, mas erode o liberalismo) e a extrema direita (que ambiciona superar o regime democrático). Na busca pelo poder, políticos de ambos os subcampos costumam encenar certa moderação, atraindo, assim, o eleitor centrista.

Não foi o caso do que se passou com o bolsonarismo no Brasil. Apenas aqueles ingênuos ou prenhes de má-fé não sabiam o que haviam escolhido quando votaram em Bolsonaro pai em 2018. Mais que um outsider, o agora encarcerado nas dependências da Polícia Federal em Brasília era um congressista com quase 30 anos de parlamento nas costas, com sete mandatos de deputado federal gastos para propagar diatribes contra a democracia, defender torturadores e praticar muita rachadinha, além, claro, de ter inaugurado uma dinastia nefasta que tem o potencial de ainda assombrar o país por décadas e décadas.

A aposta no extremismo declarado tinha sido redobrada quando Eduardo Bolsonaro, ainda deputado federal pelo PL-SP, fugiu para os Estados Unidos para articular sanções contra o Brasil. A imposição do tarifaço de 50% a produtos brasileiros em julho passado e sujeição de Alexandre de Moraes e esposa à chamada pena de morte financeira no âmbito da Lei Magnitsky deram a impressão de que o governo do republicano Donald Trump chegaria ao ponto de sufocar o atual governo brasileiro a ponto de inviabilizar a reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e forçar o eleitorado a escolher um bolsonarista como seu sucessor.

Se a moderação relativa de Flávio será capaz de convencer o centrão de sua viabilidade como candidato presidencial, apenas os próximos meses dirão. O mercado, porém, já demonstrou ter ojeriza à ideia haja vista que, após o anúncio de que ele tinha sido ungido pelo pai, a Bolsa caiu e o dólar subiu.

Isso porque a Faria Lima e adjacências sabem que a maior chance de levar ao Planalto um candidato com a agenda bolsonarista é apresentando-o como um não bolsonarista, coberto de um verniz centrista, (supostamente) sujeito ao controle do establishment.

Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, é ainda o preferido daqueles que dão as cartas no cenário político-econômico nacional para assumir tal papel. Se ele não puder ou não quiser por demonstrar lealdade canina a Bolsonaro pai, há a opção Ratinho Junior (PSD), governador do Paraná que já demonstrou credenciais para avançar uma agenda de redução de direitos e, portanto, propícia a solapar a Constituição nas mais diversas frentes.

Os demais governadores de direita que se apresentam como presidenciáveis não merecem ser discutidos neste espaço, pois pouco pontuam nas pesquisas de intenção de voto e são demasiadamente regionalizados para pensarem num projeto nacional. Michelle Bolsonaro não terá vez num meio tão misógino.

Não importa o nome: o bolsonarismo raiz, encarnado na figura de Jair, busca um hospedeiro, preferencialmente com o sobrenome do qual se deriva a denominação do maior movimento de extrema direita do país. Sua origem é social: há uma demanda por extremismo de direita e, convenientemente, o grande capital pode seguir aliado a esse movimento se não encontrar alternativa melhor para derrotar Lula e seus acertos redistributivos em 2026.

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O caráter revolucionário do bolsonarismo ainda encontrará eco significativo no eleitorado enquanto houver no establishment relações promíscuas como as recentemente expostas no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) envolvendo o Banco Master. Para os extremistas — sejam eles explícitos ou enrustidos —, o melhor cenário a ser vendido ao eleitor é o de colapso das instituições e, portanto, da ordem constitucional de 1988.

Convém não dar corda para os golpistas, mas falta combinar com aqueles que dizem defender a democracia, muito embora também se preocupem com seus próprios interesses. Porém, não se enganem: ainda que o sistema atual não demonstrasse sinais de exaustão, os golpistas arranjariam uma desculpa para derrubar a atual ordem político-jurídica. Os vícios são privados. Os prejuízos, públicos.

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