Benefício fiscais para fundo patrimonial cultural

O Ministério da Cultura, recentemente, regulamentou o uso dos incentivos fiscais previstos na Lei Rouanet para constituição ou incrementação de fundos patrimoniais para instituições culturais no Brasil. É um passo importante para o fortalecimento e longevidade de museus, orquestras, e espaços culturais em geral. O fundo patrimonial, também conhecido como endownment, é um mecanismo muito forte e recorrente nos EUA que acumula total estimado de US$ 1,5 trilhões, e, nas últimas décadas, passou a ser disseminado em vários lugares no mundo e também no Brasil, que possui aproximadamente 122 fundos com R$ 137 bilhões[1].

De fato, instituições que obtêm doações expressivas ou engajam um grande volume de doadores recorrentes têm diversas vantagens como o privilégio de poder planejar suas atividades com antecedência, o afastamento do risco financeiro, a garantia de sua longevidade, e, especialmente, a liberdade de atuação e discurso, uma vez que não precisam se render a narrativa de um financiador chave, seja público ou privado. No Brasil, a Revista Piauí é um exemplo de publicação independente e consistente mantida por um fundo patrimonial de R$ 440 milhões. Outras instituições culturais brasileiras como por exemplo Instituto Moreira Salles (IMS), Instituto Acaia e Fundação Itaú também contam fundos que garantem a independência em relação a seus fundadores ou mantenedores.

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Apenas em 2019 foi regulamentada no Brasil, pela Lei 13.800, a constituição de fundos patrimoniais para educação, ciência, tecnologia, pesquisa, inovação, cultura, saúde, meio ambiente, assistência social, desporto, segurança pública, direitos humanos e a demais finalidades de interesse público. Até então, os fundos eram constituídos através de outros formatos jurídicos, como trusts ou fundos financeiros com governança própria. Essa legislação específica contribuiu para fortalecer e institucionalizar o mecanismo, auxiliando também na sua divulgação e no processo de implementação.

Como regra geral, os fundos patrimoniais são constituídos com a missão de construir um patrimônio perpétuo, ou pelo menos longevo, para instituições sem fins lucrativos. O objetivo é gerar incremento do patrimônio principal e recursos contínuos através, especialmente, dos juros de aplicações financeiras, mas também provenientes de aluguéis, de licenciamento de propriedade intelectual ou de marcas, de administração e venda de imóveis, de bens legados etc. A gestão deve perseguir resultados acima da inflação, de forma a recapitalizar o patrimônio recorrentemente, bem como permitir que a instituição vinculada ao fundo possa utilizar parte do resultado financeiro tanto na sua manutenção e viabilização de suas atividades quanto em situações emergenciais, sempre conforme definido pelos doadores e pela governança do fundo.

O projeto da Lei 13.800/19 previa benefícios fiscais para doação aos fundos de diversas áreas, mas foram vetados por questões relacionadas às regras de responsabilidade fiscal. Excepcionalmente, foram mantidos para área da cultura, através do uso dos incentivos fiscais previstos na lei Rouanet (Lei 8.313/91). A Instrução Normativa 26 de 10 de outubro de 2025, regulamentou recentemente o uso dos incentivos, permitindo que muitas instituições culturais comecem a planejar a captação de recursos específica para essa finalidade. De acordo com essa norma, a organização gestora do fundo patrimonial cultural deverá ser associação, fundação ou fundação de apoio credenciada na forma da Lei nº 8.958/94, com atuação exclusiva para um fundo patrimonial cultural. A organização gestora será a responsável por aprovar um projeto junto ao Ministério da Cultura, através do sistema Salic, utilizado por todos os tipos de projeto cultural. O valor máximo permitido para projetos ativos será de R$ 15 milhões e, na prestação de contas, será obrigatória a comprovação da transferência definitiva dos recursos captados para o fundo patrimonial cultural, incluindo os rendimentos das aplicações financeiras.

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Embora a legislação para o uso dos fundos patrimoniais preveja incentivos fiscais amparados nos artigos 18 e 26 da Lei 8.313/91 — permitindo originalmente um benefício de 100% para o doador —, a nova normativa do MinC determinou que todas as doações aos fundos patrimoniais sejam enquadradas exclusivamente no artigo 26. Desta forma, é possível o desconto direto do imposto de renda de 40% do valor doado pela empresa optante do lucro real, ou de 80% do valor doado pela pessoa física. Adicionalmente, no caso da empresa, a totalidade da doação poderá ser lançada como despesas operacional, gerando ganho com a economia de impostos federais em cerca de 34% do total da doação, gerando, portanto, a recuperação de aproximadamente 76% do valor doado.

Não obstante haja desafios como a limitação no percentual do benefício, o teto máximo de captação por exercício fiscal, e a concorrência entre a captação para projetos regulares e para fundo patrimonial, o uso de benefícios fiscais pode representar aumento significativo nas doações, além de se traduzir em mais uma forma de sensibilização e divulgação. A instabilidade das políticas públicas e a volatilidade no apoio empresarial reforçam a importância das doações para a construção de patrimônios sustentáveis em instituições culturais no Brasil, com o objetivo de promover autonomia financeira, governança transparente e independência institucional. Portanto, os benefícios fiscais para a cultura se apresentam como uma ferramenta essencial para a preservação e o fortalecimento de nossos museus e institutos.

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[1] Dados do Monitor de Fundos Patrimoniais no Brasil. https://www.idis.org.br/monitor-de-fundos-patrimoniais-no-brasil/

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