Uma no cravo e outra na ferradura, já dizia o ditado. Ao falar sobre a situação fiscal brasileira na divulgação do Monitor Fiscal do Fundo Monetário Internacional (FMI), o diretor de Assuntos Fiscais da instituição, Vítor Gaspar, destacou o papel dos juros no desempenho fortemente negativo do déficit nominal: “É um peso extremamente elevado”.
Gaspar não entrou no mérito da política monetária ao citar a carga pesada dos juros. Ao contrário, com tom suave, fez coro ao que tem sido cobrado pelo Banco Central e pelos mercados: um reforço no ajuste fiscal para ajudar a acelerar uma trajetória de queda da dívida pública — que, nos dados atuais, o Fundo projeta se estabilizar a longo prazo em torno de 98% do PIB.
Governo não deve fazer ajuste fiscal adicional
O pedido não parece ser o caminho a ser adotado pelo governo, que se compromete a, no máximo, entregar as metas fiscais atuais, sem sinal de aperto adicional. Ao se dirigir ao FMI, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deixou clara sua convicção de que o ajuste deve mirar o lado da receita, cobrando dos mais ricos e de quem não paga, para cumprir as metas estabelecidas.
Este conteúdo foi antecipado no dia 15/11 para os assinantes corporativos do JOTA PRO Poder, uma plataforma de monitoramento político com informações de bastidores que oferece mais transparência e previsibilidade para empresas. Conheça!
Os dados do FMI mostram que, de fato, é o juro que está sobrecarregando as contas. A instituição projeta déficit nominal (receita menos despesas, incluindo juros) de 8,4% do PIB para este ano e de 7,5% do PIB para o ano que vem, caindo nos anos seguintes, em um quadro de resultados primários (antes do pagamento de juros) negativos em 0,6% e 0,4% do PIB.
A taxa Selic em 15% tem sido alvo de crescentes críticas do governo, tanto em público quanto nos bastidores. Uma das mais recentes foi da ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, mas, um mês atrás, todo o time que divulgou o Relatório Bimestral de Execução Orçamentária pediu o início da redução dos juros.
A grande preocupação é com o risco de uma desaceleração muito forte, uma vez que a perda de vigor da economia já está fazendo a arrecadação ter surpresas negativas.
Incômodo interno, mas mensagem de unidade para fora
Apesar disso, Haddad, em sua mensagem, tentou passar imagem de unidade em torno da política monetária, destacando que a inflação ainda está alta e demanda o tratamento duro da política monetária.
Nesse sentido, o diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central (BC), Paulo Pichetti, em evento em Washington, sinalizou que o órgão continua acreditando que a economia vai desacelerar em linha com a prescrição da política monetária, sem cair em uma recessão.
É de se esperar que esse atrito cresça enquanto o BC não der qualquer sinal de início dos cortes da Selic. Em um cenário ainda incerto com as medidas arrecadatórias, a preocupação em manter a economia em ritmo que ajude o ajuste fiscal está no centro das atenções.
Não à toa, o governo tem investido mais nas medidas parafiscais e estimulado os bancos públicos a serem mais ativos em programas como o consignado privado e o crédito imobiliário.