Natureza mercantil dos stock options plans

Em nosso dinâmico cenário jurídico, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já deu o primeiro veredito: as stock options, quando envolvem voluntariedade, risco e onerosidade, têm natureza mercantil e escapam do imposto de renda no momento do exercício da opção.

Agora, o STJ se prepara para um novo capítulo, analisar se esse mesmo raciocínio se aplica às contribuições previdenciárias. É a hora de verificar se o fio condutor da segurança jurídica vai costurar também esse novo julgamento, mantendo a coerência e a previsibilidade que o contribuinte tanto espera.

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Os planos de opção de compra de ações – stock options plans – são frequentemente alvos de discussões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), uma vez que a Receita Federal interpreta a outorga de opções, para futuro exercício e aquisição de ações, no modelo estabelecido pelas companhias, como contraprestação pelo trabalho (de natureza remuneratória).

A Receita tende a interpretar os stock options plans, normalmente instituídos pelas companhias, como formas de remuneração, sob a justificativa de que, além de estarem atrelados ao contrato de trabalho, garantem um preço da ação inferior ao de mercado, no momento do exercício da opção.

Com base na interpretação, a Receita exige das companhias o recolhimento das contribuições previdenciárias e de terceiros, considerando como base de cálculo a diferença entre o valor de mercado, no momento do exercício da opção, e o preço (pré-estabelecido) pago pelo participante dos stock options plans.

Em sentido oposto, as companhias alegam que os stock options plans constitui negócio jurídico de natureza mercantil, motivado pela intenção de manter, em seus quadros, trabalhadores com valores alinhados aos de seus acionistas.

Em outras palavras, embora os stock options plans pressuponha a existência de relação de trabalho, não é correto concluir que a aquisição das ações, em decorrência do exercício das opções outorgadas, corresponderia à remuneração pelo trabalho. Isso porque, “o exame de sua causa jurídica demonstra que sua função econômico-social não é remunerar o desempenho da atividade exercida por seus beneficiários, mas sim negociar ações da empresa aos funcionários, nas condições estabelecidas no plano”[1].

Além do objeto negociado ser a compra de ações, a própria ideia de imprevisibilidade de resultado nos stock options plans, decorrente da flutuação do valor das ações no mercado, também seria suficiente para afastar a classificação da verba como de natureza remuneratória, pois a valorização das ações não está diretamente relacionada à prestação de serviços exercida pelos participantes do plano.

A fim de dirimir essa controvérsia, o STJ, por meio da sistemática dos Recursos Repetitivos (Tema 1.226), buscou definir a natureza jurídica dos planos de opção de compra de ações das companhias: se atrelada ao contrato de trabalho (remuneração) ou se estritamente comercial (mercantil).

Assim, ao julgar o Tema 1.226, o STJ definiu os requisitos mínimos para que um plano de opções de compra de ações seja considerado como de natureza mercantil: voluntariedade na adesão, risco mercadológico e onerosidade na aquisição das ações.

Em apertada síntese, a voluntariedade consiste na escolha do trabalhador em decidir se pretende adquirir as ações; o risco, na possibilidade de que uma venda futura da ação ocorra por preço menor do que o originalmente pago; e a onerosidade, por ter sido o próprio trabalhador o responsável pelo pagamento das ações, ou seja, não foram concedidas gratuitamente, mas sim adquiridas mediante desembolso de recursos próprios do participante do plano.

Ademais, em seu voto, o ministro relator esclareceu que não existe norma específica regendo a matéria, apenas o PL 2724/2022, intitulado Marco Legal das Stock Options, em trâmite no Congresso Nacional. No entanto, destacou que “a intenção do legislador caminha rumo a confirmar as impressões antes registradas acerca da natureza estritamente mercantil do SOP, bem assim quanto ao momento em que se pode vislumbrar a ocorrência de fato gerador de imposto de renda pessoa física”.

Vale lembrar que a União opôs embargos de declaração no Tema 1.226, suscitando vícios de omissão e contradição no acórdão proferido. Em síntese, sustentou que haveria contradição na premissa de que os planos são ofertados aos empregados ou outras pessoas físicas que prestem serviços à companhia, não podendo ser afastada, por isso, sua natureza remuneratória. Alegou ainda omissão quanto à variação patrimonial decorrente do ingresso das ações, no sentido de que o patrimônio teve um acréscimo equivalente ao deságio.

Ocorre que os embargos de declaração foram rejeitados por unanimidade pelo STJ, prevalecendo o entendimento de que os stock options plans possui natureza mercantil quando presentes os requisitos de voluntariedade, onerosidade e risco.

Com a rejeição dos aclaratórios, a União interpôs recurso extraordinário, que restou não conhecido e inadmitido em parte, ensejando a apresentação de agravo. Dessa forma, a despeito da possibilidade do Supremo Tribunal Federal vir a analisar a matéria sob o viés constitucional, prevalece atualmente o direito de os contribuintes celebrarem stock options plans de natureza mercantil, de forma que a relação de trabalho existente entre os participantes do plano e a companhia, bem como a aquisição de ações em valor inferior ao mercado não são argumentos suficientes para afastar a referida natureza e transmudá-la em remuneratória.

Ainda nesse contexto, recentemente, o STJ afetou o Tema 1.379 para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos e determinou a suspensão nacional de todos os processos que versam sobre a matéria. O julgamento definirá a seguinte discussão: “Deliberar acerca da incidência, ou não, de contribuição previdenciária e de terceiros no momento em que se exerce a opção de compra de ações no âmbito do plano denominado stock option”.

Embora as bases para incidência do imposto de renda e das contribuições previdenciárias sejam distintas, grande parte das razões de decidir utilizadas pela 1ª Seção no Tema 1.226 também se aplicam à controvérsia atual. A onerosidade e o risco mercadológico desvinculam os stock options plans do conceito de remuneração, sendo essa, também, a intenção do legislador, na medida em que o PL 2724/2022 foi aprovado pelo Senado e atualmente aguarda revisão pela Câmara dos Deputados.

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Desse modo, a expectativa é de que, com o novo julgamento que versará sobre a incidência (ou não) de contribuições previdenciárias e de terceiros sobre os stock options plans, as companhias e os participantes dos planos finalmente obtenham a tão almejada segurança jurídica sobre o tema.

Em conclusão, o que o contribuinte espera agora é que o STJ faça da coerência o seu norte. Se antes o tribunal já reconheceu que as stock options não deveriam ser vistas como remuneração para fins de imposto de renda, agora a expectativa é que o mesmo raciocínio ilumine o caminho das contribuições previdenciárias. Afinal, no grande tabuleiro do direito tributário, a peça da segurança jurídica é aquela que nunca deve sair do jogo.

[1] FAJERSZTAJN, Bruno; MASAGÃO, Fernando Mariz; COVIELLO FILHO, Paulo. As implicações dos planos de outorga de opções de ações (stock options). Um panorama geral. Artigo publicado no livro “Estudos de Direito Tributário – 40 anos de Mariz de Oliveira e Siqueira Campos Advogados”, São Paulo, 2018, p. 135-188.

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