Divergência ampla de Fux anima bolsonaristas, mas não muda tendência do STF

O surpreendente voto do ministro Luiz Fux, em profunda divergência com o relator Alexandre de Moraes, deu novo ânimo ao bolsonarismo, a despeito de não alterar os rumos do julgamento na primeira turma do STF. Fux não só colocou em xeque a prerrogativa da Corte de julgar o caso, por não envolver pessoas com foro privilegiado, como absolveu o ex-presidente Jair Bolsonaro e parte das acusações aos demais réus.

Em um voto extenso, que alongou o julgamento para além do que estava previsto nesta quarta-feira, Fux se colocou na prática como um revisor. Esse papel hoje não existe formalmente, mas relembra o embate entre Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski no julgamento do Mensalão.

Nos próximos votos, dos ministros Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, a tendência é que seja formada a maioria com o relator, isolando Fux. Ainda assim, a peça do magistrado está servindo de base para o discurso de que o processo é viciado, uma perseguição política e criminalização de opinião.

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Anulação entra no radar dos aliados do ex-presidente

Mais que isso, deixou o bolsonarismo sonhar com a possibilidade de anulação do julgamento, por meio de um recurso em plenário. Nas redes sociais, voltou o tom agressivo sobre a “ditadura da toga”, e viralizou na direita a tag “Fux honra a toga”. Não foram poucas as menções à anulação total do processo, inclusive pelos integrantes da família do presidente, como o senador Flavio Bolsonaro.

No Congresso, da mesma forma, integrantes da bancada bolsonarista não tinham esperança de mudança nos rumos da turma, mas reforçaram o tom das redes de que o voto abre caminho para possíveis recursos ao plenário, o que daria mais tempo para o ex-presidente se manter fora da cadeia e com possibilidade de se manter no jogo político.

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Barreiras para recursos

Juridicamente, como o JOTA já mostrou, são muitas as barreiras que teriam de ser ultrapassadas para que o caso de Bolsonaro chegasse ao plenário do Supremo.

Primeiro, algum ministro teria que acompanhar a absolvição trazida por Fux para se chegar aos dois votos necessários para a interposição de embargos infringentes, conforme jurisprudência construída no julgamento de Paulo Maluf por crime de lavagem de dinheiro e reafirmada em julgados do 8 de Janeiro.

Depois, o recurso dos advogados de Bolsonaro teria que ser aceito pelo relator. Se Moraes não o acolher, a defesa pode recorrer por meio de um agravo a todos os ministros da 1ª Turma, que podem aceitar ou não a ida para o plenário.

Porém, dada a tradição de reviravoltas políticas no país, não se pode descartar totalmente que alguma manobra futura venha a driblar as restrições. Ainda que visivelmente não haja boa vontade da Corte com Bolsonaro, a pressão política crescente, e agora reforçada por um membro do STF, eleva os riscos de cenários alternativos se materializarem, embora não pareça o mais provável.

Curiosamente, na semana em que as redes bolsonaristas alimentaram discussões sobre a convulsão civil no Nepal, Fux, a despeito da insatisfação que causou em seus colegas, de certa forma gerou alguma esperança do caminho institucional no campo da direita mais radical.

Ligeira piora para a opção Tarcísio

Se, do ponto de vista do discurso, a surpreendente atuação de Fux pareceu alinhada com o tom dado pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que defendeu enfaticamente Bolsonaro no último domingo, o voto do ministro acaba jogando contra os interesses presidenciáveis de Tarcísio, ao alimentar uma esperança de reviravolta em favor do ex-presidente.

Com esse voto, certamente serão renovadas as pressões por anistia no Congresso, que ainda não andou efetivamente. E podem ganhar novo gás as pressões para novas ações dos Estados Unidos de Donald Trump contra o Brasil (ou especificamente contra ministros do STF que seguirem Moraes).

Apesar da corrida para que o julgamento se encerre nesta semana, o longo voto de Fux aumentou os riscos de o processo correr para a semana que vem. A ver.

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