Duas horas e 47 minutos é o tempo médio que as pessoas gastam diariamente em deslocamentos por ônibus, trem e metrô na cidade de São Paulo – para ir ao trabalho, estudar ou participar de atividades culturais, por exemplo. Em um ano, os trajetos somam 42 dias inteiros. Se considerado também o uso de carro e bicicleta, a média diminui, mas permanece alta: duas horas e 25 minutos por dia.
Quem perde mais tempo tem menor renda. Entre os que mais usam transporte coletivo, destacam-se as classes D e E (91%) e, entre os que mais usam transporte individual, as classes A e B (51%). Além dos meios de transporte utilizados, a distância dos locais de trabalho é outro grande responsável pelo aumento no tempo de trajeto, já que a população de baixa renda geralmente habita regiões periféricas, mais distantes dos centros de emprego.
Esses dados – de uma pesquisa realizada pela Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ipec em agosto de 2024 – apontam como o transporte pode, de um lado, amplificar ou, de outro, atuar para combatê-las.
Por meio de análise geoespacial e pesquisa com usuários, a Uber investigou se o serviço de Uber Moto – serviço de transporte de passageiros em motocicletas, com foco em viagens econômicas e eficientes – poderia contribuir para reduzir as desigualdades no transporte em São Paulo.
O período analisado foi o de 15 a 26 de maio de 2025, quando (além do período de 22 a 27 de janeiro) o serviço esteve brevemente disponível na capital paulista.
Para entender mais sobre os usuários desses serviços e suas experiências, foram cruzadas informações sobre os pontos de origem das viagens com dados demográficos do censo brasileiro. A partir dessa análise espacial, uma “renda presumida” para os bairros de origem das viagens de moto e de carro foi calculada.
Paralelamente, também foi feita uma pesquisa por e-mail com os usuários que realizaram viagens com o motoapp durante esse período, com o objetivo de entender o perfil socioeconômico e de gênero desses usuários, bem como suas motivações para utilizar o serviço.
Os resultados mostram diferenças significativas entre os níveis de renda dos usuários de Uber Moto e dos adeptos das modalidades de quatro rodas da Uber (como o UberX). A renda média mensal per capita nas áreas de embarque de carro foi 42% maior do que nas regiões de partida das viagens feitas com Uber Moto – R$ 2.995 contra R$ 2.115.
Além disso, dentre os 1,8 mil usuários da motoapp que responderam à pesquisa, cerca de 60% relataram ganhar menos de R$ 4 mil por mês, enquanto um terço relatou ganhar menos de R$ 2 mil.
Ilustração: Uber
Os mapas mostram que os embarques com carros são mais concentrados nas regiões centrais da cidade (bairros em vermelho escuro na Figura A), que correspondem aproximadamente às áreas de maior renda da cidade (representadas pelos bairros em verde escuro na Figura B). Já os embarques com moto estão mais distribuídos de forma uniforme pela cidade (com maior densidade representada pelos bairros em azul mais escuro na Figura C), com destaque para zonas mais densamente atendidas em bairros da Zona Leste, como Itaim Paulista e Lajeado, e da Zona Oeste, como Campo Limpo e Capão Redondo.
Alguns dos motivos que explicam por que o modal moto atendeu principalmente pessoas de menor renda são os preços mais baixos e a capacidade de circular por ruas estreitas e em áreas de difícil acesso – como encostas e comunidades densamente povoadas onde ônibus e carros muitas vezes não circulam.
Mas há uma outra razão relevante: o tempo de deslocamento se torna significativamente menor do que os trajetos de ônibus, considerando o menor tempo de espera e a eficiência dos trajetos com o uso do corredor e faixas exclusivas, por exemplo. Isso faz com que as pessoas possam chegar mais cedo em casa após a rotina de trabalho ou ainda chegar a tempo das aulas.
As viagens de transporte público podem levar três vezes mais tempo do que se fossem feitas de moto, conforme mostrou pesquisa da Fipe em parceria com a Uber que analisou os dados das viagens realizadas no Uber Moto nas cidades de Fortaleza, Manaus e Rio de Janeiro, onde o serviço está disponível.
O que pensam os usuários
A desigualdade no transporte não é evidenciada somente pelos números. A população também nota os efeitos práticos. “Essa perda de tempo nos rouba o descanso, as conversas com quem amamos, os momentos de qualidade e as pequenas e grandes alegrias da vida”, diz o jornalista Daniel Santana, que, em um vídeo publicado nas redes sociais, mostra que esperou um ônibus por 50 minutos, passou 1 hora e 20 minutos dentro dele, pegou um trem, um metrô e terminou o trajeto com 15 minutos de caminhada para chegar em casa na Zona Sul de São Paulo.
Para as mulheres, além do tempo perdido, há ainda outras preocupações com a insegurança pública que tornam o transporte público, a espera e as caminhadas desacompanhadas ainda mais temidas.
Segundo um estudo recente da Oxford Economics, as mulheres consideram a segurança (73%) como o principal fator de escolha para o transporte. Além disso, elas têm menor flexibilidade no deslocamento para o trabalho. De acordo com a pesquisa, mulheres no Brasil são menos propensas do que homens a afirmar que encontrariam outras formas de ir ao trabalho caso o serviço de transporte por aplicativo não estivesse disponível (49% dos homens e 32% das mulheres).
Isso ajuda a explicar por que a modalidade de Uber Moto atrai maioria feminina entre os usuários na América Latina. De acordo com pesquisas de mercado da empresa, as mulheres representam cerca de seis em cada dez passageiros da modalidade em cidades do Brasil, México e da Colômbia.
Conexão entre a periferia e transporte público
Para os usuários, o transporte por motoapp geralmente funciona como um complemento a trajetos por transporte público. As baldeações e a utilização de múltiplos modais são comuns na capital paulista para cobrir o chamado “último quilômetro” – entre uma estação de metrô ou trem e a moradia. Hoje, há poucas alternativas para cobrir esse trecho final nas periferias.
Enquanto nas regiões centrais, o aluguel de patinetes elétricos e bicicletas se tornou presença comum na cidade para completar os deslocamentos, o mesmo não acontece nos bairros da periferia. Aliás, as ciclovias e ciclofaixas se concentram nas regiões do Centro Expandido de São Paulo, como mostra o Mapa de Infraestrutura Cicloviária da Prefeitura de São Paulo.
Assim, a população de menor renda e que vive em áreas afastadas se torna mais carente de novas alternativas. Cerca de uma em cada três pessoas que responderam à pesquisa da Uber usou motoapp para se conectar a uma estação de metrô ou a um ponto de ônibus. Os dados confirmam isso: os embarques com Uber Moto foram densos – e muito mais expressivos do que os de quatro rodas – em bairros menos atendidos pela mobilidade urbana.
A alternativa pode ser uma opção prática, ao se conectar ao transporte público, para melhorar a mobilidade da população paulista, sobretudo moradora de periferias, com menor renda e mulheres.