Com Pix, milhões de pessoas compram produtos de empresas americanas no Brasil

A investigação aberta pelos Estados Unidos contra o Brasil por meio do Escritório do Representante do Comércio dos EUA (USTR) para apurar supostas práticas comerciais abusivas, incluindo o Pix, mostra muito mais sobre a política de dominância que aquele país pretende implementar do que sobre possíveis abusos nos itens criticados. Com efeito, a investigação carece de legitimidade nos fundamentos ou na realidade dos fatos.

O Pix, por exemplo, é um arranjo que garante universalidade e igualdade de oportunidades a instituições nacionais e internacionais, sejam elas americanas ou de outros países. Qualquer instituição de capital estrangeiro que tenha se habilitado no Brasil, de acordo com as leis brasileiras, consegue não só aderir ao Pix em condições de igualdade, como eventualmente até competir com ele. Não há restrição na legislação brasileira ao lançamento de plataformas de pagamentos instantâneos concorrentes.

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A universalidade, a neutralidade e a eficiência são grandes diferenciais desse arranjo. Como o Pix é aberto a qualquer instituição que preencha requisitos mínimos, ele consegue alcançar muito facilmente toda a população, sem fazer distinção entre usuários de maior ou menor renda. Tendo uma conta de pagamento em qualquer instituição, fintech ou uma conta de depósito em qualquer banco, a pessoa consegue utilizar o Pix independentemente do montante a pagar ou a receber, independentemente da sua riqueza pessoal, o que favorece a inclusão financeira e o mercado de consumo.

Outras plataformas não conseguem agregar toda essa facilidade porque muitas vezes estão associadas à disponibilidade de cartão de crédito, de débito, ou a determinado patamar de risco de crédito do cliente. Essa vantagem competitiva do Pix não se deve necessariamente ao fato de ser administrado pelo Estado, mas ao formato aberto e interoperável, que permite a qualquer instituição aderir, oferecer serviços de pagamento e agregar outras utilidades a partir do Pix. E as instituições do mercado de cartão se adaptaram rapidamente a essa realidade, tirando proveito do ganho de escala e da redução de custos operacionais proporcionados pelo Pix.

Conhece-se a crítica de que a implementação do Pix acabou prejudicando um modelo concorrente da Meta, que previa a facilidade de pagamento via Facebook ou WhatsApp. Aqui as questões precisam ficar bem esclarecidas, porque não houve impedimento pelo Banco Central ao desenvolvimento da plataforma da Meta.

O que ocorreu em 2020 foi a suspensão cautelar do projeto para aprofundamento da análise dos possíveis impactos do modelo de negócio no mercado de pagamentos de varejo, em observância ao previsto na Lei 12.865, de 2013.

Não se pode ignorar que, por a Meta ser uma big tech com mais de 200 milhões de usuários no Brasil, qualquer modalidade de pagamento por ela desenvolvida pode ter impactos relevantes no mercado de pagamentos de varejo, inclusive sobre os níveis de concorrência, cabendo apurar também a conformidade do modelo de negócio com as exigências legais de segurança operacional e tratamento de dados pessoais.

Por isso era importante que naquele momento o arranjo da Meta se submetesse a prévia autorização do Banco Central, à semelhança do que tinha sido exigido de todos os outros players relevantes do mercado. O que houve, então, foi uma preocupação de caráter prudencial, de avaliação de risco de mercado, que foi conduzida na forma da legislação brasileira, resultando na liberação da plataforma após a conclusão das análises cabíveis.

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Os desafios decorrentes da rápida adesão dos brasileiros ao Pix são idênticos para todos os participantes do mercado bancário e de pagamentos. Não há, nesse contexto, nenhum tipo de distinção entre empresas de capital brasileiro ou de capital estrangeiro, inclusive americanas. O que parece destoar do bom senso é pleitear um benefício específico, e indevido, para empresas de origem americana.

É claro que os EUA têm liberdade de abrir investigação sobre o que quiserem e, eventualmente, até aplicar restrições ou tarifas extras a países que adotam mecanismos que, na visão norte-americana, dificultam a expansão ou a supremacia de empresas baseadas naquele país. Mas não faz sentido dizer que o Pix causa prejuízo especificamente a empresas americanas. Elas estão no jogo, com participação relevante no mercado brasileiro e lucros expressivos.

Espera-se que os EUA se convençam de que o Pix, ao viabilizar a inserção de um grande contingente de pessoas no sistema financeiro, ao contrário de prejudicar os interesses de empresas americanas, garante o acesso de mais consumidores brasileiros a produtos e serviços disponibilizados por empresas de capital americano no Brasil.

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