Novo PRO-REG chega em boa hora

Já não é mais novidade que o PRO-REG está de volta. O Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação, criado no início do segundo mandato do presidente Lula pelo Decreto 6.062, de 16 de março de 2007, foi reformulado e relançado pelo Decreto 11.738, de 18 de outubro de 2023. Assim como o antigo PRO-REG, a nova versão também conta com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), dando continuidade à sua agenda de expandir a aplicação das melhores práticas desenvolvidas ao redor do mundo em regulação.

O PRO-REG possuía um desenho robusto e desempenhou papel crucial na disseminação de boas práticas regulatórias no contexto brasileiro. O programa foi pensado como uma política de Estado, planejado como etapas ao longo de anos, de aprofundamento de técnicas e espalhamento de práticas a serem desenvolvidas, visando, no longo prazo, alcançar todos os níveis da administração pública.

Os anos de intensa atividade do programa semearam, nas mentes férteis dos jovens concursados nas agências e gestores lotados na administração direta, a vontade de buscar novas formas de fazer política pública. Técnicas e saberes foram incorporados nas rotinas de trabalho das agências pelos servidores que participaram dos inúmeros cursos, treinamentos e visitas técnicas organizadas no âmbito do antigo PRO-REG.

Os anos áureos do PRO-REG terminaram em 2013[1], mas o seu modelo bottom-up, focado na conquista de corações e mentes do corpo técnico estável e qualificado dos especialistas em regulação e gestores públicos, garantiu a resistência e continuidade da agenda mesmo na ausência de qualquer apoio – e compreensão – dos centros de governo.

Assim, a despeito dos hiatos que marcaram o processo de construção institucional e aprimoramento da política regulatória no país, a agenda de melhoria regulatória seguiu em frente, experimentando o seu “segundo salto” a partir de 2016, sob a liderança da Subchefia de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais (SAG).

Foi nessa época que o projeto de lei das agências voltou a ser uma prioridade presidencial e foi no âmbito da SAG que as discussões foram retomadas. Em um primeiro momento, os debates se concentraram no projeto de lei e na construção de um entendimento comum entre as agências reguladoras e o Executivo sobre o seu conteúdo.

Como a análise de impacto regulatório constava no projeto de lei e precisaria ser regulamentada, o passo seguinte foi a construção conjunta desta regulamentação, por meio do resgate de uma rede de comunicação entre os principais atores que trabalhavam com melhoria regulatória[2]. A abordagem adotada pela SAG foi similar a do PRO-REG e considerava uma “incorporação gradativa”, e elementos de soft power, como “diálogo interinstitucional, […] formação de consensos, utilização de orientações não vinculantes, apontamento de boas práticas e amplo esforço de comunicação”[3].

Esta abordagem bottom-up, inaugurada pelo PRO-REG I e reinventada pela SAG, mostrou resultados. Antes de se tornarem obrigatórias, boas práticas como agenda regulatória, análise de impacto regulatório (AIR) e avaliação de resultado regulatório (ARR) já eram bastante difundidas entre as agências reguladoras e alguns reguladores federais, como o Inmetro.

Para além dos mais de 600 relatórios de AIR e 10 de ARR[4] produzidos antes de 2020, estas práticas parecem ter, de fato, conquistado corações e mentes dos reguladores. Pesquisa recente conduzida no âmbito do programa Cátedras, da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), revelou que há uma “visão amplamente favorável dos servidores ao uso da AIR” e que “a grande maioria […] defendeu que a AIR deve ser usada frequentemente pelas agências e que ela seria um mecanismo para aprofundar conhecimentos baseados em evidências”.

A retomada do PRO-REG não significa uma volta ao começo. Estamos em um contexto bastante distinto daquele de 2007, como resultado, em grande medida, dos esforços empreendidos pelo PRO-REG e pela SAG. Como colocado pelas professoras Natasha Salinas e Gabriela Borges, os alicerces da nossa política de melhoria regulatória “já estão pavimentados e um flanco de novas oportunidades abre-se com o novo PRO-REG”.

Além das obrigações legais[5], há hoje um órgão responsável pela coordenação de ações voltadas à implementação de boas práticas regulatórias no Executivo federal: a Secretaria de Competitividade e Política Regulatória do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (SCPR/MDIC). A SCPR será o braço executor do programa, como apresentado por sua secretária, Andrea Macera, e pela diretora de Política Regulatória, Sabrina Maciel, nesta mesma coluna.

O novo PRO-REG considera nosso histórico e contexto e chega em boa hora, replicando o desenho de governança e o tipo de abordagem que melhor funcionam para a harmonização, articulação e coordenação de ações com impactos transversais. Confere, com sua formação colegiada e interministerial, legitimidade para a adoção de medidas modernizadoras de maior impacto, resultando em maior transparência, controle social e racionalização nas iniciativas regulatórias. O comitê gestor deverá operar como órgão supervisor dos esforços coordenados pela Secretaria-Executiva, além de contribuir para o desenvolvimento das capacidades regulatórias que estados e municípios tanto necessitam para estimular atividades e proteger os cidadãos. Boa sorte e mãos à obra, novo PRO-REG!

* Uma versão anterior deste texto foi publicada, por uma das autoras, no portal WebAdvocacy em 7/11/2023. Link para acesso: https://webadvocacy.com.br/2023/11/07/o-pro-reg-tambem-voltou/

[1] Segundo site da Casa Civil, “A partir de maio de 2013, o programa passou a ser executado apenas com recursos do Orçamento Federal. Atualmente, o Programa não conta com orçamento específico na estrutura do Plano Plurianual – PPA.”

[2] O resgate e registro do papel da SAG nesta agenda foi tema do segundo episódio do podcast Mulheres na Regulação, que contou com a participação da então diretora do Ministério da Economia, Kélvia Albuquerque, e da assessora especial, Suiane Fernandes, ambas gestoras públicas federais.

[3] Albuquerque, K.; Azumendi, S. (2022). Estados ágeis na América Latina: a coordenação dentro do setor público como fator chave das estratégias de melhoria regulatória e o caso do Brasil. Policy Brief #32, Nota da Direção de Inovação Digital do Estado (DIDE) do CAF – Banco de Desenvolvimento da América Latina.

[4] A quantidade de relatórios produzidos apenas ilustra que a adoção da AIR precedeu a sua obrigação.

[5] Além da AIR e ARR, há uma série de boas práticas regulatórias já previstas no nosso arcabouço normativo, das quais destaca-se: agenda regulatória (Lei nº 13.848/2019 e Decreto nº 11.243/2022), consulta pública (Lei nº 13.848/2019 e Decreto nº 11.243/2022), revisão formal e consolidação temática periódicas do estoque regulatório (Decreto nº 10.139/2019), classificação de risco da atividade econômica com processos simplificados para atividades de risco baixo e moderado (Lei nº 13.874/2019 e Decreto nº10.178/2019). Para uma “lista” dessas boas práticas, ver Anexo II do Decreto nº 11.092/2022.

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