Um dos temas que pode balançar a relação da presidência de Edson Fachin no Supremo Tribunal Federal (STF) com os colegas é a proposta de um Código de Conduta para ministros de tribunais superiores —que tem resistências dentro da Corte. A ideia vem sendo pensada desde o início da gestão, mas ganhou tração após o ministro Dias Toffoli, relator do caso do Banco Master no Supremo, viajar para assistir à final de futebol da Libertadores da América em Lima, no Peru, no mesmo voo particular que o advogado Augusto Arruda Botelho, que defende um dos diretores do banco.
O ministro Edson Fachin assumiu a presidência do Supremo com discurso de resgate da institucionalidade da Corte e não deve desistir desse propósito, mesmo que custe um desgaste com os colegas. O magistrado tem se mostrado disposto a alterar o que ele classifica como “limiar da exaustão institucional”. Se o ministro pensou em imprimir alguma autocontenção, o que se viu nos primeiros meses de sua gestão foi um Supremo ainda mais exposto e atacado.
A presença de ministros em palestras, jantares e eventos, a criação de institutos por magistrados e contratos de advocacia milionários firmados com parentes de juízes vêm sendo alvo de críticas. Na visão de Fachin, essas situações enfraquecem a reputação da Corte. Em 2024, ele discursou a favor das normas enquanto ocorria o Gilmarpalooza, apelido dado pela imprensa ao evento de Gilmar Mendes em Portugal.
Os contrários a essa ideia defendem que não é hora de expor o Supremo em meio aos ataques vindos, sobretudo, do Legislativo e que as normas podem alimentar pedidos de impeachment. Assim, o código pode fragilizar ainda mais a instituição.
A interlocutores próximos, Fachin tem dito que não vai desistir de um código de conduta inspirado no modelo do Tribunal Constitucional Alemão. Segundo a imprensa alemã, o texto no país europeu veio como uma forma de proteger o tribunal de ataques aos sistemas jurídicos como os feitos por governos de extrema-direita da Hungria e da Polônia. As regras visam garantir que os próprios juízes não causem uma perda de prestígio institucional.
No texto alemão, os juízes devem manter uma postura, dentro e fora do exercício da função, de modo a não comprometer a “dignidade do cargo e a confiança na sua independência, imparcialidade, neutralidade e integridade”.
Fachin tem o apoio de todos os presidentes de tribunais superiores e de colegas do STF. Herman Benjamin, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), defendeu o código publicamente durante a posse da nova presidência da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), mas logo amenizou dizendo que a “magistratura brasileira faz tudo certo”. O STJ vive uma das maiores crises de sua história com escândalos de vendas de sentenças.
Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maria Elizabeth Rocha, do Superior Tribunal Militar (STM) e Cármen Lúcia, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também são favoráveis à proposta. Contudo, os cinco são presidentes que têm resistência de seus colegas.
Normas que exijam certa postura da magistratura costumam encontrar detratores e a independência judicial tende a ser o argumento. Em 2023, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), durante a gestão da ministra Rosa Weber, tentou implementar um código similar, mas não teve apoio.
Mas até que ponto um código de conduta pode diminuir a independência de um juiz? Será que uma autocontenção vinda do próprio tribunal não pode ser uma opção melhor do que soluções externas, vindas, por exemplo, do Legislativo? Há um certo barulho por nada, uma vez que o texto nem deve ter sanções específicas, vai funcionar mais como um manual de boas maneiras.
Fachin parece disposto a levar o código adiante e não está isolado. Em uma fase (quase permanente) de tensão entre Poderes, a norma pode fortalecer a imagem dos tribunais e, principalmente, do STF.
Agora resta saber se este é o momento correto e o quão disposto Fachin está a se indispor com colegas —o que pode trazer consequências para a sua presidência que já encontra dificuldade de liderança. O recesso vai ser uma pausa importante para reflexões.