João Paulo Resende Borges, coordenador-geral de Regulação do Sistema Financeiro do Ministério da Fazenda, afirmou no dia 13 de novembro que o Pix em Garantia é tratado como prioridade para redução do spread bancário na agenda de reformas microeconômicas do governo federal. A fala foi feita durante o 1º Seminário Propague de Cidadania Financeira, na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte.
Pela proposta em estudo pelo Banco Central e pelo Ministério da Fazenda, as empresas poderão utilizar o fluxo futuro de recebimentos via Pix como garantia em operações de crédito, o que resultaria em taxas de juros menores. “Pequenos e médios empresários trabalham com uma margem pequena. Há um índice de falência, recuperação judicial e fechamento de empresas que não pode ser ignorado. São empresas ainda com dificuldade de acesso ao crédito”, explicou Borges antes de concluir: “se o pequeno lojista tiver a possibilidade de dar [o fluxo futuro de transações Pix] em garantia, isso é algo que tem um potencial absurdo de redução do spread”.
Lucas Freire, procurador-geral adjunto do Banco Central, pontuou que o mecanismo ainda está sendo gestado pelo regulador, mas adiantou que o modelo escolhido será aquele que melhor atende à necessidade pública e que respeite os princípios de inovação e concorrência estabelecidos pela Lei 12.865/2013.
Vinícius Carrasco, diretor do Instituto Propague e Professor de Economia da PUC-Rio, apresentou estudos de pesquisadores da USP e de Stanford que evidenciam o impacto da regulação dos recebíveis de cartão sobre o spread e sobre o volume de crédito concedido, esperado também para o Pix em Garantia, para a redução do spread bancário e para o aumento do crédito. “A regulação que permitiu utilizar em garantia recebíveis de cartão – que o Pix em Garantia quer estender – viabilizou um aumento de oferta de crédito e a redução do spread. Então, acho que o potencial do Pix em Garantia é enorme. O exemplo dos cartões é bastante claro do quão benéfico isso pode ser”, avaliou Carrasco.
Incluído na agenda evolutiva do Banco Central no início do ano, o Pix em Garantia foi tema de um estudo coordenado pelo Professor Bruno Salama (UC Berkeley), que avaliou as bases jurídicas para a proposta em debate. O estudo está disponível aqui.
Com abertura de arranjos, governo espera crescimento e redução de custos no PAT
O seminário também debateu em detalhes as mudanças no Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), viabilizadas pelo Decreto 12.712/2025, publicado no dia 12 de novembro. Isso foi discutido no painel “Medidas para maior acesso aos vales refeição e alimentação em prol dos trabalhadores”, que contou com a participação remota de Francisco Macena, secretário-executivo do Ministério do Trabalho e Emprego. O decreto prevê a abertura dos arranjos de grande porte, com o objetivo de que os principais vales (refeição e alimentação) sejam aceitos em qualquer maquininha, como ocorreu com os cartões de crédito e débito na última década.
“Com essas políticas de democratização, nós acreditamos que a rede atual de 740 mil estabelecimentos pode ser ampliada, com um potencial muito grande de chegar a 2 milhões ou 2 milhões e 400 mil estabelecimentos. Isso vai aumentar a capilaridade do programa e a concorrência, o que é benéfico”, assinalou o secretário-executivo do Ministério do Trabalho.
O decreto ainda estabelece um teto de 3,6% para as tarifas cobradas dos estabelecimentos comerciais. “Deparamos com contratos dentro do próprio Ministério com taxas de 6,5% a 10%, chegando a um custo efetivo de 12% a 13% na maioria dos casos”, revelou Macena. “Chegamos a apurar, em alguns casos, de 12 a 16 taxas diferentes sendo cobradas, dependendo da operadora. Precisamos moralizar isso e estabelecer 3,6% como teto máximo”, acrescentou.
O secretário explicou que o percentual foi calculado para equilibrar o mercado: “Não foi um chute ocasional. É algo muito próximo do que é praticado no mercado de cartões – débito tem 1,2%; crédito chega no máximo a 3%. Para um sistema pré-pago, onde a empresa recebe antecipadamente, 3,6% dá margem suficiente para continuar operando”.
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A professora Rubia Neves, da UFMG, defendeu as mudanças no vale-refeição com base no exemplo dos cartões de crédito e débito. “A interoperabilidade no mercado de cartões fez com que saíssemos de duas instituições detendo 90% do mercado em 2010 para mais de 25 participantes hoje. De 2011 para cá, aumentamos o volume de cartões de crédito em circulação em 70%”, afirmou Rubia.
Paulo Cereda, secretário executivo do Conselho Científico do Instituto Propague, complementou: “nos 10 anos posteriores à Lei 12.865, que estabeleceu a interoperabilidade como um princípio e conferiu ao Banco Central competência para disciplinar a abertura dos arranjos de cartão, observou-se uma redução de 20% nas taxas cobradas do varejo como efeito da maior competição. Se considerarmos só a parcela dessa taxa que está sujeita a pressões competitivas – que é a remuneração da credenciadora –, essa redução foi superior a 50%. É uma evidência muito significativa do sucesso da abertura.”
Ferramentas do BC auxiliam usuário a prevenir fraudes cibernéticas
Também houve debate sobre medidas de segurança no uso de serviços digitais, diante da multiplicação de fraudes cibernéticas. No painel “Melhores práticas de segurança no uso de serviços financeiros”, Ana Márcia Fonseca, chefe da divisão de educação financeira do Banco Central, reforçou a importância do lançamento do “BC Protege+”, sistema que entrará em vigor em 1º de dezembro, pelo qual o cidadão poderá bloquear a abertura de contas em seu nome.
Ana Márcia explicou que será possível que o usuário, caso deseje, trave seu CPF para a abertura de contas no site do Banco Central. As instituições consultarão o sistema previamente à abertura de novas contas e observarão se há ou não a trava para aquele usuário.
Alexandre Forte Maia, subprocurador-geral do Banco Central, relatou que ele mesmo já foi vítima de fraude, para ilustrar a importância das ferramentas de proteção do Banco Central. “Em 2022, consultei o Registrato (sistema do BC) e descobri que tinha um relacionamento bancário na Caixa Econômica Federal para receber auxílio emergencial. Só que não era eu. Era outro que recebeu o auxílio em meu nome. Eu resolvi tudo isso com ferramentas disponibilizadas pelo Banco Central”, lembrou.
Revista da PGBC anuncia edição especial sobre cidadania financeira
No encerramento, o procurador do Banco Central e editor-adjunto da Revista da PGBC, Guilherme Hellwig, anunciou a chamada de artigos para edição especial sobre cidadania financeira, em parceria com o Instituto Propague. “Não é exagero dizer que a Revista já se consolidou como uma publicação de referência em regulação financeira. Esperamos com essa edição incentivar a produção de artigos sobre as quatro dimensões da cidadania financeira.” O edital está disponível na página da Revista da PGBC.
Nathália Menezes, conselheira do Instituto Propague, comemorou os resultados alcançados no 1º Seminário Propague de Cidadania Financeira. “Foram horas intensas de trocas sobre as quatro dimensões da cidadania financeira: educação, inclusão, proteção e participação. O Seminário Propague passa a ser um ponto de encontro para construção coletiva de soluções”, afirmou a conselheira.