Nas últimas semanas, o Distrito Federal e os estados de São Paulo e Pernambuco divulgaram entendimentos sobre a possibilidade de inclusão do IBS e da CBS na base de cálculo do ICMS durante o período de transição da reforma tributária.
Tanto DF quanto SP afirmaram que essa inclusão não ocorrerá em 2026, ano em que os novos tributos aparecerão apenas como destaque em nota fiscal. Já Pernambuco manifestou interpretação no sentido oposto, sugerindo que a inclusão ocorreria já no primeiro ano – posição que não se sustenta diante da legislação e da Nota Técnica ENCAT 2025.002, que deixam claro que não haverá recolhimento do IBS e da CBS em 2026, afastando qualquer possibilidade de integração à base do ICMS nesse momento.
A discussão, contudo, vai além do primeiro ano da transição. O ponto central é se a inclusão poderia ocorrer entre 2027 e 2032, período em que o ICMS conviverá com o IBS e a CBS até sua extinção definitiva. A forma como o tema foi tratado na Constituição contribui para o problema.
Durante a tramitação da PEC 45/2019, a versão original previa a exclusão expressa do IBS e da CBS das bases de cálculo do ICMS e do ISS. Essa regra, no entanto, foi retirada no processo legislativo. Assim, a EC 132/2023 apenas vedou que os novos tributos compusessem suas próprias bases ou integrassem as bases do Imposto Seletivo e das contribuições ao PIS e à Cofins, sem mencionar o ICMS ou o ISS.
Esse silêncio contrasta com os objetivos declarados da reforma tributária: neutralidade, simplicidade, transparência e redução de litígios. Reintroduzir a lógica de tributação por dentro, característica marcante do ICMS atual, viola frontalmente tais princípios. Hoje, conforme a Lei Complementar 87/1996 (artigo 13), o ICMS é calculado sobre uma base que inclui outros tributos, o que gera cumulatividade e distorções. Sem ajustes legislativos claros, corre-se o risco de transportar esse modelo indesejado para a transição do novo sistema.
Do ponto de vista jurídico, tampouco há base sólida para a inclusão automática do IBS e da CBS na base do ICMS. A Constituição foi expressa apenas em relação ao Imposto Seletivo, determinando que ele integrará a base do ICMS. A existência de uma previsão explícita para um tributo reforça que outros só podem ser incluídos mediante disposição igualmente expressa.
A própria LC 87/1996, que define taxativamente os elementos da base do ICMS, exige alteração legislativa específica caso se pretenda ampliá-la. Não por acaso, o PLP 108/2024 propôs incluir apenas o IS nessa base, permanecendo completamente silencioso quanto ao IBS e à CBS.
Além disso, a LC 214/2025, ao estruturar os novos tributos, deixa claro que eles não integram o valor da operação, elemento que a Lei Kandir considera essencial para a composição da base de cálculo do ICMS. Soma-se a isso o PLP 16/2025, em tramitação na Câmara dos Deputados, que propõe excluir expressamente IBS e CBS da base do ICMS — mais uma evidência de que a matéria está longe de ser pacífica.
Diante desse cenário, a tentativa de alguns fiscos estaduais de defender a inclusão dos novos tributos na base do ICMS acentua a insegurança jurídica e contradiz os pilares da reforma. Em um momento de intensa adaptação, as empresas precisam de previsibilidade normativa para ajustar sistemas, revisar contratos e planejar suas operações com segurança. Sem clareza legislativa, o risco de contenciosos se amplia, justamente na contramão do que o novo modelo busca entregar.
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A inclusão de IBS e CBS na base do ICMS, tal como vem sendo debatida nas últimas semanas, não encontra sustentação constitucional, legal ou sistêmica e, se mantida, tende a perpetuar distorções que a reforma se propôs a eliminar.
Por fim, vale o alerta de que o ISS, assim como o ICMS, também adota a sistemática de tributação “por dentro”. Diante disso, a tendência é que muitos fiscos municipais defendam igualmente a inclusão do IBS e da CBS na base de cálculo do ISS, ampliando ainda mais a insegurança jurídica durante a transição.