O presidente da Febraban, Isaac Sidney, criticou a liberação feita em 2020 para que as instituições pudessem operar com pessoas físicas e jurídicas antes de terem sua autorização efetivada pelo Banco Central. Para ele, essa experiência acabou abrindo as portas para uma escalada de fraudes e possibilidades para o crime organizado.
“Sistema financeiro não é laboratório, não é um experimento. Sistema financeiro é coisa séria. Se nós pudéssemos fazer aqui um trocadilho, não dá para fazer com que uma farmácia inicie a venda de medicamentos sem que haja prévia autorização do órgão regulador”, disse Sidney ao participar de painel no II Fórum Futuro da Regulação, promovido pelo Fórum de Integração Brasil-Europa (FIBE).
Segundo ele, de 2020 a 2025, houve uma explosão de pequenas instituições de pagamentos, de pequenas fintechs não autorizadas, acessando o sistema financeiro de pagamento e abrindo relacionamentos. “O que é que isso levou? Levou a duas situações que foram absolutamente o melhor presente que o Estado brasileiro poderia dar ao crime organizado: primeiro, o início de um relacionamento [com o sistema] e segundo uma conta que entrassem e saíssem recursos. Foi exatamente a janela que o crime organizado encontrou para fazer entrar, transitar e sair o dinheiro sujo do crime organizado”, afirmou, completando: “Na minha visão, houve uma péssima escolha do Estado brasileiro que permitiu que instituições não autorizadas pelo Banco Central abrissem conta de pagamento e permitissem que essas instituições plugassem no sistema”. Recentemente, o BC apertou as regras, obrigando as instituições a obterem a autorização até 2026, não mais até 2029, para poderem operar.
Para Sidney, o Estado precisa ter mecanismos para poder fazer com que a indústria financeira se abra, amplie a concorrência, mas é preciso que haja cuidado. “Não dá para fazer o sistema financeiro no laboratório, não dá para fazer o experimento, então por isso que eu digo que, na minha visão, houve uma péssima escolha do Estado quando permitiu que isso acontecesse”.
No mesmo evento e falando antes da Febraban, o presidente da Zetta, que representa as maiores Fintechs, Eduardo Lopes, ressaltou o forte aumento da competição e inclusão bancário promovida por essas instituições no Brasil nos últimos anos.
Ele destacou que a base de clientes pessoa física dobrou entre 2019 e 2025, atingindo 163 milhões pessoas, enquanto a base de clientes empresariais passou de 3,5 milhões para 13,7 milhões. Lopes também ressaltou a desconcentração do mercado de crédito e de cartão de crédito e a queda de quase 3 pontos porcentuais no juro bancário.
“A gente, de fato, tem no sistema financeiro alguns desafios muito prementes que estamos enfrentando e temos que seguir enfrentando. Acho que a fraude, sem dúvida, é um deles. A segurança, de forma geral, é uma delas”, completou.
Para ele, o aumento desses problemas de fraude e crimes digitais acabam sendo um efeito de uma política pública bem sucedida de promoção de uma agenda de maior competição, maior inclusão, maior cidadania financeira. “Eu trouxe todos esses dados porque a gente não pode perder de perspectiva, a meu ver, o impacto positivo que essa agenda trouxe para o país, que foi conduzida, de novo, repito, por meio de uma política pública executada pelo regulador e implementada pelos agentes de mercado. Agora, é óbvio que esse sucesso todo atraiu, obviamente, a criminalidade”, completou.
Lopes afirmou que é importante olhar para o lado prudencial, mas também da perspectiva de segurança e de combate à fraude, para que se tenha uma regulação também atualizada.
Para ele, os problemas que surgiram forçaram o regulador a acelerar a implementação de uma série de normas nessa direção. “Eu acredito que essa evolução da regulação, esses ajustes, também têm sido feitos, e é importantíssimo que eles sejam feitos. Porque, como eu disse, como sociedade, como setor e como agentes da mudança, no caso das empresas que representam, nós não estamos dispostos a retroceder nessa agenda. E a única forma de assegurar que nós não retrocedamos nessa agenda é ter certeza de que a gente siga evoluindo com responsabilidade e com segurança, para que os consumidores possam se beneficiar dessa transformação”, afirmou.
Conduzindo os debates, a presidente da FIN (Confederação Nacional das Instituições Financeiras), Cristiane Coelho, reforçou a necessidade de se buscar aumentar a concorrência no sistema, mas priorizando a prudência e a integridade. “Um sistema financeiro forte, denso e perene é um objetivo que paira por cima de todas essas instituições”, afirmou.
Após o Painel, Coelho, Lopes e Sidney anunciaram que, na próxima terça-feira (2/12), junto com o Ministério da Justiça, serão apresentadas as ações feitas ao longo do último ano no âmbito da Aliança Nacional de Combate a Crimes e Fraudes Digitais.
*O jornalista viajou a convite do Fibe