O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), escolheu o deputado Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP) como relator do projeto de lei que cria um Código de Defesa dos Contribuintes e regulamenta a figura do devedor contumaz (PLP 125/2022). O anúncio se deu após operação do governo de São Paulo e do Ministério Público contra o Grupo Fit deflagrada na manhã desta quinta-feira (27/11). A empresa é suspeita de envolvimento em esquema de fraude fiscal e ocultação patrimonial na cadeia de combustíveis. As investigações apontam prejuízo superior a R$ 26 bilhões em dívida ativa. O grupo é classificado como o maior devedor contumaz do país.
O projeto do devedor contumaz está estagnado na Câmara desde setembro. Ele foi aprovado no Senado na esteira da mega operação Carbono Oculto. A ofensiva, orquestrada pela Polícia Federal e pela Receita Federal, mirou um esquema bilionário de fraudes, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro que teria movimentado mais de R$ 52 bilhões.
Motta anunciou a relatoria do PLP em publicação nesta tarde na rede social X: “A segurança pública também passa pela segurança econômica. Por isso, a Câmara avança no combate às fraudes no setor de combustíveis com um combo de projetos estruturantes”.
Ele também definiu relatores para outras propostas associadas ao setor de combustíveis. Otto Alencar Filho (PSD-BA) relatará o projeto que garante acesso da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) às notas fiscais na cadeia de combustíveis (PLP 109/25); Alceu Moreira (MDB-RS) relatará a proposta de endurecimento de pena para adulteração de combustíveis (PL 399/25) e Junior Ferrari (PSD-PA) será relator da proposição que cria um Operador Nacional do Sistema de Combustíveis (PL 1923/24).
PT quer votação em plenário na terça
O líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), afirmou, depois do anúncio de Motta, que o projeto do devedor contumaz é a “prioridade número um do governo” e o “centro de atuação do Ministério da Fazenda”. O partido vai pressionar as lideranças da Câmara para que o PLP seja votado na próxima terça-feira (2/12) e vai se posicionar de forma unânime pela aprovação. Motta ainda não definiu quando levará o projeto ao Plenário.
“O PT vai fechar questão em relação ao devedor contumaz porque a gente quer a unanimidade da bancada e que essa votação seja feita nesta terça”, disse Lindbergh a jornalistas. “Essa é a prioridade número um do governo. Falei hoje com o ministro (da Fazenda, Fernando) Haddad. Isso é o centro da atuação do Ministério da Fazenda. O PL do devedor contumaz é a prioridade máxima do governo agora. A gente quer discutir benefícios tributários também, que é importante. Votar orçamento, votar LDO, mas o PL do devedor contumaz é a prioridade máxima do governo”, declarou.
Há um mês, a Câmara aprovou a urgência do projeto do devedor contumaz, medida que abrevia a trajetória do PLP na Casa e, em tese, agilizaria a sua tramitação. À época, Motta disse que iria definir um relator para a proposta na semana seguinte. O deputado Danilo Forte (União-CE) era considerado o favorito para a função. Na última semana, o nome de Alceu Moreira passou a ganhar força por meio de articulação de frentes parlamentares ligadas ao agro e ao setor de combustíveis.
Haddad cobra aprovação
O ministro da Fazenda disse, na manhã desta quinta-feira (27), que é preciso aprovar a PLP 125/22 em comentário a jornalistas sobre a operação contra o Grupo Fit. “Se sancionarmos o devedor contumaz este ano, entramos mais forte contra o crime em 2026”, afirmou. Haddad disse também que o ministério “sempre” insistiu na “necessidade imperiosa” de votar a proposta.
“Nós estamos há três anos militando junto ao Congresso Nacional. Por ocasião da Carbono Oculto, nós tivemos a aprovação no Senado de um projeto combinado com o Governo Federal. Não é um projeto de oposição e situação, o Senado foi unânime em aprovar”, afirmou. No Senado, o PLP foi aprovado com 71 votos a 0.
Entenda o projeto
A proposta tem origem no Senado. Veio de um anteprojeto elaborado por uma comissão de juristas e, posteriormente, apresentado pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Definição: O texto do PLP 125, aprovado pelo Senado e sem nenhuma alteração, por ora, na Câmara, define como devedor contumaz o contribuinte que mantém inadimplência reiterada, relevante e sem justificativa no pagamento de tributos. No âmbito federal, o enquadramento ocorre quando há débitos a partir de R$ 15 milhões, inscritos em dívida ativa ou declarados e não pagos, valor que deve superar 100% do patrimônio informado no último balanço, além de irregularidade em quatro períodos consecutivos ou seis alternados de apuração dentro de 12 meses. Também entra nessa classificação quem for parte relacionada a empresa baixada ou declarada inapta nos últimos cinco anos com débitos nesse patamar. Estados, Distrito Federal e municípios poderão fixar seus próprios critérios por lei, e o Executivo fica autorizado a ajustar os valores; preenchidos os requisitos, o contribuinte será incluído em cadastro específico, salvo se houver justificativas objetivas que afastem a caracterização.
Medidas aplicadas: Ao devedor contumaz serão aplicadas medidas que incluem perda do direito a benefícios fiscais, impedimento de participação em licitações e de formalização de vínculos com o poder público, vedação à recuperação judicial, declaração de inaptidão da inscrição no cadastro de contribuintes enquanto durar a irregularidade, além de submissão ao rito do contencioso administrativo. Também está prevista a possibilidade de suspensão do CNPJ pela Receita Federal, com paralisação das atividades, após notificação prévia que concede 30 dias para quitação e o parcelamento dos débitos ou comprovação de patrimônio suficiente.
Extinção da punibilidade: o projeto afasta a aplicação da regra atual do Código Penal que extingue a punição mediante pagamento espontâneo do débito antes do início da ação penal, vedando esse benefício aos devedores contumazes.
Programas de conformidade: o PLP incorpora dispositivos do PL 15/2024 e prevê a regulamentação dos programas Confia (Conformidade Cooperativa Fiscal), Sintonia (Estímulo à Conformidade Tributária) e regras para o Operador Econômico Autorizado (OEA), garantindo aos bons pagadores atendimento simplificado, maior flexibilidade para aceitação ou substituição de garantias, incluindo a troca de depósito judicial por seguro-garantia, e a possibilidade de antecipar garantias para regularizar débitos futuros.
Combate ao uso de “laranjas” no setor de combustíveis: o texto altera a Lei do Petróleo para exigir capital social mínimo de R$ 1 milhão para revenda, R$ 10 milhões para distribuição e R$ 200 milhões para produção, além de comprovação da licitude dos recursos financeiros e da identificação do titular efetivo das empresas, com fiscalização pela ANP.
Obrigações acessórias e adaptação federativa: a proposta prevê ainda que instituições de pagamento ficarão sujeitas a obrigações acessórias definidas pelo Executivo para ampliar fiscalização e transparência, enquanto estados e municípios terão até um ano após a publicação da lei para adequar suas legislações, observando o prazo de 90 dias para a implementação dos programas de conformidade.