São muitas as razões que levaram o presidente Lula a trocar Márcio Macêdo por Guilherme Boulos na Secretaria-Geral da Presidência. A pasta é responsável pela interlocução com os movimentos sociais. Mas sua posição geográfica, no quarto andar do Palácio do Planalto, a um lance de escada do gabinete presidencial, é estratégica e denota uma proximidade com o poder que é privilégio de poucos em Brasília.
Conheça o JOTA PRO Poder, plataforma de monitoramento que oferece transparência e previsibilidade para empresas
Apesar da longa fritura a que foi exposto, e de algumas broncas públicas, não se pode dizer que Lula não confiava em Macêdo. Ele era um dos poucos que matinha relação pessoal com o presidente —suas esposas, inclusive, são amigas. Atuou como tesoureiro da campanha do petista em 2022 e foi responsável por montar toda a participação social na COP30, em Belém. Macêdo também reabriu as portas do Planalto para os movimentos, com quem mantinha boa interlocução.
O problema com Macêdo, no entanto, era não ser um Boulos. De perfil discreto, fala mansa e retórica um tanto burocrática, ele não conseguia mobilizar, agitar, incendiar esses segmentos que historicamente acompanham o presidente.
No terceiro ano de seu terceiro mandato, Lula não viu até aqui sua liderança sobre a esquerda refletida nas ruas. E a única manifestação significativa da esquerda até aqui, contra a PEC da impunidade, não teve nenhuma digital de Macêdo em sua organização. O ex-ministro tampouco tomava a frente nas redes sociais para defender o governo e fazer o contraponto ao bolsonarismo e aos ataques da oposição.
O que se espera de Boulos, antes de mais nada, é justamente esse papel de agitador e combatente. E ele já entrou no personagem no evento de transmissão de cargo, começou com um discurso cheio de sinais e recados no evento de transmissão de cargo, nesta quarta-feira, em um Planalto repleto de integrantes de diferentes movimentos sociais.
Sua “missão”, disse, “é colocar o governo na rua” e, ao mesmo tempo, “apresentar o que o governo tem feito pelo povo brasileiro, pela maioria do nosso povo”.
Inscreva-se no canal do JOTA no Telegram e acompanhe as principais notícias, artigos e análises!
Nesse mesmo trecho do discurso, Boulos deu outra dica. Tentará trazer para o Palácio do Planalto uma categoria com a qual Lula tem encontrado dificuldades imensas de se aproximar: os trabalhadores de aplicativos, com quem o agora ministro manteve boa interlocução durante sua passagem pela Câmara.
“É preciso dialogar com todos, não só com quem concorda com a gente. Dialogar com os entregadores de aplicativo que estão aqui representados, com os motoristas de Uber, junto e liderado pelo meu companheiro Luiz Marinho, ministro do Trabalho”, disse.
A mobilização que Boulos pretende promover precisa de uma ou mais causas como faísca. A mais clara parece ser o fim da escala 6×1, classificada como “vergonhosa” por ele em seu discurso. Nos bastidores do Planalto, comenta-se que essa é uma discussão em que vale a pena para o governo se colocar a favor, mesmo que saia derrotado no voto na Câmara, assim como foi no caso do decreto do IOF.
O psolista também deixou claro que, à diferença do antecessor, vai para o embate com o bolsonarismo. Tira, assim, de Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) o peso de ser a única entre os ministros palacianos a desempenhar esse papel nas redes sociais com algum vigor, ainda que sem a mesma vocação de Boulos.
“Não tem diálogo com quem ataca a democracia e trai o Brasil. Com esses não tem diálogo”, disse o ministro em sua posse. “Se eles são contra o sistema, por que não apoiam nossa proposta de taxar milionário e bet? Por que não apoiam o fim da escala 6×1? Precisamos trazer isso para berlinda, para o debate público no Brasil.”