Pesquisa mostra queda de mortalidade em cidades com hospitais geridos por OSS

Estudo feito por pesquisadores do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e do Insper mostra que a administração de hospitais públicos por meio de Organizações Sociais de Saúde (OSS) pode trazer impacto positivo para o paciente e para o atendimento, desde que bem conduzida.

A partir de dados do Sistema Único de Saúde (SUS) reunidos entre 2005 e 2022 e da análise do desempenho de 96 hospitais administrados por OSS, a pesquisa identificou ganhos na produção hospitalar, melhora no acesso e nos indicadores de saúde, como queda da mortalidade nos municípios analisados.

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Embora traga um novo olhar para esta forma de administração, resultados também trazem um alerta: “O modelo não está imune a riscos de captura, fraude ou má gestão. Problemas de implementação podem limitar potenciais benefícios”, conclui o trabalho, coordenado pelo diretor de pesquisa do IEPS e professor da FGV, Rudi Rocha. A pesquisa foi financiada pela UMANE.

A transferência da administração de hospitais públicos para OSS é prevista em lei desde a década de 1990. O Supremo Tribunal Federal confirmou a constitucionalidade desta parceria público-privada. No modelo, a transferência da administração de unidades públicas é feita mediante um contrato, com metas e valores definidos. 

Desde a sua implementação, no entanto, o modelo enfrenta resistências, reforçadas por registros de fraudes e acordos superfaturados. Um dos escândalos de maior notoriedade envolveu o ex-governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel, com denúncias de desvio de recursos em OSS que administravam Unidades Básicas de Saúde no Rio e hospitais de campanha, instalados para enfrentamento da Covid-19.

Mais acesso

O estudo do IEPS e do Insper, contudo, traz à tona dados que são importantes levar em conta para se traçar políticas públicas. De acordo com o trabalho, a taxa de internação em hospitais que passaram a ser administrados por OSS aumentou  40%, houve redução do tempo no hospital e diminuição de reinternações. Indicadores que representam um avanço na assistência. A rotatividade dos leitos aumentou em 23% e a taxa de ocupação, 14%, mostrando melhora na gestão.

Ainda de acordo com o trabalho, desenvolvido em hospitais de 17 estados, foi identificada redução média de 3% da mortalidade nas cidades atendidas por hospitais com esta forma de gestão. A queda se deu sobretudo em mortes ocorridas em residências ou nas ruas, indicando uma melhora no acesso a serviços hospitalares. 

Em entrevista ao JOTA, Rocha resumiu: “Encontramos na média algo positivo. Mas há também uma heterogeneidade importante”. O coordenador observa que o bom desempenho está relacionado a contratos bem desenhados, à implementação correta e à capacidade de o governo monitorar o trabalho que vem sendo realizado. “É preciso uma seleção bem feita e criteriosa das instituições.”

Prováveis causas

Rocha observou ainda que resultados mais consistentes foram identificados em hospitais geridos por OSS com maior experiência. “Isso indica que a efetividade deste modelo está ligada à qualidade dos gestores contratados”, afirmou o coordenador.

Além do aumento de produtividade em unidades geridas por organizações mais experientes, o estudo constatou haver uma mudança nas relações de trabalho em hospitais onde há transição. A análise indica um aumento da proporção de médicos especialistas e uma substituição dos vínculos de trabalho, com migração de regime estatutário para contratos mais flexíveis, como CLT ou pessoa jurídica. “A maior autonomia na gestão de pessoas também gera aumento imediato nas admissões e desligamentos, em particular de médicos menos produtivos”, relata a pesquisa.

Para fazer a análise, pesquisadores avaliaram o desempenho de hospitais geridos por OSS antes e depois da transição. Foi também feito um acompanhamento em hospitais com gestão pública, de forma a permitir uma comparação. Dados como o perfil de pacientes também foram levados em consideração.

Sem transparência

Rocha é cuidadoso ao ser questionado sobre esta forma de gestão. “As iniciativas são heterogêneas. Para complicar, há uma deficiência de informação. Identificamos pouca transparência com relação a orçamento e gastos. Contratos não são padronizados. Em suma, avalio haver potencial de ganho muito grande se formos em direção à normatização nessa prática de contratos. Há espaços para melhorias.”

O trabalho mostrou, por exemplo, que das 96 instituições analisadas, apenas 18 apresentaram dados que permitiram análise de custo. “Este é um sinal de alerta”, observou o professor.

O secretário-executivo do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Jurandi Frutuoso, afirma haver preconceito em torno das OSS. “Há inúmeras experiências bem sucedidas. Inegavelmente, tudo vai depender da forma que o contrato for feito, da fiscalização do contrato, que deve ser feita com muito rigor e atenção”, disse. “Mas este modelo pode trazer maior agilidade e entregar grandes resultados”, acrescentou.

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A plataforma BDOSS identificou haver no Brasil 1.874 estabelecimentos geridos por OSS no Brasil presentes em 21 UFs e no DF. Os dados são de agosto de 2023 e se referem a todos os serviços geridos neste formato, o que inclui UPAs e Unidades Básicas de Saúde. 

O estudo feito pelo IEPS e Insper, contudo, concentrou-se no desempenho deste formato de gestão em hospitais. Pesquisadores destacam que não há como extrapolar a interpretação dos efeitos da mudança de gestão para outros serviços, como na atenção primária.

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