Projetos de lei contra o crime organizado no setor de combustíveis ganharam fôlego no Congresso após a Operação Carbono Oculto, deflagrada pela Receita Federal nesta quinta-feira (28/8) para desmantelar um esquema de fraudes e lavagem de dinheiro.
De acordo com as investigações, cerca de mil postos de combustíveis vinculados a uma rede criminosa movimentaram aproximadamente R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024. Foram emitidos mandados de busca e apreensão contra 350 alvos em 8 estados, e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ingressou com ações cíveis de bloqueio de mais de R$ 1 bilhão em bens dos envolvidos.
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Horas após a operação, as Frentes Parlamentares do Biodiesel (FPBio), da Agropecuária (FPA), do Empreendedorismo (FPE) e do Etanol emitiram nota conjunta elencando como prioridade a aprovação de um pacote de projetos de lei (PLs) para coibir o crime no setor.
“Diante da gravidade dos fatos, o Congresso Nacional tem agora a oportunidade e a responsabilidade de agir com celeridade. A sociedade não pode continuar pagando a conta de criminosos que corroem a concorrência leal, a arrecadação pública e a confiança do consumidor”, diz a nota.
Um dos projetos elencados como prioridade é o PL 109/2025, apresentado pelo deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS) e outros quatro coautores. A iniciativa daria à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) acesso a informações empresariais relativas à produção, comercialização, movimentação, estoques e preços de combustíveis.
O relator da matéria na Comissão de Minas e Energia (CME), deputado Tião Medeiros (PP-PR), apresentou nesta quinta-feira (28/8) um substitutivo para restringir o acesso da ANP somente a informações relativas ao volume e natureza das operações. A justificativa para a mudança é evitar o compartilhamento de informações sensíveis aos diversos elos do setor de combustíveis.
O deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), que é um dos autores do projeto, disse ao JOTA que o parecer poderia enfraquecer a capacidade de atuação da agência para combater fraudes e adulterações, e que se estuda a apresentação de um relatório alternativo com o intuito de preservar o teor do projeto original.
Jardim também é relator na CME do PL 399/2025, que institui multa de até R$ 20 milhões para empresas que venderem combustível adulterado. O deputado afirmou que pretende apresentar já nesta sexta-feira (29/8) parecer favorável com sugestões de pequenos ajustes para garantir segurança jurídica.
“Estou comemorando a operação deflagrada nesta quinta”, afirmou Jardim, expressando otimismo com a possibilidade de avanço dos projetos no Congresso.
Outra iniciativa listada como prioridade das frentes parlamentares é o PL 1923/2024, que busca criar um sistema eletrônico de informações do Operador Nacional do Sistema de Combustíveis (ONSC).
“Precisamos sistematizar um sistema em que tenhamos o monitoramento e o controle de todo o sistema nacional de combustíveis para que não mais aconteçam essas fraudes. Cada brasileiro que comprasse 1 litro de combustível tinha 90% de chance de receber apenas 700 ml e de comprar um combustível com mistura que não é a determinada pelos órgãos competentes”, disse ao JOTA o deputado Júlio Lopes (PP-RJ), autor do projeto.
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A matéria aguarda o voto do relator na CME, deputado Júnior Ferrari (PSD-PA). Procurado, o parlamentar disse por meio de assessoria que o relatório está praticamente pronto e que deve se reunir na semana que vem com a FPBio para discutir o assunto. Ainda não há previsão de quando o parecer será apresentado.
No Senado, pode haver entraves na negociação dos projetos. As frentes parlamentares listaram como prioridade o projeto de lei complementar 164/2022, que estabelece normas gerais para identificação e controle dos devedores contumazes.
O projeto está parado desde abril na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Ao JOTA, o relator, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), explicou que está com o seu voto pronto, mas aguarda que o presidente do colegiado, Renan Calheiros (MDB-AL), paute o texto para votação.
Tramita no Senado outra iniciativa com o mesmo teor, o projeto de lei complementar 125/2022, que está pronto para deliberação em plenário. O relator Efraim Filho (União-PB) disse em entrevista à CNN que pedirá a inclusão da matéria na pauta do Plenário na próxima semana.
“O projeto já foi à pauta em dezembro do ano passado, e a própria liderança do governo foi quem pediu a retirada da pauta. Então, com essa operação, eu espero que esse projeto volte a estar na vitrine das prioridades do governo”, afirmou o senador.
Uma das principais diferenças entre os dois projetos sobre devedores contumazes é que o PLP 64/2022 endereça nominalmente o setor de combustíveis e biocombustíveis como alvos da lei, enquanto o PLP 125/2022 não faz menção direta ao setor.
Reforma tributária também entra na lista
No final da tarde desta quinta-feira, Veneziano apresentou uma emenda ao PLP 108/2024 com o objetivo de excluir centrais petroquímicas da incidência monofásica do ICMS e do IBS/CBS sobre operações com combustíveis prevista na lei da reforma tributária.
A ideia é evitar fraudes na importação da nafta, derivado do petróleo utilizado pela indústria petroquímica, que tem sido utilizada na formulação e adulteração de combustíveis – atividade que foi revelada pela Carbono Oculto. A Copape, um dos alvos da operação, importava matéria-prima através de outros estados para driblar uma tributação mais alta e fabricava combustível com preços abaixo do mercado. Na prática, a emenda de Veneziano tem o efeito de aumentar os impostos sobre a substância.
O projeto de lei complementar busca instituir o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (CG-IBS). A matéria está recebendo emendas para subsidiar a formulação parecer do relator Eduardo Braga (MDB-AM) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado.
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Veneziano, que é presidente da Frente Parlamentar para o Desenvolvimento Sustentável do Petróleo e Energias Renováveis (FREPER), afirmou que a redação da emenda foi negociada junto a empresas do setor petroquímico.
“A redação adotada foi cuidadosamente negociada entre representantes do setor petroquímico e entes públicos, de forma a garantir equilíbrio entre o objetivo extrafiscal da norma e a preservação de atividades industriais legítimas, com segurança jurídica e aderência à regulação da ANP. […] Foi inserida previsão de que os valores de tributos arrecadados em função da alteração legislativa ora proposta serão destinados a plano de estímulo voltado à indústria química”, escreveu o senador na justificativa da emenda.