O Ministério Público Federal comunicou à Justiça que abrirá uma investigação própria para apurar a conduta de agentes da Secretaria de Segurança Pública que espionaram ativistas indígenas durante a ocupação da Secretaria de Educação do Estado do Pará. O caso ganhou repercussão após reportagem do JOTA revelar o conteúdo do depoimento do delegado Carlos André Viana. Na oitiva, pelo contexto, Viana dá a entender que agentes vinculados ao Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos foram infiltrados dentro do movimento para repassar informações sigilosas à cúpula do governo.
Na visão dos procuradores da República Thais Santi Cardoso da Silva, Rafael Martins da Silva e Felipe de Moura Palha e Silva, “é claramente ilegal e absolutamente preocupante” a prática de utilizar pessoas que têm acesso e confiança de protegidos ou pessoas ligadas a programas de proteção de defensores de direitos humanos como fontes de inteligência para monitorar movimentos sociais.
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“Essa conduta, que revela uma intrusão inaceitável nas dinâmicas de auto-organização e mobilização social, transborda os limites da legalidade e do respeito aos direitos humanos. Por sua gravidade e implicações sistêmicas, o Ministério Público Federal informa que está extraindo cópia integral do presente depoimento e determinando a abertura de investigação própria e aprofundada sobre os fatos”, escrevem os procuradores da República.
Na mesma ação, o Ministério Público Federal pede que a Justiça determine o bloqueio das redes sociais do governador Helder Barbalho (MDB), que desde março se recusa a cumprir uma decisão liminar para que ele publique um vídeo de direito de resposta gravado por um grupo de indígenas do Pará.
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O pedido consta das alegações finais do MPF, na ação civil pública 1004678-39.2025.4.01.3900, que corre na 5ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Pará.
Nela, a juíza Maria Carolina Valente do Carmo havia decidido que o governador praticou desinformação em suas redes ao criticar um protesto de indígenas e professores em Belém, no começo do ano.
Na ocasião, Helder Barbalho publicou um vídeo em que afirmava que o movimento indígena que ocupava a sede da secretaria de educação em Belém começara a partir de uma desinformação e que os manifestantes se recusavam a deixar o prédio, mesmo com todas suas reivindicações atendidas. A Justiça considerou que isso não era verdade e determinou a retirada desse post das redes do governador.
Apesar de obrigado a se retratar e dar espaço aos manifestantes em suas páginas, Helder Barbalho preferiu não acatar a ordem, alegando que a publicação causaria prejuízos políticos às vésperas da COP30, que acontecerá em novembro na capital paraense. O caso foi noticiado pelo JOTA em junho.
Na manifestação enviada à Justiça nesta quarta-feira (27/8), os procuradores da República afirmam que “a não veiculação do direito de resposta [perpetua] a desinformação, [estigmatiza] os povos indígenas e quilombolas, e [mina] a legitimidade de um movimento social pacífico e justo.” O MPF requer a majoração da multa para até R$ 10 milhões contra o governo do Pará e outros R$ 10 milhões contra o governador Helder Barbalho, a serem revertidos para os indígenas, mediante bloqueio via Bacenjud.
O MPF também aponta que deve ser aplicada uma multa adicional de 2 milhões, o equivalente a 20% do valor da causa, pelo ato atentatório à Justiça do governador, de dolosamente não cumprir a decisão judicial. A partir do eventual reconhecimento de que houve um ato doloso de Helder Barbalho, ao descumprir a decisão, o MPF afirma que irá tomar “as devidas providências criminais cabíveis” contra o governador paraense.
Para o MPF, já está claro que Helder Barbalho não pretende cumprir a ordem, mesmo sob ameaça de multa: “As medidas coercitivas inicialmente determinadas foram insuficientes para superar essa resistência política”, escreveram os procuradores da República, que já haviam pedido antes a suspensão das redes, o que a juíza Maria Carolina Valente do Carmo negou. Eles pedem que ela reconsidere essa primeira decisão.
“Em outras palavras,” segundo o MPF, a magistrada “deve determinar medidas coercitivas proporcionais ao ônus político que o governador julga ter que assumir perante a opinião pública ao postar um vídeo de direito de resposta dos indígenas em suas redes sociais, sob pena da determinação judicial nunca ser cumprida.”
A defesa de Helder Barbalho argumentou no processo que a publicação do vídeo dos indígenas poderia causar prejuízos à imagem do governador, especialmente durante os preparativos para a COP30.
“Tal publicação pode ocasionar graves prejuízos à imagem institucional do Governador do Estado, que, ao longo de toda a controvérsia, manteve postura colaborativa para viabilizar a melhor resolução possível”, escreveram os advogados Arthur Siso Pinheiro, Leonardo Maia Nascimento, Antonio Reis Graim Neto e Leonardo Sá De Barros Souza, advogados de Helder Barbalho.