Lula não será indenizado por capa da Veja em que é retratado como presidiário, decide STJ

Por 4 votos a 1, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, nesta terça-feira (19/8), que a Abril Comunicações não deve indenizar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela capa da revista Veja, do dia 1º de novembro de 2015, que estampava uma montagem com o então ex-presidente da República retratado com roupa de presidiário. A vestimenta era composta por nomes de aliados de Lula, como José Dirceu e Rosemary Noronha, e por empresários que estavam sendo investigados por corrupção, como Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro, no âmbito da Lava Jato. Ao lado, lia-se a chamada: “os ‘chaves de cadeia’ que cercam Lula”. A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, João Otávio de Noronha

Para Noronha, as matérias jornalísticas baseadas em fatos verídicos ou ao menos verossímeis – mas não necessariamente incontroversos –, ainda que delas constem manifestações severas, irônicas, impiedosas, por si sós, não ensejam dano indenizável.

Informações direto ao ponto sobre o que realmente importa: assine gratuitamente a JOTA Principal, a nova newsletter do JOTA

“O que importa é que a divulgação seja de interesse público e que sejam preservados os direitos da personalidade daquele que foi exposto pela mídia”, destacou Noronha. Ele foi acompanhado pelos ministros Raul Araújo, Marco Aurélio Buzzi e Maria Isabel Gallotti.

Ao votar, Gallotti pontuou que, no caso em análise, “não se trata aqui de uma falsificação de uma foto ou uma produção de uma foto por inteligência artificial que retratasse o ex-presidente vestido com uma real roupa de presidiário, numa situação que revelasse estar ele dentro de um presídio, caso em que estaria passando informação falsa à sociedade”.

Capa da revista Veja, do dia 1º de novembro de 2015, que estampava uma montagem com o então ex-presidente da República retratado com uma roupa de presidiário. / Crédito: Veja/Divulgação

Na avaliação de Gallotti, a capa em questão revela a opinião da revista e uma crítica “ácida, ardente, veemente, que certamente causou dissabor ao autor”, mas sendo o presidente Lula uma pessoa pública, “ele tem que arcar com essa diminuição do direito à privacidade ou a críticas, já que os fatos têm relação com o exercício de atividades públicas e não com sua vida pessoal”. 

Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email

O julgamento do recurso foi retomado nesta terça-feira (19/8) com o voto-vista do ministro Antônio Carlos Ferreira, que se manifestou para determinar que a Abril indenizasse o presidente Lula no valor de R$ 50 mil. O voto do ministro foi o único nesse sentido. 

Ao proferir o voto, Ferreira considerou o impacto negativo da imagem como “incontornável”, e cuja a falsidade é “patente”. Na avaliação dele, trata-se de uma ofensa objetiva e grave que não encontra respaldo na liberdade da imprensa, pois esta não pode servir de escudo para práticas que violem direitos da personalidade. 

“O direito de informar não pode se transmudar do direito de desinformar, deturpar e degradar a imagem de quem quer que seja, sobretudo quando ausente qualquer suporte fático para tanto”, declarou Ferreira. Assim, o ministro pontuou que o jornalismo pode e deve criticar, investigar e informar, mas não tem o direito de “fabricar realidades alternativas que distorçam a percepção pública e manchem a reputação de indivíduos”.  

No caso, o ministro disse que a capa da revista Veja não se limitou a reportar fatos, pois criou uma “narrativa visual artificialmente comprometedora”, na qual a própria imagem da capa – em que o presidente está vestido com traje de presidiário – já sentencia e condena, sem qualquer respaldo na realidade jurídica da época. 

“Ainda que por meio oblíquo, com a apresentação de imagem editada por meios digitais, configura ato ilícito a divulgação de informação falsa, que faça o destinatário presumir que a pessoa ali representada esteja cumprindo, ou mesmo às vésperas de cumprir, pena em estabelecimento prisional, o que, naquele momento, não se apresentava sequer como provável, visto que o agravante não era investigado, denunciado e muito menos réu”, afirmou Ferreira.

Conheça o JOTA PRO Poder, plataforma de monitoramento que oferece transparência e previsibilidade para empresas

O agravo foi interposto pela defesa de Lula após o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negar seguimento ao recurso especial contra a decisão do tribunal paulista que indeferiu o pedido de indenização requerida por Lula.

Antes, na decisão em que também havia negado o pedido do presidente, o desembargador Ronnie Herbert Barros Soares, da 10ª Câmara de Direito Privado do TJSP, declarou que a “fotografia, por si só, não justifica a imposição de qualquer indenização, pois nada mais significou do que o indicativo, claro para quem observa a chamada da capa ou lê a matéria, de que a condição do autor poderia ser a mesma das pessoas nela indicada, qual seja, a cadeia”.

A decisão dos ministros foi tomada no REsp 1.824.219.

Generated by Feedzy