O plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta segunda-feira (15/12), por unanimidade, que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve arcar com o salário de mulheres vítimas de violência doméstica pelo período de até seis meses de afastamento do trabalho que for concedido com base na Lei Maria da Penha. A exceção fica apenas para os primeiros 15 dias, que serão arcados pelo empregador.
A regra vale para mulheres que são seguradas Regime Geral de Previdência Social (RGPS), ou seja, aquelas que contribuem com o INSS por meio de seu emprego ou de forma individual (como nos casos de autônomos ou MEIs, por exemplo).
A Corte também decidiu que mesmo as mulheres que trabalham de forma informal e não contribuem com o INSS devem ter direito a um benefício, caso a Justiça decida pelo afastamento de suas atividades de trabalho nos casos de violência. Nessa situação, o valor deverá ser bancado pela assistência social.
Os ministros seguiram a proposta do relator, Flávio Dino. O caso tem repercussão geral reconhecida, então o entendimento deverá ser aplicado em todas as instâncias do Judiciário em processos sobre o tema.
Sancionada em agosto de 2006, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) estabelece que mulheres protegidas por medida judicial têm estabilidade no emprego por até seis meses, quando for necessário o afastamento do local de trabalho. Restava a dúvida, porém, sobre quem deveria custear o salário durante esse período.
Tipos de vínculos
Dino propôs que o responsável pelo pagamento dependerá da natureza do benefício, que por sua vez varia de acordo com o vínculo existente entre a mulher e a seguridade social.
Segundo Dino, o benefício terá natureza previdenciária se a vítima for segurada do RGPS, como empregada ou como contribuinte individual, facultativo ou segurada especial.
Nos casos em que a mulher for empregada, a remuneração dos primeiros 15 dias será de responsabilidade do empregador e o restante do período deve ser custeado pelo INSS. Caso inexista relação de emprego, os pagamentos devem ser arcados integralmente pelo INSS.
Nos casos em que não houver emprego mas a mulher contribua com a Previdência, o custeio cabe ao INSS. São enquadradas na situação, por exemplo, as mulheres que trabalham como diaristas em serviços domésticos, ambulantes, autônomas, microempreendedoras individuais (MEIs), desde que contribuam com o INSS por conta.
O benefício, porém, pode ter natureza assistencial, quando a mulher não for segurada da previdência. Ou seja, quanto trabalhar de forma autônoma e informal, sem contribuir para o INSS.
Nessa hipótese, conforme o relator, o pagamento assume caráter de benefício eventual por vulnerabilidade temporária. Pela decisão, cabe ao Estado garantir a assistência financeira necessária. O juiz terá que atestar que a mulher não possui meios de prover sua própria manutenção.
O benefício por vulnerabilidade temporária, garantido pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS) não tem um valor específico. Ele é determinado pelo poder público de acordo com as necessidades e demandas da família e com o custo de vida local.
Pelo voto de Dino, ao determinar o afastamento do local de trabalho da trabalhadora informal vítima de violência doméstica, o juiz deverá analisar, caso a caso, a necessidade de fixar benefício assistencial eventual de acordo com a situação de vulnerabilidade temporária.
A tese proposta por Dino também aborda a competência para determinar a medida protetiva. Para o relator, cabe ao juízo estadual determiná-la. No caso de ações regressivas ajuizadas pelo INSS contra os responsáveis pela violência, porém, o ministro entende que a competência passa a ser da Justiça Federal.
O ministro Nunes Marques foi o único a apresentar seu voto escrito no julgamento. Ele ponderou que o pagamento do benefício à mulher em vulnerabilidade pode ser concedido pela Justiça estadual, mas que o caso deve ser remetido à Justiça Federal. No caso da vítima que contribui com o INSS, o ministro entendeu que a demanda deve ser debatida pelas vias administrativas e que compete ao Juízo federal avaliar a ação ou omissão do INSS no caso.
A discussão no STF foi feita no Recurso Extraordinário (RE) 1520468 (Tema 1.370). O caso chegou ao Supremo por meio de recurso apresentado pelo INSS sobre decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que considerou válida determinação da Justiça estadual do Paraná para que a autarquia arque com os salários de uma mulher nessa situação.
Segundo os autos, o INSS argumenta que não é possível estender a proteção previdenciária a situações em que não há incapacidade para o trabalho provocada por alguma lesão. Alega, ainda, que apenas a Justiça Federal poderia deliberar sobre o pagamento de benefícios previdenciários ou assistenciais