Presidente da Aconcarf defende adicional de periculosidade a todos os conselheiros do Carf

Em entrevista ao JOTA, a presidente da Associação dos Conselheiros dos Contribuintes do Carf (Aconcarf), Ana Cláudia Borges, defendeu que o adicional de periculosidade concedido aos conselheiros da Fazenda deve ser estendido também aos outros julgadores do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). “Sendo um órgão que tem uma representação paritária, deveria abranger todos os conselheiros dos contribuintes quanto os conselheiros fazendário”, argumentou.

Na última semana, o JOTA revelou que uma portaria do Carf publicada no dia 3 de dezembro concedeu adicional de periculosidade aos conselheiros representantes da Fazenda Nacional que atuam no órgão pelo fato de eles julgarem processos presenciais.

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O órgão justificou que um laudo técnico concluiu que o grupo de servidores do Carf que atuam no “Macroprocesso de Julgar Recurso Voluntário, de Ofício, Especial e Embargos (CONSELHEIROS regidos pela Lei nº 8.112/90), têm direito ao adicional de periculosidade, considerando a situação de exposição ao risco de violência física na realização de sessões presenciais em ambiente laboral aberto ao público”. Os conselheiros indicados pelos contribuintes, que participam das mesmas sessões, contudo, não fariam jus ao benefício.

“A gente tem esse projeto de lei que está sendo trabalhado para contemplar tanto os conselheiros da Fazenda quanto os contribuintes por meio de uma lei, e não de um ato infralegal como essa portaria hoje”, justificou Borges.

“Apesar de ser um órgão paritário, nós, conselheiros, temos as mesmas condições de trabalho ali, trabalhamos no mesmo órgão. A grande questão é que nós temos regimes jurídicos diferentes. Então, ainda que a gente esteja trabalhando dentro do mesmo lugar, com as mesmas condições, esse regime jurídico pede que alguns atos administrativos sejam tomados ao nosso favor. Não que a gente ache isso correto”, afirmou.

O projeto de lei mencionado por Borges ainda não foi protocolado. O JOTA teve acesso a uma minuta do texto preliminar, que praticamente replica replica integralmente a justificativa usada pela área fazendária ao defender o benefício: operações envolvendo organizações criminosas e a suposta exposição dos julgadores ao risco em sessões presenciais.

Risco real? ‘Tendo a acreditar que não’

A portaria do Carf se baseia em um laudo técnico que aponta risco de violência física nas sessões presenciais, abertas ao público e transmitidas ao vivo — argumento central usado para justificar a periculosidade. Questionada se existe um risco real durante as sessões, Borges respondeu: “Olha, eu tendo a acreditar que não, tá? Mas eu também não trabalho na polícia, nunca trabalhei, não sei falar em termos de segurança pública o que seria real ou não. Mas eu tendo a achar que essa violência presencial… eu não sei, ela pode ser uma cautela, né?”.

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Questionada se já houve algum episódio concreto de agressão, ameaça ou intimidação a conselheiros do Carf, Borges afirmou que não tomou conhecimento de nenhum caso.

Ao JOTA, o Carf justificou a medida ao apontar que “as recentes operações, amplamente noticiadas pela imprensa, tais como a Carbono Oculto, Estorno, Inflamável, dentre diversas outras, destacaram o risco a que estão expostos os auditores-fiscais da Receita Federal do Brasil. Essas ações envolvem, por vezes, não somente a mera apuração de tributos não pagos, mas a investigação e a autuação de organizações criminosas”.

Além disso, diz o órgão, “a maioria dessas ações desemboca no contencioso administrativo fiscal, onde o Carf profere a última decisão, tomada por auditores-fiscais exercendo a função de Conselheiro. Os julgamentos no Carf são abertos e transmitidos ao vivo pela internet. Os conselheiros, identificados não somente pelo nome completo, mas por sua fisionomia. As sessões têm sua pauta, local e horário previamente divulgados. Qualquer cidadão pode comparecer e acompanhar uma sessão. Há risco, portanto, tanto para quem investiga como para quem julga”.

O Carf também enfatizou que decisões dos conselheiros podem influenciar diretamente a continuidade de investigações criminais. “Ao julgar em última instância os processos com representação fiscal para fins penais, o Carf acaba por definir a continuidade das ações penais nos casos de crime contra a ordem tributária.”

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O órgão comparou o risco enfrentado pelos conselheiros ao de outros servidores que atuam na Receita Federal: “O risco assumido pelo Conselheiro não é inferior àquele incorrido por diversos outros colegas que trabalham na Receita Federal, em setores que, da mesma forma, se expõem de maneira clara e vulnerável, colocando em perigo sua integridade física.” Como exemplo de violência relacionada à atuação estatal, mencionou o assassinato do juiz federal Antônio José Machado Dias, assassinado a mando do PCC, em 2003, há 22 anos.

Busca por isonomia: regime jurídico próprio e paridade

A presidente da Aconcarf ressaltou que a discussão sobre o adicional expõe uma questão mais ampla: a ausência de um regime jurídico próprio para os conselheiros dos contribuintes, ao contrário dos representantes da Fazenda, que são servidores públicos regidos pela Lei 8.112/1990.

Segundo ela, há um esforço em andamento para corrigir essa assimetria. “A gente tem um projeto que estabelece um regime jurídico para nós, conselheiros dos contribuintes. Ele veio a princípio como se fosse um projeto de lei em 2022, mas como tem necessidade de iniciativa do Executivo, foi encaminhado do Senado para o Ministério da Fazenda.”

A proposta, registrada como Indicação nº 56, busca garantir segurança jurídica, igualdade remuneratória e paridade de condições — tema que ganha força agora com a controvérsia sobre o adicional.

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