Plataformas pedem seis meses para implementar responsabilidade exigida pelo STF

Plataformas digitais pediram ao Supremo Tribunal Federal (STF) o prazo de seis meses para implementar as obrigações exigidas a partir do julgamento do Marco Civil da Internet (MCI), que ampliou a responsabilidade das empresas por conteúdos postados por terceiros. Esse pedido foi feito tanto pelo Facebook —parte no recurso julgado na Corte — via embargos de declaração. O X também fez a mesma solicitação. Pela decisão do STF, as empresas devem retirar o conteúdo criminoso apenas com notificação, sem necessidade de determinação judicial.

O Supremo recebeu pelo menos seis embargos de declaração e três pedidos de esclarecimentos sobre a decisão das mais diferentes correntes, desde empresas, associação de consumidor até entidades empresariais — o que deve levar a Corte a rediscutir muitos aspectos. E detalhe: sob uma nova composição, desta vez sem o ministro Luís Roberto Barroso, que liderou o voto do consenso e se aposentou.

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Assim, os embargos devem ser julgados na gestão de Edson Fachin, uma das vozes contrárias à alteração da responsabilidade das plataformas. Nesse meio tempo, também pode surgir uma solução legislativa.

De uma forma geral, os recursos ajuizados pedem mais prazo para o início da execução da decisão. Não ficou claro o que o Supremo entendeu por “aplicação prospectiva”. Há também pedidos sobre a presunção e o uso de responsabilidade objetiva nos casos de aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

No documento apresentado à Corte, o Facebook argumenta que as obrigações impostas na decisão do STF são “típicas de regulação primária” e, portanto, é necessário um prazo de adequação, por isso a sugestão de seis meses. A empresa cita como exemplo de exigências a criação de um sistema completo de autorregulação para a derrubada de conteúdos, a disponibilização de canais de contato para denúncia de posts abusivos e a publicação de relatórios anuais de transparência.

“Tais obrigações demandam: (i) desenvolvimento de infraestrutura tecnológica específica; (ii) contratação e treinamento de pessoal especializado; (iii) elaboração de protocolos e procedimentos internos; (iv) adaptação de sistemas já existentes; e (v) adequação jurídica e regulatória em múltiplos níveis”, diz a empresa.

O X argumenta que legislações costumam dar um prazo de adequação e cita como exemplo a Lei Geral de Proteção de Dados que estabeleceu prazo de 24 meses para o início da validade da maioria dos artigos. Citou também o ECA Digital que entrará em vigor 6 meses após a sua publicação.

Presunção de responsabilidade

O Facebook também requer que fique claro que a presunção de responsabilidade das empresas é relativa e não absoluta nos casos de conteúdos ilícitos em anúncios e impulsionamentos pagos e distribuídos por robôs. Na prática, a presunção relativa permite que a plataforma apresente provas para demonstrar a inexistência de culpa pelo conteúdo postado, o que não ocorre na presunção absoluta.

O Facebook também solicita ao STF que os processos em curso com fatos anteriores ao julgamento da Corte sejam analisados conforme o regime jurídico à época. Ou seja, com menor responsabilidade para as empresas. Outro item requerido pelo Facebook é a inserção do termo “manifestamente” antes das expressões que descrevem o conteúdo como criminoso ou ilícito

Responsabilidade pelo CDC

Já o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) fez um pedido diferente. Para a entidade, o STF deve deixar claro que a responsabilidade dos provedores é objetiva no caso de anúncios e impulsionamentos pagos, pois se trata de uma relação de consumo. De forma subsidiária, o Idec pede que se prevalecer a responsabilidade subjetiva, deve haver presunção de culpa e inversão do ônus da prova em desfavor da plataforma.

Pela responsabilidade objetiva não é necessário provar culpa (negligência, imprudência ou imperícia) para que alguém seja obrigado a indenizar.

O Idec também entende que deve continuar prevalecendo a responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor nas relações de consumo estabelecidas com marketplaces. Ainda, requer que o STF esclareça que a publicidade patrocinada ou o conteúdo impulsionado veiculados em serviços de e-mail e de mensageria instantânea não se enquadram na categoria de “comunicações interpessoais” e, portanto, submetem-se ao regime de responsabilidade aplicável a anúncios e impulsionamentos pagos.

O Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS) também requer que o Supremo reconheça a coexistência dos dois regimes específicos de responsabilidade. O CDC para as obrigações decorrentes da relação de consumo e o MCI para a disciplina da remoção e responsabilização por conteúdos de terceiros nos marketplaces.

Outra entidade que até então não tinha participado e que pediu para ingressar como amicus curiae foi a Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). Entre os pedidos, a entidade requer que seja prevista especificamente a aplicação do regime de responsabilização também para as hipóteses de fraudes e phishing.
Termos

Já a Sleeping Giants Brasil requer a definição de termos como “atuação diligente”, “tempo hábil” e o conceito de “rede artificial de distribuição”, para fins de aferição da responsabilidade das plataformas digitais.

Ainda, pede para sanar a obscuridade quanto à cooperação institucional entre os Poderes da República, esclarecendo a possibilidade e o dever de atuação do Poder Executivo na implementação, regulamentação e fiscalização das normas decorrentes da decisão, de forma articulada com o Legislativo e o Judiciário.

“Esse é um tema que tinha que ser solucionado por meio de lei. Os vácuos que a decisão do Supremo tem são característicos de disposição de lei, como a vacatio [tempo para começar a valer uma lei], definições como o que é dever de cuidado, o que é atuação diligente, entre outros”, explica André Giacchetta, sócio do Pinheiro Neto e especialista em mercado de tecnologia.

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