Ajuste redacional na MP 1304 é essencial para preservar segurança jurídica

A recente conversão da Medida Provisória 1.304/2025 no PLV 10/2025 marcou um avanço importante no processo de modernização do marco legal do setor elétrico. Ao tratar da disciplina da autoprodução por equiparação, o texto inova em uma tentativa de trazer maior competitividade e diversificação de investimentos para o setor.

No entanto, um detalhe técnico passou quase despercebido no Congresso e precisa de correção antes da sanção presidencial. Trata-se da remissão inserida no §7º do artigo 16-B da Lei 9.074/1995, um ponto aparentemente menor, mas que, se mantido como está, pode gerar insegurança jurídica e interpretações equivocadas em um tema central para o equilíbrio regulatório do setor.

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Ao reordenar o dispositivo, o texto atual acabou vinculando o marco temporal de 15 de junho de 2007 ao inciso I do §1º, que trata da forma de participação societária, quando, na verdade, o nexo lógico e histórico sempre esteve nas hipóteses transitórias do §5º, inciso III, alíneas “a” e “b”. São essas alíneas que disciplinam as situações em que o agente deve comprovar documentalmente, em até três meses contados da publicação da lei, seu arranjo de autoprodução junto à CCEE e concluir o processo societário em até 36 meses.

Essa estrutura foi cuidadosamente construída desde a MP 1300/2025, que criou uma janela de transição para arranjos com usinas pré-existentes, justamente para garantir previsibilidade e continuidade aos investimentos. A Emenda 291, durante a tramitação da MP 1304, manteve esse espírito. Mas, no PLV 10/2025, o deslocamento da remissão, ainda que acidental, rompeu essa coerência.

Reforçando o entendimento de que se trata de mero erro material, temos que o §7º deve ser considerado como uma norma de transição, que não se destina a criar ou alterar regime jurídico novo, mas apenas esclarecer a norma pela qual os negócios jurídicos devem ser regidos. Explica-se.

Considerando que o PLV 10/2025 revogou o art. 26 da Lei 11.488/2007, tornou-se necessário ratificar – no texto legal revogado – as condições temporais previstas na norma revogada. Caso o §7º não tivesse sido inserido, é possível interpretar que, a partir da publicação da nova lei, o critério de operação comercial das usinas envolvidas em autoprodução estaria até mais flexível do que na legislação anterior.

Para evitar confusões, o legislador, de maneira correta, inseriu o §7º para especificar que o critério de entrada em operação comercial previsto na legislação revogada (a partir de 15 de junho de 2007) permaneceria para os novos projetos, estruturados a partir da publicação do PLV.

Interpretar que o §7º do art. 16-B do PLV 10/2025 cria regra nova justamente durante o período de transição, o qual existe exatamente para dar prazo de adaptação aos destinatários em prol da segurança jurídica, seria afronta inequívoca aos preceitos da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro (Decreto-Lei 4.657/1942) e da Declaração de Direitos de Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019).

Não se trata, portanto, de discutir o mérito da política pública, e sim de evitar um erro material de referência que pode gerar dúvidas práticas em operações em curso, análises administrativas e planejamentos de investimento. Uma simples troca de remissão no texto, substituindo “inciso I do §1º” por “alíneas ‘a’ e ‘b’ do inciso III do §5º”, é suficiente para restabelecer a lógica original e eliminar o risco de interpretações divergentes.

A própria Lei Complementar 95/1998 prevê a possibilidade de corrigir erros materiais evidentes durante a fase de sanção presidencial. Essa não é uma emenda de mérito, mas um ajuste de técnica legislativa e, nesse caso, uma medida de prudência institucional.

Em um setor de capital intensivo e ciclos longos, como o de energia, a precisão jurídica é sinônimo de estabilidade. Cada vírgula mal colocada pode significar meses de incerteza, litígios e travas a investimentos bilionários. O ajuste proposto preserva a coerência normativa do artigo 16-B e reforça a segurança jurídica para agentes que apostam no regime de autoprodução por equiparação como vetor de competitividade e sustentabilidade.

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Para as empresas, a clareza na remissão significa previsibilidade no cumprimento de requisitos objetivos e segurança na conclusão de operações estruturadas com base na janela de transição, sendo que pequenas incertezas se traduzem em custos concretos e, nesse sentido, assegurar que o texto legal reflita com exatidão a escolha legislativa é medida de prudência institucional.

O que está em jogo vai além de uma correção formal: é a credibilidade do processo legislativo e a confiança de um setor estratégico para o país. Ao garantir que o texto reflita com exatidão a intenção do legislador, o Brasil reafirma seu compromisso com a estabilidade regulatória, condição indispensável para atrair investimentos e acelerar a transição energética.

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