Dez anos do desastre de Mariana e um ano do Novo Acordo do Rio Doce

Há exatos dez anos, em 5 de novembro de 2015, o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), despejou mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos no Rio Doce, deixando cerca de 600 famílias desabrigadas e atingindo 49 municípios mineiros e capixabas. Aproximadamente 1,2 milhão de pessoas ficaram sem água potável nos dias seguintes, um desastre sem precedentes. Naquela data, o Brasil assistiu à maior tragédia socioambiental de sua história.

Quando esse trágico acontecimento completa uma década é possível afirmar que avançamos, finalmente, na construção de uma resposta duradoura à catástrofe. Celebramos no último dia 24 de outubro o primeiro ano do Novo Acordo do Rio Doce, um pacto de reparação que mantém viva a memória das vítimas, reconhece as dores e os danos sofridos e, ao mesmo tempo, reafirma o papel do Estado brasileiro como provedor de justiça e dignidade.

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Reparação não é favor. Entre 2016 e 2022, foram firmados dois acordos que fracassaram. Desde o início de 2023, sob mediação técnica e jurídica do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), mudamos o foco das discussões para avançar em uma repactuação que garantisse centralidade às pessoas atingidas e ao meio ambiente. Foram mais de 130 reuniões presenciais e remotas em Brasília, Belo Horizonte e Vitória até o fechamento do acordo.

Do lado do governo federal, coordenados pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pela Casa Civil da Presidência da República, 13 ministérios e quatro autarquias estiveram diretamente envolvidos nas tratativas, articulando com ribeirinhos, povos indígenas, quilombolas, lideranças locais e representantes dos municípios afetados em Minas Gerais e no Espírito Santo. Participaram ainda da repactuação os governos, ministérios públicos e defensorias desses dois estados, além do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU).

Construímos uma conciliação que colocou as pessoas no centro da discussão. O Novo Acordo do Rio Doce representa um compromisso histórico, com valor estimado em R$ 170 bilhões já investidos e a serem aplicados pelas empresas responsáveis pela tragédia na reparação dos danos individuais, coletivos e difusos.

O pacto, homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Petição 13.157, sob relatoria do então presidente da corte, ministro Luís Roberto Barroso, prevê ações de reparação ambiental, compensação financeira a povos indígenas e comunidades tradicionais, investimentos para o desenvolvimento dos 49 municípios atingidos e a criação de um novo programa de indenização individual. A execução dos compromissos foi previamente distribuída entre a União e os estados de Minas Gerais e do Espírito Santo.

O acordo só foi possível porque optamos pela via do diálogo e pela busca de consensos. Ele não apaga as dores do passado, mas representa um passo decisivo para assegurar dignidade, justiça e futuro às populações atingidas. Ao longo do último ano, com o acompanhamento do TRF6, temos trabalhado com dedicação e seriedade para garantir que os compromissos assumidos sejam cumpridos.

E os bons frutos já começam a aparecer: o repasse de R$ 1,6 bilhão do Fundo do Rio Doce para fortalecer a área da saúde dos municípios mineiros e capixabas; o pagamento dos Programas de Transferência de Renda (PTR), que beneficiarão cerca de 22 mil pescadores artesanais e 13,5 mil agricultores familiares; e o lançamento do Programa de Fortalecimento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) no Rio Doce — o PROFORT-SUAS — com investimento de R$ 640 milhões.

Soma-se a isso o reconhecimento, pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), do tempo de contribuição dos pescadores entre 2015 e 2024, medida que assegura a proteção previdenciária tão importante a essas comunidades.

Aceitamos o desafio de construir o melhor acordo possível para todos. E, por meio da consensualidade, realizamos uma repactuação com a cara do Brasil, comprometida com a preservação da fauna, da flora, dos rios e, acima de tudo, com a dignidade das pessoas atingidas.

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É por isso que o acordo celebrado em 2024 representa um novo marco para o Rio Doce e para a forma de tratar problemas socioambientais de alta complexidade. O início de uma experiência marcada pelo protagonismo das populações atingidas no processo reparatório e pelo compromisso com a justiça social e ambiental. Uma nova maneira de resolver casos complexos. É somente por meio do diálogo, da escuta ativa e do consenso que podemos avançar como sociedade.

A repactuação do Rio Doce é uma demonstração do que a esperança, o comprometimento público e a ação estratégica são capazes de proporcionar à sociedade. Seguiremos firmes, atentos às necessidades do povo brasileiro e abertos ao diálogo, para garantir dignidade e justiça a todos os atingidos por essa tragédia — sem deixar ninguém para trás.

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