Os Correios não param de sangrar. No ano de 2024, a empresa registrou prejuízo líquido de R$ 2,59 bilhões. E a situação piorou. Só no 1º trimestre de 2025, a empresa perdeu mais de R$ 1,73 bilhão, um valor correspondente a mais de 66% do prejuízo anual do ano anterior. No fechamento do 2º trimestre de 2025, o resultado negativo acumulado atingiu R$ 4,3 bilhões, o que representa uma deterioração adicional de mais de R$ 2,6 bilhões em apenas três meses.
O colapso financeiro da empresa escancara as falhas no regime jurídico das empresas estatais no Brasil. Mesmo que a “Lei de Empresas Estatais” (Lei nº 13.303/2016) tenha trazido avanços em uma quase uma década de vigência quanto à melhoria da governança corporativa das empresas estatais, ainda existem brechas que impedem o funcionamento pleno e eficiente dessas empresas.
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Os Correios possuem um regime jurídico especial. Isso porque, desde a década passada, houve sucessivas decisões do Supremo Tribunal Federal que foram, paulatinamente, concedendo privilégios incompatíveis com uma empresa privada. Primeiro, a Suprema Corte permitiu a aplicação do regime de precatório à ECT. Depois, garantiu imunidade tributária aos Correios, mesmo quando explora serviços de atividade econômica, como a entrega de encomendas expressas. Essas decisões contribuíram para que a empresa deixasse de se modernizar.
É verdade que os Correios têm obrigações custosas: por lei, a empresa detém monopólio de entrega de carta, o que encarece os seus custos de operação em todas as regiões do país. Mas o principal motivo parece estar do lado das receitas da empresa. A queda nos serviços internacionais de postagem, pressionada pela nova taxação das compras estrangeiras via programa “Remessa Conforme” do Governo Federal, gerou um baque estimado de R$ 2,2 bilhões, segundo a própria estatal. Somado a isso, o aumento das despesas com pessoal aprofundou ainda mais o desequilíbrio de receitas.
A situação de crise também demonstra a ineficiência das soluções existentes no ordenamento jurídico para a contenção de crises em estatais. Pelo simples fato de as empresas estatais não estarem sujeitas à falência e, consequentemente, ao regime de recuperação judicial, as soluções são escassas e evidenciam a inegável dependência de seu acionista controlador: a União.
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A Lei de Responsabilidade Fiscal trata a dependência das estatais a partir de um critério puramente orçamentário. Ou seja, a estatal será dependente apenas se depender de recursos públicos para o pagamento de pessoal, encargos sociais ou custos em geral. Assim, uma estatal pode acumular prejuízos e, ainda assim, ser classificada como “não dependente”. É verdade que o Decreto nº 12.500/2025, que introduziu o Índice de Sustentabilidade Financeira (ISF) para as estatais, é um importante avanço institucional, mas as soluções ainda são escassas.
Especula-se a concessão de um empréstimo bancário, da ordem de mais de R$ 20 bilhões, com a União como avalista e garantia das obrigações, caso os Correios não venham a cumprir com suas obrigações. Novamente, a solução parece ser sempre a mesma: socorro ao acionista controlador, a União.
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Porém, existem limites à realização deste tipo de operação pela União. A concessão de aval ou qualquer tipo de garantia à empresa controlada pelo Governo Federal depende do cumprimento das regras e dos limites estabelecidos pelo Senado Federal (art. 52, VII, da Constituição Federal). Se os Correios não honrarem o pagamento do empréstimo, a conta vai para o Tesouro e, no fim, há comprometimento ao resultado das contas públicas.
A crise dos Correios não é apenas contábil, ela demonstra as falhas estruturais, jurídicas e políticas do controle das empresas estatais no Brasil. A estatal funciona sob um modelo que mistura privilégios típicos da Administração Pública com a rigidez de um monopólio anacrônico, sem que os instrumentos de mercado sejam suficientes para o seu ajuste de rota. E quando a União não puder socorrer? O resultado é um modelo que resiste à crise, mas não aprende com ela.