Por mais que o acesso à internet esteja próximo da universalização no Brasil, a conectividade de qualidade ainda é restrita. Segundo o estudo “Conectividade significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil”, do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), apenas 22% dos brasileiros com mais de 10 anos têm condições satisfatórias de conexão.
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Os índices são ainda mais baixos entre pessoas pretas e pardas, nas classes D e E, nas regiões Norte e Nordeste e em cidades de menor porte. Isso evidencia que, embora a rede chegue a quase todos, ela não chega da mesma forma para todos.
Mesmo com o aumento do número de operadoras atuando no país, inclusive em municípios pequenos, a conectividade ainda deixa a desejar em diversas regiões. Norte, Nordeste (especialmente no interior) e porções do Centro-Oeste enfrentam desafios de infraestrutura. A distância entre os centros urbanos, a baixa densidade populacional e a complexidade logística tornam a rentabilidade de investimentos robustos nessas localidades mais caros e menos atrativos. Enquanto isso, é muito mais fácil alocar recursos em grandes centros urbanos, pois, em uma analogia bem simplista, “fibrar” alguns condomínios garante o mesmo número de clientes ou receita que um bairro de uma cidade pequena, e, ainda, de forma menos trabalhosa e com menor custo operacional. Nesse cenário, os ISPs cumprem um papel estratégico ao levar conectividade para essas regiões, garantindo capilaridade, inclusão digital e proximidade com o usuário.
Já nas regiões Sul e Sudeste, onde há maior penetração da cobertura e maior adensamento populacional, os desafios são de outra natureza. O ordenamento urbano complexo, as ocupações irregulares de infraestrutura e a elevada concorrência entre operadoras tornam o mercado mais agressivo e competitivo, por vezes até com práticas desleais. Eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes são mais um obstáculo.
A educação é um eixo central para o avanço da conectividade no Brasil. De um lado, a expansão de infraestrutura de telecomunicações exige mão de obra qualificada para operar redes cada vez mais complexas – e muitas regiões ainda carecem de cursos técnicos e programas de capacitação alinhados às demandas do setor. De outro, não basta garantir acesso à internet se a população não possui as competências digitais necessárias para aproveitar todo o potencial da tecnologia. Investir em formação técnica, inclusão e letramento digital, sobretudo para grupos em situação de vulnerabilidade é fundamental para reduzir desigualdades, ampliar oportunidades de trabalho e fortalecer a cidadania.
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Superados esses temas preliminares, é preciso avançar para o conceito de “conectividade significativa”, que vai além da simples presença de sinal de internet. Trata-se de assegurar que os usuários tenham uma experiência satisfatória, segura, estável e acessível, com dispositivos adequados e velocidade compatível às suas necessidades. Seguindo essa lógica, não faz sentido, por exemplo, implantar redes de última geração em locais onde a população não possui aparelhos compatíveis ou sequer pode arcar com os custos do serviço. Garantir conectividade significativa é garantir inclusão digital de fato.
Além disso, o uso e fomento de políticas públicas também pode ser um instrumento poderoso para a diminuição desses gaps. Temos exemplos bem-sucedidos como o uso de recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), focado em conexão de escolas; o programa Wi-Fi Brasil, que oferece internet via satélite em locais remotos; e o Programa Internet Brasil, que distribui chips de banda larga móvel para alunos da rede pública. O governo também tem investido na expansão da internet em favelas e comunidades urbanas através de programas como o BNDES Fust.
Para que se possa superar esses desafios, além de ações específicas, exige-se um ambiente regulatório mais claro, técnico e estável. Não se trata de criar mais leis ou burocracias, mas de oferecer previsibilidade e coerência para que os investimentos, que nesse mercado geralmente miram o longo prazo, venham.
No fim das contas, a conectividade no Brasil não é apenas uma questão de infraestrutura ou tecnologia, mas de visão estratégica: reconhecer que cada quilômetro de fibra lançado e cada antena instalada representam também inclusão, desenvolvimento e cidadania. O futuro do setor dependerá menos da corrida por quem chega primeiro e mais da capacidade coletiva de transformar acesso em oportunidades reais, reduzindo desigualdades históricas e posicionando a conectividade como ativo central do país no cenário global.