Há um clima de crescente preocupação no ar das finanças internacionais. Mesmo com demonstrações de resiliência na economia mundial depois do choque imposto pelo tarifaço de Donald Trump e revisões modestas nas projeções de alta do PIB global, a mensagem da diretora-gerente do Fundo, Kristalina Georgieva, em mais de uma ocasião, foi de preocupação com os riscos que se colocam à frente.
Em entrevista coletiva nessa quinta-feira (16/10) em Washington, ela destacou o forte aumento da incerteza, com indicadores relacionados a isso nas máximas históricas, e a necessidade de os países se prepararem para eventuais adversidades.
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A ansiedade já tinha sido a tônica da reunião de Primavera do Fundo, feita em abril. Ela ocorreu sob o choque inicial da saga de Trump para taxar os países ao redor do mundo e forçar mudanças na arquitetura econômica mundial.
“Então, prevíamos uma desaceleração considerável no crescimento, mas sem recessão. Seis meses depois, onde estamos? Em resumo, melhor do que o temido, mas pior do que o necessário. E a incerteza continua aumentando, assim como os valores do ouro”, disse Georgieva nesta manhã.
Ela apresentou a agenda de política econômica global, um compilado de sugestões da chefe do Fundo para os países, considerando esse quadro de alta incerteza.
A primeira é desbloquear o crescimento do setor privado, que, na visão dela, lida melhor com incertezas. “Para que o setor privado prospere, os países devem avançar com reformas domésticas amplas e ambiciosas. Incentivei nossos membros a adotarem uma espécie de limpeza regulatória para fomentar inovação e empreendedorismo”, disse, completando com um recado que é evidente para os EUA em meio ao tarifaço. “Peço que mantenham o comércio como motor de crescimento”.
A segunda prioridade colocada por ela é garantir fundamentos macroeconômicos sólidos. “Na política fiscal, os países precisam recompor espaço fiscal e reduzir a dívida. Isso implica depender mais de receitas internas e fazer escolhas orçamentárias inteligentes. Em relação às políticas monetárias e do setor financeiro, a prioridade continua sendo preservar a estabilidade e proteger contra riscos à estabilidade financeira”, salientou.
A terceira recomendação foi pela redução dos desequilíbrios mundiais, que aumentaram bastante. “Países com excessivos superávits, como a China, deveriam impulsionar a demanda interna, incluindo gastar menos em políticas industriais e mais em redes de segurança social. Aqueles com déficits excessivos, especialmente os Estados Unidos, precisam reduzir os déficits fiscais e incentivar a poupança privada”, defendeu.
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A tônica de inquietação também esteve presente em outros momentos ao longo dessa semana de reuniões no Fundo Monetário. No lançamento do relatório global sobre estabilidade financeira, por exemplo, foram destacadas pelo diretor Tobias Adriana três vulnerabilidades que merecem atenção:
“A primeira é que os preços dos ativos estão esticados e, portanto, vulneráveis a reajustes nas avaliações. A segunda diz respeito à interação com instituições financeiras não bancárias; portanto, se os preços dos ativos se ajustassem, isso poderia impactar as instituições não bancárias e potencialmente levar a resgates e pressões adicionais sobre as avaliações”, destacou.
A terceira vulnerabilidade está relacionada à alta dos juros dos títulos de longo prazo em vários países nos últimos anos, situação que ocorre também no Brasil. “Parte disso reflete preocupações fiscais em muitos países ao redor do mundo. Essas preocupações fiscais podem, então, interagir com bancos e instituições não bancárias. Portanto, nossa conclusão é que, embora as condições financeiras estejam favoráveis, os riscos macrofinanceiros permanecem relativamente elevados”, afirmou Adrian.
O signo da incerteza parece grande o suficiente para que o tom de comemoração com um desempenho melhor do que esperado há seis meses na economia global tenha sido bem contido. Georgieva mencionou muitas vezes a alta do ouro ao longo de suas diversas aparições nos eventos.
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O toque de otimismo dado por ela foi sobre a revolução da Inteligência Artificial (IA), que tem provocado um boom de investimentos no mundo e que, para ela, pode gerar uma miríade de oportunidades. Mesmo nesse tópico, porém, Georgieva adicionou elementos de cautela. Entre eles, o fato de a maior parte dos investimentos estar concentrado nos países ricos, em especial Estados Unidos, e o risco de que a IA aprofunde desigualdades entre os países e dentro dos países.
Seja como for, a julgar pelas mensagens do Fundo, a economia internacional demanda cuidados. Do ponto de vista de um país como o Brasil, bastante suscetível aos ventos externos, a situação recomenda mais prudência e cautela, ainda que a aproximação do período eleitoral não costume ser o momento em que essas virtudes são aplicadas.