O custo da inação: como geopolítica e compliance redefinem governança corporativa

O custo da inação hoje é gigantesco, muito maior do que investir em transformação. Muita gente ainda associa geopolítica a líderes em grandes mesas de negociação. A verdade é que ela já influencia a gestão de qualquer empresa. É o estudo de como países interagem, competem e cooperam por interesses de território, recursos, tecnologia ou influência.

Quando um canal como Suez ou Panamá é bloqueado, os efeitos chegam às prateleiras do supermercado. Quando um fornecedor de semicondutores sofre um embargo ou uma rota logística global fecha de repente, o impacto é imediato e local. E quando uma empresa se torna alvo de críticas por operar em um país em conflito, a repercussão atinge diretamente sua reputação.

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O mundo mudou, e com ele o papel das empresas. Ainda assim, para muitos Conselhos de Administração, a geopolítica ainda parece algo distante.

Uma pesquisa inédita do IBGC e Better Governance mostra que, embora 85,8% dos conselheiros considerem a geopolítica um risco relevante, pouco mais de 50% afirmam ter processos estruturados para monitorá-la. O resultado é uma governança que reage apenas à crise – e isso sai caro.

Essa postura, porém, expõe fragilidades internas importantes: fiscalização insuficiente, má alocação de recursos e lacunas em direito internacional e inteligência política. É nesse contexto que o compliance deixa de ser apenas um conjunto de regras. Ele garante autonomia à gestão e funciona como diplomacia corporativa, construindo credibilidade junto a parceiros e mercados. Essa credibilidade protege a marca e abre portas em um mundo cada vez mais complexo.

O risco, quando bem interpretado, pode se tornar oportunidade. Conselhos proativos que monitoram dinâmicas globais conseguem identificar mercados e parcerias antes da concorrência. O compliance deixa de ser um checklist e se transforma em inteligência estratégica, guiando decisões como realocar fornecedores para países aliados ou trazer de volta para casa a produção de itens críticos, garantindo controle de qualidade e reduzindo riscos de interrupções por conflitos ou sanções. Na prática, significa posicionar a empresa de forma a manter operações e atender clientes mesmo em cenários de instabilidade internacional.

A questão não é se agir, mas como agir. Conselhos estratégicos começam fazendo perguntas diretas que exigem evidências concretas, não respostas superficiais. Qual seria o impacto na receita se o principal fornecedor fosse sancionado amanhã? Essa pergunta obriga a gestão a quantificar o risco em termos de perda financeira e estimula a criação de planos de contingência detalhados e focados em resultados.

É igualmente importante avaliar quantos dias de estoque crítico existem e qual seria o custo de aumentá-lo. A análise vai além do “temos estoque suficiente”, focando na resiliência da cadeia de suprimentos, no custo de mitigação e na decisão de investimento em segurança.

Outra questão essencial é definir quais decisões executivas precisam da aprovação do conselho em caso de crise, se as alçadas estão claras e se os contratos permitem substituir fornecedores rapidamente, incluindo cláusulas de continuidade. Perguntas assim testam a clareza e a agilidade da governança. Em momentos de crise, a lentidão na tomada de decisão pode ser catastrófica.

Por fim, é crucial perguntar quais evidências concretas demonstram que o compliance funciona na prática e não apenas no papel. Essa pergunta move a conversa de “temos um manual de ética” para exemplos palpáveis, como decisões documentadas da equipe de recusar contratos arriscados ou revisar fornecedores em situações críticas, que refletem a verdadeira cultura de compliance.

O custo da inação é imenso. Ele se manifesta em interrupções, perda de clientes, sanções financeiras e danos à reputação que podem levar anos para serem revertidos. A transformação, por outro lado, é investimento em resiliência e na capacidade de navegar com confiança em um mundo incerto.

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O primeiro passo é ter clareza, transformando riscos complexos em mapas (visuais) que evidenciem vulnerabilidades. Depois, usar dados para entender dependências e justificar a diversificação, simular crises, testar planos de contingência, medir velocidade de resposta e desenvolver competências estratégicas.

O novo tempo da governança brasileira exige conselhos que funcionem como centros de inteligência estratégica, inovação e resiliência. O jogo geopolítico é global, e a resposta precisa ser firme, rápida e preparada, aqui mesmo, nas salas de conselho das nossas empresas.

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