A urgência de uma ARR sobre as Resoluções 4.790 e 4.936/21 do CMN

Nos últimos meses, segundo noticiado, multiplicaram-se casos de aposentados surpreendidos por débitos automáticos em suas contas bancárias, vinculados a clubes de benefícios ou serviços que, alegadamente, nunca contrataram. A situação ganhou manchetes e chegou aos tribunais, criando a percepção de que os bancos seriam corresponsáveis por esses descontos. Mas essa narrativa ignora um ponto central: as instituições financeiras estão cumprindo, de forma estrita, a regulação do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional (CMN).

Com efeito, a Resolução CMN 4.790/2020 determinou que débitos automáticos em contas de depósito ou salário só poderiam ser feitos mediante autorização prévia do titular, excluindo a possibilidade de as instituições detentoras das contas – bancos incumbentes – de confirmar com seus clientes correntistas a legitimidade dessas autorizações, para os débitos oriundos de outras instituições que também são autorizadas a funcionar pelo BC.

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Vale reforçar também, que desde 2018, com a publicação da Resolução CMN 4.649, é vedado aos bancos comerciais, aos bancos múltiplos com carteira comercial e às caixas econômicas limitar ou impedir, de qualquer forma, o acesso de instituições de pagamento e de outras instituições autorizadas a funcionar pelo BC ao serviço de débitos autorizados pelo titular de conta de depósitos ou de conta de pagamento mantidas nas instituições. Ou seja, cabe ao banco depositário ou detentor de conta, apenas acatar os débitos oriundos de outras instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central.

A Resolução CMN 4.936 trouxe uma camada adicional de flexibilização, ampliando-se o uso de meios eletrônicos para autorizações e simplificação na comunicação entre instituições.

Ora, se as flexibilizações em comento diminuíram custos de transação para os consumidores, também parece ter havido uma externalidade negativa dessa flexibilização, que foi abrir espaço para práticas abusivas (afinal, já dizia o poeta que “Brasil não é para amadores”). Autorizações fraudulentas passaram a sustentar débitos automáticos contestados por aposentados.

Nessas situações, os bancos depositários (que apenas processam as ordens) passaram a alegar, corretamente, que não têm discricionariedade para recusar, afinal, a regulação os obriga a cumprir os débitos comunicados pela instituição credora (aquela que, segundo a mídia, estaria promovendo descontos indevidos), sob pena de sanções administrativas.

A jurisprudência emergente e a cobertura midiática sugerem que há uma lacuna regulatória e que precisamos revisar a regulação em comento. Afinal, transferir a responsabilidade aos bancos depositários significaria punir quem não tem controle efetivo sobre a situação e que atua em estrito cumprimento de um dever legal (que isenta a responsabilidade civil). Trata-se de um caso típico em que a solução não está no litígio judicial, mas na revisão regulatória (o que tecnicamente toma o nome de Avaliação de Resultado Regulatório, ou simplesmente, ARR).

Essa revisão deve observar um princípio já consolidado na Lei de Liberdade Econômica: a necessidade de reavaliar periodicamente normas para evitar excessos e distorções. O que se deve fazer, portanto, é que o CMN e o Banco Central revisem as Resoluções em comento à luz dos problemas recentes.

Entretanto, essa revisão deve ser feita com cautela. Excesso de burocracia pode gerar custos que recairão justamente sobre os aposentados e consumidores que se pretende proteger. Por isso, a resposta adequada é que essa revisão regulatória (ARR) seja precedida de uma Análise de Impacto Regulatório (AIR), prevista no Decreto 10.411/2020. Só assim será possível calibrar a norma de forma a equilibrar eficiência e proteção.

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Em síntese, os bancos cumprem estritamente as resoluções que os regulam e não podem ser responsabilizados por brechas normativas. O debate que hoje ganha espaço na mídia e nos tribunais precisa ser deslocado para o foro adequado: a revisão regulatória pelo CMN e pelo Banco Central, com base em evidências e análise de impacto. Esse é o caminho para proteger consumidores vulneráveis sem comprometer a eficiência do sistema financeiro.

Nem se diga que recente mudança regulatória promovida pelo BC e CMN (Resolução 5.251) atende a esses requisitos de uma ARR; ela está mais próxima a uma resposta à mídia e que não tem o condão de resolver os problemas antes descritos. Não é um bom desenho regulatório quando o regulador apenas reage à mídia; é preciso trabalhar com evidências e dentro dos marcos legais.

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