O advogado trabalhista Christovam Ramos Pinto Neto denunciou o Brasil à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) contra a tendência jurisprudencial de legitimação da pejotização no Brasil. O pedido, apresentado em 25/9, está fundamentado na “violação estrutural de direitos humanos no país”.
O termo ‘pejotização’ compreende o fenômeno em que trabalhadores formalizam a relação por meio de um contrato cível de prestação de serviço, ainda que, na prática, o formato da relação seja essencialmente celetista (empregatícia).
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Na petição, Pinto Neto, que também é membro do Grupo Nacional Contra o Tema de Repercussão Geral 1389 (pejotização), do Supremo Tribunal Federal (STF), apresenta os prejuízos que esse formato de registro do trabalho pode causar à sociedade brasileira.
Primeiro, alega que a pejotização precariza a relação de trabalho e afasta a aplicação da legislação laboral aos empregados, que ficam desamparados de direitos e garantias, além de assumirem integralmente o risco da atividade. Ele enfatiza que a medida privaria os trabalhadores de direitos básicos como controle de jornada, férias remuneradas acrescidas do terço constitucional, 13º salário, horas extras, depósitos de FGTS, proteção contra a dispensa arbitrária e estabilidade.
O documento também destaca os efeitos que seriam sentidos a partir da diminuição de contratos regulamentados pela legislação trabalhista. Por exemplo, o enfraquecimento da representação sindical, inviabilizando a negociação de direitos e benefícios por meio de negociação coletiva, assim como o prejuízo a políticas afirmativas, como é o caso de vagas reservadas a pessoas com deficiência e ao programa de jovem aprendiz.
Igualmente, apresenta os prejuízos ao sistema previdenciário. A ausência de registro do vínculo empregatício reduziria a arrecadação de contribuições previdenciárias e sociais, cuja finalidade é financiar as políticas públicas de seguridade.
O advogado afirma que “na pejotização, a empresa deixa de contribuir para todo o sistema de seguridade social. Vai faltar dinheiro para o pagamento de aposentadorias e pensões, além dos benefícios assistenciais, como os que compõem a LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social).”
Além dos trabalhadores e do poder público, a medida também afetaria o segmento empresarial, na visão de Pinto Neto. Ele sustenta que “vários setores como o de planos de saúde (milhões de planos de saúde são concedidos através de negociações coletivas); do comércio (impactado com o fim do 13º salário); e da construção civil (os trabalhadores não poderiam mais dar entrada em imóveis com o FGTS).”
Ao fim, a denúncia apresentada pede à CIDH que registre e processe a demanda como violação estrutural de direitos humanos no Brasil; que reconheça que a prática da ‘pejotização’ configura violação de direitos sociais, ligados à proteção do trabalho. Ainda, pede que o órgão recomende ao Estado brasileiro a adoção de medidas que impeçam a pejotização; garanta a competência da Justiça do Trabalho para julgar o tema; e reforce o cumprimento das Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do princípio da primazia da realidade.
Atuação da CIDH
Cabe à CIDH receber, julgar e processar denúncias relacionadas à violação dos direitos humanos e fundamentais. Caso a denúncia seja recebida, o processo é aberto na sede da CIDH, localizada na Costa Rica.
Havendo a condenação dos acusados por violação aos direitos sociais dos trabalhadores, o especialista em direito trabalhista Christovam Ramos Pinto Neto explica que “a condenação pela Corte Internacional tem peso jurídico e político muito relevante. No caso de uma condenação, o Brasil seria notificado para cumprir a determinação da Corte.”
Discussão sobre pejotização no STF
O STF trata da pejotização no Tema de Repercussão Geral 1389 (ARE 1532603). No caso, está sendo discutida “a licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, bem como o ônus da prova relacionado à alegação de fraude na contratação civil”.
A Corte também analisará a competência da Justiça do Trabalho para julgar as causas que tratam da existência de eventual fraude no contrato de prestação de serviços.