Do ‘I love you’ de Bolsonaro ao abraço em Lula: os gestos e recados de Trump na ONU

Desde a semana passada, o encontro entre o presidente Lula e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, era uma preocupação nos corredores do Palácio do Planalto. O momento em que o presidente brasileiro terminaria de fazer seu discurso de abertura da Assembleia-Geral da ONU e o norte-americano iniciaria o seu era visto como um ponto de possível interação entre os dois. Foi nesse instante de interseção que, em setembro de 2019, o então presidente Jair Bolsonaro disse ‘I love you’ para Trump.

A cena que viralizou certamente não seria repetida neste setembro de 2025. Mas também não era esperado que Trump abraçasse o presidente Lula no momento em que aplica sanções retaliatórias à economia brasileira e a integrantes do Executivo e do Judiciário. O JOTA ouviu de interlocutores do Planalto na última semana que Lula estaria preparado para qualquer tipo de abordagem, fosse ela hostil ou amigável.

Nesta terça-feira (23/9), Lula abriu a Assembleia-Geral da ONU com um discurso forte. Sem citar Trump, repetiu que soberania e democracia são inegociáveis — a mesma narrativa lançada em julho, após o tarifaço de 50% imposto pelo governo norte-americano a produtos exportados pelo Brasil. Também defendeu a regulação das redes sociais, negando que seja censura. ‘Regular não é restringir a liberdade de expressão, é garantir que o que já é ilegal no mundo real seja tratado assim também no mundo virtual’, disse.

“As plataformas digitais trazem possibilidades de nos aproximar como jamais havíamos imaginado. Mas têm sido usadas para semear intolerância, misoginia, xenofobia e desinformação. A internet não pode ser uma terra sem lei. Cabe ao poder público proteger os mais vulneráveis.”

Conheça o JOTA PRO Poder, plataforma de monitoramento que oferece transparência e previsibilidade para empresas

Também ao falar sobre liberdade de expressão, Trump citou Lula. Ao discursar, o presidente norte-americano falava sobre o Brasil enfrentar tarifas maiores em resposta aos seus esforços “para interferir nos direitos e liberdades dos nossos cidadãos americanos”, quando interrompeu e disse que encontrou Lula pouco antes de subir ao púlpito. “Tenho um pouco de problema dizendo isso porque devo dizer que eu estava entrando e o líder do Brasil estava saindo”, afirmou.

“Nós nos vimos, eu o vi, ele me viu e nós nos abraçamos. E aí eu digo, você acredita que eu vou dizer isso em apenas dois minutos? Mas, na verdade, concordamos que nos encontraríamos na próxima semana. (…) Ele parecia um cara muito bom. Ele gostou de mim, eu gostei dele. E eu só faço negócio com pessoas de quem eu gosto. Mas, pelo menos por 39 segundos, tivemos uma excelente química”, disse.

O histórico de relações entre Lula e presidentes dos Estados Unidos indica que, mesmo com críticas, a relação tende a ser boa. O presidente norte-americano com quem Lula teve melhor relação foi o republicano George W. Bush. ‘Tive uma relação muito, muito tranquila com Bush. Era uma relação de muita sinceridade, mesmo naquilo que a gente discordava’, relembrou Lula há cerca de um mês, em entrevista à BandNews FM.

Reação ao tarifaço

Trump tem usado como justificativa para retaliar o Brasil a acusação de que o governo e o Judiciário brasileiro tem perseguido o ex-presidente Jair Bolsonaro. Além do tarifaço, foram impostas sanções como a revogação de visto a brasileiros e a aplicação da Lei Magnitsky ao ministro Alexandre de Moraes, sua esposa Viviane Barci e ao instituto da família Moraes.

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, teve o visto revogado, depois conseguiu um visto expedido para comparecer ao evento da ONU, mas teve a circulação na cidade restrita a alguns quarteirões — o que o levou a desistir de integrar a comitiva presidencial. Após a condenação de Bolsonaro, integrantes do governo Trump reforçaram o anúncio de novas ações retaliatórias.

Tais ações são patrocinadas pelo deputado Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente, e pelo empresário Paulo Figueiredo. Ambos buscam livrar Bolsonaro das condenações e processos na Justiça brasileira. No X (antigo Twitter), Figueiredo considerou que o discurso de Trump deixa o presidente Lula em uma situação difícil: “ter que ir para a mesa de negociação ouvir verdades e negociar algo que não tem como cumprir”.

“Se querem analisar se a fala foi boa ou ruim para Lula, vejam quais são as possibilidades que o presidente brasileiro tem agora, na nova posição em que se encontra. Terá que encontrar Trump. Tem a obrigação de voltar com alguma vitória”, disse Figueiredo. “Todo dia Trump elogia líderes do mundo inteiro, como o da Índia, China e Rússia. E coloca mais tarifas no bumbunzinho deles até que façam o que ele quer. Mas tudo com muito amor e carinho”, completou.

Generated by Feedzy