O necessário debate sobre o excesso de gasto judicial e as propostas da AGU

Diante do peso elevado dos gastos com sentenças judiciais no orçamento federal, a Advocacia-Geral da União (AGU) tem costurado dentro do governo propostas para enfrentar esse problema. A lógica não é enviar um grande Projeto de Lei (PL) ou Medida Provisória (MP) ao Congresso, mas trabalhar em ajustes em propostas que já estão em andamento no Legislativo.

Um evento na última quarta-feira (17/9) promovido pela AGU discutiu os riscos fiscais de natureza judicial. Nos diversos painéis do seminário, aberto com a presença não só do chefe da pasta, ministro Jorge Messias, mas também dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, foi feito um amplo diagnóstico sobre o problema.

Conheça o JOTA PRO Poder, plataforma de monitoramento que oferece transparência e previsibilidade para empresas

A constatação é que hoje o gasto com sentenças judiciais representa um montante equivalente à metade da despesa discricionária do governo federal – que está pouco acima dos R$ 200 bilhões, e tem sido um fator importante de pressão no campo fiscal. No cenário do governo, chegará a um montante equivalente a quase 70% do gasto livre da União até 2028.

A principal causa de caráter mais geral seria o excesso de judicialização no país, muito acima do que ocorre na maioria dos países desenvolvidos e emergentes. Nas ideias em discussão no governo, a lógica não é fechar a porta do Judiciário, mas sim fortalecer instrumentos preliminares, como a negociação e os acordos nas esferas administrativas, tornando-as etapas mandatórias prévias ao Judiciário.

Também há uma percepção de que um dos caminhos é tornar a judicialização mais custosa do que é hoje. Há uma leitura de que a formatação atual do instrumento de justiça gratuita favorece a litigância, com impactos deletérios no funcionamento do judiciário, nas contas públicas e na economia.

Nesse sentido, uma das ideias apresentadas pelo advogado-geral da União substituto, Flávio Roman, é que a gratuidade seja garantida para quem está no Cadastro Único (CadÚnico) de programas sociais. Para a classe média, com renda de até R$ 5.000, a proposta apresentada por Roman é que haja uma “taxa social”. E acima disso, o acesso à justiça teria custo normal.

Outro custo a ser imposto seria cobrar honorários em mandados de segurança, instrumento que tem sido muito usado como forma de se driblar custas processuais. Essa proposta pode gerar mais polêmica porque a questão dos honorários recebidos pelos servidores da AGU tem sido atacada na sociedade, não sem razão, como uma fonte de privilégio e mais concentração de renda para um segmento da sociedade. Ainda assim, é preciso discutir algum grau de equivalência de custos entre mandado de segurança e ações ordinárias.

A AGU também defende que haja previsões mais claras de punição para os casos de litigância abusiva, com, por exemplo, a possibilidade de aplicação de multa de até 20% da causa.

Outro problema que tem chamado a atenção das autoridades é a escalada nas Requisições de Pequeno Valor (RPV), que crescem em ritmo acentuado e estão sistematicamente surpreendendo para cima em relação ao projeto nas leis orçamentárias. Com as excepcionalizações geradas pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e da recém-aprovada PEC 66, que muda o regime de precatórios, o problema não gera uma desestabilização imediata na gestão orçamentária. Ainda assim, é um gasto que acaba batendo na dívida pública e que precisa ser controlado.

Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias do JOTA e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email

Mais importante que as ideias em si é que o debate sobre o custo das decisões judiciais está sendo colocado para a sociedade e para a própria Justiça, que com frequência faz cortesias com o chapéu alheio, até mesmo legislando.

Efetivamente os “meteoros” que anualmente se abatem sobre o orçamento são um problema fiscal, econômico e social. É claro que o quadro atual também reflete programas e leis mal desenhados, responsabilidade do governo e do Congresso, e uma maior qualidade das legislações, com maior clareza, precisa ser parte da equação para resolução do problema. Em um país com tanto a se fazer, não se pode gastar tanto pagando contas decorrentes de litígios do cidadão contra o Estado.

Generated by Feedzy