Nesta terça-feira (16/9), deputados do PSol apresentaram uma denúncia para que o Ministério Público do Trabalho (MPT) investigue o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) e o empresário Tallis Gomes, responsáveis por impulsionar a campanha com a hashtag #DemitaExtremistas.
A campanha, liderada por Nikolas, pressiona empresas a demitirem funcionários de esquerda que fizeram postagens com memes, vídeos ou comentários favoráveis ao assassinato de Charlie Kirk, ativista ultraconservador americano.
A mobilização ganhou força após demissões nos Estados Unidos de militantes progressistas nas redes sociais. Desde então, Nikolas passou a expor publicamente as postagens comemorativas, marcando os perfis de empresas brasileiras onde os autores trabalham, com o objetivo de pressionar por suas demissões. Quando essas dispensas são efetivadas, o parlamentar as divulga em suas redes.
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No documento, os deputados apresentaram posts de Nikolas incentivando demissões de funcionários que comemoraram a morte de Kirk ou que demonstraram posicionamentos políticos contrários à extrema-direita. Os deputados do PSol solicitam a abertura de investigação por abuso de poder por parte dos empregadores, que estariam monitorando e punindo a vida privada dos empregados.
Foi pedida a abertura de procedimento para investigar a prática de abuso de direito dos empregadores, por vigiarem a vida privada dos funcionários e os repreenderem por isso, e o cometimento de assédio laboral, por motivos de convicção filosófica ou política. Somado ao pedido para investigar as demissões que estão ocorrendo em decorrência da campanha “#DemitaExtremistas”.
A denúncia está fundamentada na violação dos direitos fundamentais de liberdade de manifestação do pensamento (artigo 5º, IV, CF), na liberdade de consciência (artigo 5º, VI, CF) e convicção filosófica ou política (art. 5º, VIII).
Também foi mencionado o descumprimento da Convenção n.º 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da discriminação em matéria de emprego e profissão, e a Convenção 190 da OIT, que dispõe sobre a eliminação da violência e do assédio no mundo do trabalho.
A denúncia é assinada pelos deputados Guilherme Boulos, Célia Xakriabá, Erika Hilton, Henrique dos Santos Vieira Lima, Ivan Valente, Luciene Cavalcante da Silva, Talíria Petrone Soares, Tarcísio Motta e PauloCésar Lemos de Oliveira.
O caso tramita como Notícia de Fato 009976.2025.02.000/2.
O que dizem os especialistas sobre o movimento de Nikolas Ferreira
Cássio Casagrande, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF) e procurador do Ministério Público do Trabalho, afirma que, como regra geral, a empresa não pode investigar a atividade política privada. Por isso, ele considera que “a atuação do Deputado Nikolas parte de uma premissa equivocada, pois o comando hierárquico disciplinar do empregador não pode ser estendido para além do necessário à execução do contrato de trabalho”.
Por outro lado, Casagrande considera que empregados que mantêm redes sociais abertas ou que permitem que o empregador o siga, podem sofrer sanções caso usem redes sociais para discursos extremistas com apelo à violência, discursos de ódio, racistas ou xenofóbicos. “Nesse caso, o empregador pode rescindir o contrato sem justa causa por entender que o trabalhador demonstra valores contrários aos defendidos pela empresa”, avalia.
Já Rodrigo Carelli, professor de Direito do Trabalho da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), considera que os empregadores que seguirem o movimento de Nikolas Ferreira estarão cometendo, em tese, assédio eleitoral. “Não se pode a partir de posicionamento político, ainda mais externado em vida privada, ter algum algum efeito no contrato de trabalho”, afirma Carelli.
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Na mesma linha, entende a advogada trabalhista na Michelin Sociedade de Advogados Giane Maria Bueno. Para ela, o caso pode configurar discriminação política ou discriminação por opinião, cuja prática é proibida pela legislação trabalhista, ainda que sem justa causa. Nesse caso, a demissão sem justa causa estaria sujeita à nulidade, e a empresa poderia ser obrigada a reintegrar o empregado, a pagar por danos morais e multas, e poderia ser denunciada pelo Ministério Público do Trabalho, afirma Giane.
O professor Antonio Carlos de Freitas Jr., doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo (USP). Na visão dele, ainda que o presente momento não seja de período eleitoral, pela polarização atual, é possível perceber que o posicionamento ideológico à esquerda e à direita já prenuncia uma tendência de voto a ser forçada durante as eleições.
Por isso, para ele, a demissão motivada pela celebração ao assassinato de Kirk configura assédio eleitoral. Caso que pode gerar uma série de consequências jurídicas trabalhistas.
Nikolas Ferreira pode ser responsabilizado?
Nikolas Ferreira pode ser responsabilizado judicialmente por liderar e promover uma campanha de demissões com viés ideológico? Para Antonio Carlos de Freitas Jr., a resposta é positiva. Ele entende que o parlamentar comete assédio eleitoral e pode ser responsabilizado, especialmente nas esferas penal e eleitoral, embora não no campo trabalhista.
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O professor afirma que, do ponto de vista do Direito do Trabalho, o deputado não seria responsável. No entanto, segundo Freitas Jr., Nikolas poderia responder pelos crimes de incitação pública à prática de delito (artigo 286 do Código Penal) e constrangimento ilegal (artigo 146 do mesmo código). Também caberia, no campo político, a abertura de processo disciplinar na Câmara dos Deputados, dada a gravidade da conduta.
A advogada Giane Maria Bueno também concorda que o deputado poderia ser responsabilizado por crimes eleitorais, por incitação à discriminação e ao crime, e por crimes contra a honra, a depender do caso. Contudo, para ela, o fundamento do ilícito seria a discriminação e não o assédio eleitoral.