Depois de finalizado julgamento pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) na quinta-feira (11/9), ainda há um caminho até a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos outros sete réus do núcleo 1 da trama golpista. A condenação se torna definitiva após a decisão transitar em julgado, ou seja, não caber mais qualquer tipo de recurso contra ela. A previsão é que o processo se encerre ainda em 2025.
Além da prisão, os réus também enfrentarão uma série de efeitos secundários da pena, que incluem a perda de patente para os militares envolvidos no caso, a perda de mandato do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) e a inelegibilidade de todos os réus – atos que também podem ser questionados em recursos.
Os advogados de Bolsonaro, Celso Vilardi e Paulo Cunha Bueno, afirmaram em nota, na noite de quinta, logo após os votos do colegiado, que as penas fixadas ao ex-presidente “são absurdamente excessivas e desproporcionais” e que “ajuizará os recursos cabíveis, inclusive em âmbito internacional”.
Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão em regime inicial fechado, a maior pena a integrante do núcleo denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como crucial na tentativa de golpe. Ele também deverá pagar 124 dias-multa no valor diário de dois salários-mínimos, totalizando cerca de R$ 376,4 mil.
Bolsonaro pode recorrer?
Para contestar a decisão, a defesa de Bolsonaro e dos outros réus devem aguardar a publicação do acórdão, peça que oficializa o resultado do julgamento. O colegiado tem até 60 dias para essa publicação e, só então, abre prazo para recursos. Ou seja, os ministros terão até a terceira semana de novembro para depositarem seus votos.
Antes do final do julgamento, na tarde de quinta, Paulo Cunha Branco, advogado do ex-presidente, adiantou que pretende apresentar embargos de declaração, recurso usado quando a defesa considera que há contradição, omissão, erro ou obscuridade em algum ponto da decisão da Corte.
Na prática, esse é um tipo de recurso que não teria força para derrubar a decisão da Corte ou modificar o resultado do julgamento. Se acolhida pelo tribunal, uma eventual nova avaliação da Turma sobre o que for questionado pelo embargo se resumirá a corrigir ou esclarecer aspectos pontuais da decisão. Mas a medida pode atrasar a condenação definitiva já que, se forem recebidos, suspendem o prazo para a interposição de outros recursos.
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A possibilidade de outros recursos, como embargos infringentes, ganhou destaque na discussão sobre o julgamento diante do voto pela absolvição de Bolsonaro, Augusto Heleno, Anderson Torres, Paulo Sérgio Nogueira, Almir Garnier e Alexandre Ramagem pelo ministro Luiz Fux e foi considerada uma aposta para levar a ação penal ao plenário do Supremo. O recurso é uma contestação final ao STF quando a decisão entre os ministros não é unânime.
Mas é improvável que esse tipo de embargo seja aceito neste caso, já que a Corte segue a o entendimento de que a interpelação desse recurso requer que pelo menos dois ministros da Turma tenham votado de forma oposta à maioria.
Quando e onde Bolsonaro deve ser preso?
Ainda não é possível precisar a data exata em que Bolsonaro pode ser preso por envolvimento na trama golpista. Depois de proclamado o resultado do julgamento, o Supremo tem até 60 dias para publicar o acórdão. O período é o prazo máximo previsto no Regimento Interno do Tribunal, mas pode ser antecipado. Depois disso, abre-se prazo de cinco dias para os embargos de declaração e, após esse recurso, mais 15 para os embargos infringentes. O trânsito em julgado, que estabelece a condenação definitiva, só se dá depois de todos esses processos.
A expectativa é de que a execução da pena ocorra ainda em 2025. Apuração do JOTA indica que os recursos têm baixas chances de prosperar levando em conta os precedentes do STF.
Hoje, o ex-presidente está preso em regime domiciliar por ter descumprido uma medida cautelar que o impedia de usar redes sociais de terceiros. A prisão se deu no inquérito que investiga um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), por atuação junto ao governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para promover medidas de retaliação contra o governo brasileiro e ministros do STF.
A defesa de Bolsonaro já indicou que deve pedir para que ele continue em prisão domiciliar. “O presidente Bolsonaro tem uma situação de saúde muito delicada. Não vou antecipar o que acontecerá ou não, mas isso pode ser levado à mesa, sim”, afirmou o advogado Paulo Cunha Bueno, na tarde de quinta-feira, antes do final do julgamento.
Se for conduzido para algum presídio, há três principais cenários possíveis:
Ser levado ao Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Nesse caso, Bolsonaro ficaria em uma cela comum, porém, teria o benefício de cumprir sua pena em sala separada dos demais detentos.
Encaminhamento para uma sala especial na Superintendência da Polícia Federal, em situação semelhante à do presidente Lula (PT) entre 2018 e 2019, após ser condenado pela Justiça Federal.
Por ser ex-militar, Bolsonaro também poderia ficar preso no Exército.
A decisão final cabe ao ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal.
Inelegível até 2060 e sem patente
O Supremo também suspendeu os direitos políticos de Bolsonaro e dos demais réus enquanto durarem os efeitos da condenação. Após o período da pena, eles ficarão inelegíveis por mais 8 anos, de acordo com a Lei da Ficha Limpa. O ex-presidente só poderá voltar a disputar eleições em 2060. Atualmente, Bolsonaro já está inelegível conforme decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A condenação da Corte eleitoral, porém, não suspendeu seus direitos políticos. Com a decisão do Supremo, ele ficará também impedido de votar.
Depois de finalizada a ação do STF, Bolsonaro ainda será julgado pelo Superior Tribunal Militar (STM). A 1ª Turma determinou o envio de ofício à Corte militar e aos comandos do Exército e da Aeronáutica para análise dos casos do ex-presidente, que é capitão da reserva do Exército, dos generais Augusto Heleno, Paulo Sergio Nogueira, Braga Netto e do almirante Almir Garnier.
O artigo 142 da Constituição estabelece que um oficial perde a patente se for considerado indigno do oficialato ou incompatível com ele por decisão de tribunal militar permanente. Caso o STM conclua que os condenados não estão aptos a permanecer nas Forças Armadas, eles perderão suas patentes e salários e a remuneração poderá ser convertida em pensão para o cônjuge ou filhos menores.
Bolsonaro e os outros condenados ainda terão que pagar uma indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 30 milhões.
Como ficou a situação de todos os condenados
Mauro Cid, ex-ajudante de ordens
Crimes: Foi condenado por unanimidade (5×0) pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e por maioria (4×1), com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa armada, golpe de estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Pena: 2 anos de reclusão em regime aberto, com benefício da delação premiada.
Jair Bolsonaro, ex-presidente da República
Crimes: Foi condenado por maioria, com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa, golpe de estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Pena: 27 anos e 3 meses de pena privativa de liberdade total, sendo 24 anos e 9 meses de em regime fechado e 2 anos e 6 meses em regime aberto ou semiaberto.
Pena pecuniária: 124 dias-multa no valor diário de dois salários-mínimos vigentes à época do fato, com correção.
Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil
Crimes: Foi condenado por unanimidade pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e por maioria, com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa armada, golpe de estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Pena: 26 anos, sendo 23 anos e 6 meses em regime fechado e 2 anos e 6 meses de regime aberto ou semi aberto.
Pena pecuniária: 100 dias-multa no valor diário de um salário-mínimo vigente à época do fato, com correção.
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça
Crimes: Foi condenado por maioria, com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa, golpe de estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Pena: 24 anos, sendo 21 anos e 6 meses em regime fechado e 2 anos e 6 meses em regime aberto ou semiaberto.
Pena pecuniária: 100 dias-multa no valor diário de um salário-mínimo vigente à época do fato, com correção.
Também foi determinada a perda do cargo de delegado da Polícia Federal.
Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha
Crimes: Foi condenado por maioria, com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa, golpe de estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Pena: 24 anos, sendo 21 anos e 6 meses em regime fechado + 2 anos e 6 meses em regime aberto ou semiaberto.
Pena pecuniária: 100 dias-multa no valor diário de um salário-mínimo vigente à época do fato, com correção.
Augusto Heleno, ex-ministro do GSI
Crimes: Foi condenado por maioria, com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa, golpe de estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Pena definitiva: 21 anos, sendo 18 anos e 11 meses em regime fechado + 2 anos e 1 mês de em regime aberto ou semiaberto.
Pena pecuniária: 84 dias-multa no valor diário de um salário-mínimo vigente à época do fato, com correção.
Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa
Crimes: Foi condenado por maioria, com voto contrário de Fux, pelos crimes de organização criminosa, golpe de estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Pena: 19 anos, sendo 16 anos e 11 meses em regime fechado + 2 anos e 1 mês em regime aberto ou semiaberto.
Pena pecuniária: 84 dias-multa no valor diário de um salário-mínimo vigente à época do fato, com correção.
Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin
Crimes: Foi condenado por maioria pelos crimes de organização criminosa armada, golpe de estado e tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito.
Pena: 16 anos, 1 mês e 15 dias em regime fechado.
Pena pecuniária: 50 dias-multa no valor diário de um salário-mínimo vigente à época do fato, com correção.
Também foi determinada a perda do cargo de delegado da Polícia Federal e de deputado federal.