Estabelecida como um dos setores mais importantes da economia mundial, a indústria química brasileira pode ganhar novos contornos estratégicos e estruturantes com o Projeto de Lei 892/2025. A proposta, que tramita na Câmara dos Deputados, institui o Programa Especial de Sustentabilidade da Indústria Química (Presiq), que se vale de incentivos fiscais para promover a expansão do setor. De autoria do deputado federal Afonso Motta (PDT-RS), a medida tem como alicerces o compromisso com a descarbonização, com a economia de baixo carbono e com o aumento da competitividade industrial do país no mundo.
A aprovação urgente do PL é considerada fundamental por especialistas diante do cenário desafiador enfrentado pela indústria química, conforme aponta a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim). No primeiro trimestre de 2025, a produção recuou 3,8%, as vendas internas caíram 2,6% e o Consumo Aparente Nacional (CAN) registrou retração de 5,3%. Base para 96% da indústria nacional, o setor opera com apenas 62% da capacidade instalada – o pior índice desde 1990, segundo dados da Associação.
André Passos Cordeiro, presidente-executivo da Abiquim, afirma que a situação é agravada pelo chamado Custo Brasil, conjunto de fatores que encarecem e dificultam a venda de produtos. No caso da indústria química, os principais obstáculos são a energia e o gás natural mais caros do que em países concorrentes, a alta carga tributária e os gargalos logísticos.
O país registrou um déficit comercial recorde de US$ 49,8 bilhões em produtos químicos nos últimos 12 meses, com importações crescendo e competindo em condições desleais frente a seus concorrentes globais. Na visão de Passos, falta uma política industrial estruturante mesmo após medidas emergenciais adotadas pelo governo, como a inclusão de produtos na Lista de Desequilíbrios Comerciais Conjunturais (DCC) e a retomada parcial do Regime Especial da Indústria Química (Reiq). “A cada mês, sem uma política estruturante como o Presiq, a indústria química brasileira acumula perdas difíceis de se reverter”, destaca.
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Para o presidente-executivo, o Presiq surge como uma política pública de longo prazo, construída a partir do diálogo com o governo e o Congresso Nacional. O programa prevê ampliar a utilização da capacidade instalada para até 95%, gerar 1,7 milhão de empregos e acrescentar cerca de R$ 112 bilhões ao Produto Interno Bruto (PIB).
Diferente de um benefício fiscal pontual, o PL 892/2025 propõe um modelo de incentivo baseado em investimentos e contrapartidas, que estimula o aumento da produção nacional, a redução da ociosidade industrial e a substituição de importações em áreas críticas para a economia. “Ao atrelar a concessão de créditos tributários à realização efetiva de investimentos produtivos, inovação tecnológica e geração de empregos, o programa alinha interesses públicos e privados em prol do desenvolvimento sustentável do setor”, declara.
Matéria-prima renovável e economia de baixo carbono
Entre as diretrizes do Presiq, destaca-se o incentivo ao uso de matérias-primas renováveis como vetor para impulsionar a economia de baixo carbono. O PL prevê a substituição gradual de insumos fósseis por alternativas como biomassa, etanol e óleos vegetais, explorando a vocação nacional para energia limpa e recursos naturais abundantes.
O programa também contempla medidas como a habilitação de biorrefinarias e o estímulo a investimentos produtivos e tecnológicos, com o objetivo de diversificar a matriz de matérias-primas e ampliar a competitividade global da indústria química nacional. Para a Abiquim, essa estratégia fortalece a chamada química verde e coloca o Brasil em posição de liderança na produção de insumos sustentáveis.
Além de promover a transição para matérias-primas mais limpas, a proposta enfatiza o aumento da utilização da capacidade instalada. Segundo estimativas, a medida pode reduzir em até 30% as emissões de gases de efeito estufa (GEE) por tonelada produzida, ao mesmo tempo em que impulsiona a geração de empregos e a atração de investimentos verdes.
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“O Presiq pode acelerar a transição da indústria química brasileira para processos mais sustentáveis, ao tornar economicamente viável a ampliação do uso de matérias-primas renováveis e a substituição de rotas intensivas em carbono”, afirma Passos. “Isso posiciona o Brasil na vanguarda de um movimento global que valoriza produtos sustentáveis, rastreáveis e com menor impacto climático”, conclui.
Soberania nacional
Segundo a Abiquim, o projeto se alinha à visão de reforçar a soberania nacional ao estimular a produção interna, reduzir a dependência de insumos importados e fortalecer cadeias produtivas essenciais. Dessa forma, cria condições para que o Brasil lidere áreas como a química de base renovável e o aproveitamento estratégico do pré-sal.
“O Presiq pode acelerar esse protagonismo ao dar escala e competitividade a rotas tecnológicas baseadas em biomassa, etanol, resíduos agrícolas e florestais. O que está em jogo não é apenas o desempenho de uma indústria, mas a capacidade de o país recuperar sua base produtiva, agregar valor aos seus recursos naturais e assumir sua essencialidade em cadeias globais cada vez mais exigentes em sustentabilidade”, afirma André Passos.