O julgamento de Bolsonaro e as variáveis além dos autos

O clímax do embate travado nos últimos meses entre Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal (STF), em especial, o ministro Alexandre de Moraes, se dará no próximo dia 2 de setembro quando inicia o julgamento do ex-presidente e aliados na ação penal sobre a tentativa de golpe de Estado no Brasil, em 2022. O que está em jogo neste julgamento ultrapassa a típica relação penal entre réu, acusação e juiz com condenados e absolvidos, o que se vê é um escalonamento de uma crise além do tribunal, que transbordou para outros poderes e as fronteiras brasileiras.

Não é incomum que grandes casos do Supremo mobilizem outros Poderes, mas, normalmente, as reações costumam acontecer depois da decisão já tomada, como ocorreu, por exemplo, no caso da vaquejada e do marco temporal das terras indígenas. Nos dois episódios, após a decisão do STF, o Congresso reagiu com leis no sentido oposto à decisão da Corte.

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Contudo, o diferente neste caso são as movimentações antes de qualquer sentença do Supremo. Claro que havia a pressão dos condenados pelo 8 de janeiro, mas, mesmo assim, o empenho do Legislativo em conseguir uma solução para uma futura condenação mostrou-se desproporcional frente a tantas outras pautas que o Congresso brasileiro precisa enfrentar.

No início de agosto, após a decretação das medidas cautelares a Bolsonaro, a bancada do partido do ex-presidente travou a pauta geral exigindo prioridade para a anistia ampla e irrestrita para os envolvidos na tentativa de golpe em 2022, o impeachment de ministros do STF e por mudanças no foro privilegiado. Demonstrando assim que o interesse em manter Bolsonaro no jogo político é prioridade para parlamentares de direita.

Agora, a tentativa mais recente de salvar Bolsonaro e parlamentares está na PEC das Prerrogativas. Entre as discussões estão a possibilidade de recursos para o plenário do STF após a condenação penal nas turmas ou mudanças no foro privilegiado, de modo que processos que hoje estão na competência do STF passem a ser de competência de instâncias inferiores da Justiça. Entre bolsonaristas, há esperança de tirar das mãos de Moraes a ação sobre a tentativa de golpe de estado.

A busca por solução além da tribuna não ficou restrita às fronteiras e envolveu outro país. A movimentação por apoio internacional feita por Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente, e aliados, trouxe sanções ao Brasil e às autoridades brasileiras antes mesmo do julgamento. Inclusive, a reação do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deixa claro que não haveria constrangimento com o Brasil de ofertar asilo político, mesmo frente às dúvidas sobre a existência ou não de uma perseguição política.

Do outro lado, diante dos ataques, como a sanção pessoal ao ministro Alexandre de Moraes pela Lei Magnitsky, a Corte também não arrefeceu. Não esperou o assunto decantar para agir. Ao contrário, reagiu rápido às investidas e tensionou ainda mais as relações. Como reação, ministros abriram novas investigações contra o ex-presidente e seus aliados, promoveram conversas de bastidores com parlamentares para evitar o andamento de projetos de anistia e trataram de deixar claro que atos estrangeiros não valem no Brasil, causando alvoroço no mercado financeiro.

Dessa forma, nos resta refletir sobre o que levou esse julgamento a transbordar os limites do Tribunal antes mesmo de qualquer sentença e as consequências desse cenário no julgamento. A princípio, a sensação é de que queimaram a largada buscando soluções fora da Justiça. Mas isso se deu porque o Judiciário deixou que rumores de uma condenação chamasse mais a atenção da sociedade do que o processo penal em si? Ou é mais uma estratégia antecipada de descrédito à Justiça? Embora Bolsonaro já esteja inelegível, as tentativas são para trazê-lo de volta ao campo eleitoral?

O certo é que o jogo está sendo jogado muito antes do julgamento e não há dúvidas que os ministros vão votar com variáveis além dos autos – e muitas delas colocadas pelo próprio réu, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

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