“Nós temos que preservar os princípios constitucionais da livre concorrência. Temos que fortalecer a competitividade logística brasileira. E, nesse aspecto, é inafastável o combate à concentração. Se o risco de concentração existe, e ele existe, isso tem que ser afastado porque, se não, o edital perde o sentido”, avaliou Edson Vismona, presidente executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), nesta sexta-feira, ao se referir ao leilão do Tecon Santos 10, no Porto de Santos (SP)..
A afirmação foi feita durante o evento “Concorrência no leilão do Porto de Santos”, realizado pela Casa JOTA, em Brasília, com o apoio da ICTSI, que teve como objetivo discutir as expectativas para o edital do arrendamento. Além de Vismona, também estavam presentes Augusto Wagner, especialista em planejamento estratégico e logística portuária, e Gesner Oliveira, ex-presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e fundador da GO Associados.
A ampliação do porto já é discutida há quase uma década. Agora, a expectativa é que as discussões finalmente avancem no Tribunal de Contas da União (TCU), que deve decidir pontos estratégicos do edital nas próximas semanas. O ministro relator é Antonio Anastasia. Um dos temas mais sensíveis se refere à proposta da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) de dividir o edital em duas fases, sendo que, na primeira, estaria vetada a participação de empresas que já controlassem terminais em Santos — medida que visa evitar concentração de mercado, mas que gerou críticas de companhias já atuantes.
Augusto Wagner Padilha, especialista em planejamento estratégico e logística portuária. Foto: Jéssica Ribeiro/JOTA
Vismona defendeu a posição da Antaq e o planejamento feito pela agência para garantir a segurança jurídica de todo o processo. “Não há nenhuma novidade no que a Antaq propôs. Ela está sendo responsável. Nós temos que garantir que isso ocorra porque, se não ocorrer, por fragilidades, como a judicialização, para justificar o ato administrativo, isso vai causar uma discussão judicial”, disse. “Temos que trabalhar com segurança jurídica. Como fortalecer isso? Tendo respeito ao mérito, à robustez técnica. E tudo isso está presente no relatório da Antaq”, completou.
Augusto Wagner destacou a importância do Porto de Santos, responsável por 30% da movimentação de cargas de exportação e importação do Brasil. “Estamos falando de um terminal que, no futuro, será responsável por 50 a 60% da movimentação de Santos. Isso demonstra a importância dele para o comércio exterior brasileiro, não só para São Paulo ou Santos, mas para todo o país. Quando todos estiverem operando, o Tecon Santos 10 será responsável por mais de um terço da movimentação de carga containerizada”, reforçou. A expectativa é de investimentos de R$ 5,6 bilhões ao longo de 25 anos.
Leia mais: Licitação em duas fases do Porto de Santos atende o interesse público, diz ex-Cade
Ao ser questionado sobre a importância de um acerto no modelo de concorrência em um momento de disputas geopolíticas, principalmente com os Estados Unidos, Wagner defendeu a diversificação. “A partir do momento em que você não diversifica, além de concentrar e ficar sujeito aos humores de quem detém o poder, você fica sujeito a decisões arbitrárias, ao uso de mecanismos que seriam econômicos para fins políticos. Isso é uma lição imperdível. Demonstra que ninguém pode ser dependente”, frisou.
Edson Vismona, presidente Executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial – ETCO. Foto: Jéssica Ribeiro/JOTA
Já Gesner Oliveira rebateu os argumentos críticos de que a decisão da Antaq poderia proibir a verticalização ou implicar perda de outorga. “Nem sequer há perda de outorga e, se houvesse, não deveria ser um critério”, afirmou.
Ele ainda lembrou que o Cade alerta quando a concentração de mercado atinge 75%. “O que aconteceu no mercado portuário? Desde 2022, tem havido crescimento dessa concentração. Era 68,8% em 2023 e chegou a 76,5% em 2024. É um fato que deve ser levado em conta, e a Antaq fez muito bem em considerar. Além disso, mercados adjacentes, como cabotagem e transporte marítimo, também registraram concentração.”
Para ele, a situação, se não resolvida, será ainda mais desafiadora no futuro. “Se qualquer incumbente atual vencer, nós estaríamos acima de 80% em 2034. Por que faríamos isso com o principal porto brasileiro? Com a infraestrutura essencial?”, questionou.
Gesner Oliveira, fundador da GO Associados. Foto: Jéssica Ribeiro/JOTA
Porto de Santos
O setor portuário movimentou 653,7 milhões de toneladas no primeiro semestre de 2025, um crescimento de 1,02% em relação ao mesmo período de 2024, de acordo com a Antaq. Este é o maior volume registrado para os seis primeiros meses do ano desde o início da série histórica, em 2010.
Assista ao evento na íntegra