Crises econômicas globais e as respostas trabalhistas

Nos últimos anos, a economia mundial tem sido marcada por sucessivas crises, considerando tensões geopolíticas, alterações de alíquotas tarifárias, embargos a determinados produtos, e mudanças nas políticas de importação, que acabam por desencadear impactos diretos no comércio internacional, afetando setores produtivos inteiros e exigindo adaptações rápidas das empresas.

Os impactos dessas medidas na economia brasileira vêm sendo amplamente discutidos. Segundo estimativas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, cerca de 55% das exportações brasileiras devem ser impactadas em 2025, por alguma razão específica, sobretudo, alterações de alíquotas tarifárias.

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Entre outros setores, elencamos alguns diretamente afetados.

Em 2024, o maior destino do café não torrado brasileiro foram os Estados Unidos, que importaram 16,7% do total vendido pelo país, no valor global de US$ 1,9 bilhão. A alteração das políticas tarifárias daquele país, pode, de alguma forma, impactar o setor.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente, metade da produção nacional é destinada a parceiros comerciais internacionais específicos, que, recentemente, alteraram suas políticas tarifárias.

A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes estimou perdas de US$ 1 bilhão com a alteração da política tarifária de parceiros comerciais.

Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Pescados, aproximadamente 70% das exportações brasileiras do segmento têm como destino o mercado da America do Norte. O setor enfrenta, ainda, a ausência de alternativas comerciais relevantes, em razão do embargo imposto pela União Europeia às importações de pescados do Brasil, vigente desde 2017.

No Brasil, esses movimentos repercutem também no mercado de trabalho, impondo desafios à manutenção de empregos, à renegociação de contratos e à revisão de condições laborais.

Atualmente, a MP 1309, de 13 de agosto de 2025, instituiu o Plano Brasil Soberano, com objetivo de oferecer mecanismos de crédito e financiamento às empresas exportadoras, as quais mantenham relação comercial com os Estados Unidos.

Na seara trabalhista, a novidade é a exigência de um compromisso para manutenção ou ampliação de empregos por parte das empresas que recorrerem às linhas de créditos oferecidas. A regulamentação específica, porém, ainda depende de ato do Ministério da Fazenda, que poderá inclusive autorizar compromissos alternativos, caso a manutenção de empregos se mostre inviável.

Diferentemente das medidas trabalhistas editadas durante a pandemia, a MP não dispôs de mecanismos diretos de flexibilização dos contratos de trabalho ou de redução de jornada e salário.

Com efeito, a adoção de estratégias trabalhistas juridicamente seguras torna-se fundamental para a preservação da capacidade produtiva das indústrias, bem como, para contenção de eventuais passivos.

Recentemente, houve evolução da legislação trabalhista e da jurisprudência, permitindo a adoção de respostas rápidas para enfrentamento, de forma segura, de períodos de crise, sejam globais ou nacionais, independente do motivo específico. Vejamos algumas delas.

1) Layoff

O layoff não é uma novidade no Brasil. Ele foi regulamentado em 2001 e ganhou destaque em 2015, quando montadoras de veículos usaram esse recurso para evitar demissões em massa. Em 2020, com a pandemia da covid-19, o instituto voltou a ser utilizado.

O recurso pode ser adotado por empregadores de duas maneiras: (a) redução salarial e, proporcionalmente, da jornada de trabalho; ou (b) suspensão temporária do contrato de trabalho.

No primeiro caso, a empresa pode diminuir a jornada em até 25%, por, no máximo, três meses, pagando a remuneração proporcional à referida redução.

A suspensão do contrato de trabalho pode durar por, no mínimo, dois meses e, no máximo, cinco meses. Nesse caso, os empregados podem receber bolsa de qualificação profissional, a qual se aproxima do conceito de seguro-desemprego, se cumprirem com os requisitos para o benefício. Também devem participar de um curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador. Durante o período, os trabalhadores têm direito à manutenção dos benefícios concedidos.

Ressalta-se que é obrigatória a participação do sindicato da categoria na definição do procedimento, a fim de que seja formalizado acordo coletivo.

2) Negociação de acordos coletivos especiais

A negociação coletiva pode contemplar certos ajustes quando não infringirem proteção constitucional, permitindo adequação dos custos à nova realidade. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, ao apreciar o tema 1.046 de repercussão geral, fixou tese no sentido de que são constitucionais as convenções e acordos coletivos que pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.

Desta forma, é possível mapear parcelas passíveis de negociação coletiva, avaliando reduções e indicadores objetivos de recuperação, a fim de reduzir custos da operação, ou ainda, criar alternativas para período de menor produção.

Ademais, é possível analisar a flexibilização ou cancelamento de certos benefícios previstos nas normas coletivas vigentes, sobretudo, ante ao recente entendimento dos Tribunais Superiores no sentido de que condições previstas em normas coletivas não se incorporam aos contratos de trabalho, ou seja, são passíveis e devem ser renegociadas com o encerramento da vigência dos instrumentos.

3) Planos de Demissão Voluntária (PDV)

Quando inevitável a redução estrutural do quadro de trabalhadores, o PDV configura instrumento apto a minimizar litígios e conferir previsibilidade. As melhores práticas incluem, dentre outros aspectos, a oferta de indenizações, manutenção temporária de benefícios e a participação em programas de recolocação profissional.

A concessão destas e outras vantagens, atreladas à participação do sindicato da categoria profissional no contexto da negociação, tem o condão, segundo posicionamento firme do STF, de validar quitação ampla e irrestrita de todas as parcelas do contrato de trabalho, a qual pode ser definida no âmbito do PDV.

4) Dispensa coletiva

Por fim, em um cenário mais extremo, no qual todas as outras medida sejam impraticáveis, as empresas devem levar em consideração que, em caso de dispensa de natureza coletiva, conforme tese firmada pelo STF, no julgamento do RE 999.435 (Tema 638), a participação do sindicato da categoria é imprescindível e deve se dar de maneira prévia à efetivação dos desligamentos, a fim de que o diálogo estabelecido permita possível contorno ou minimização de efeitos das pretensas resilições contratuais.

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O diálogo com a entidade sindical é espécie de exigência procedimental, que deve ser observada, ainda que eventuais tentativas de negociação restem fracassadas, sob pena de enfrentamento de questionamentos judiciais, inclusive, em âmbito coletivo, tais como pedidos de indenização aos trabalhadores dispensados.

5) Férias coletivas

Os artigos 139 e 140 da CLT autorizam a concessão de férias coletivas, seja para todos os empregados de uma empresa, seja apenas para determinados setores. Para tanto, exige-se a comunicação prévia ao sindicato da categoria e ao Ministério do Trabalho e Emprego, com antecedência mínima de 15 dias, além da afixação de aviso nos locais de trabalho.

Como se vê, o sucesso dessas medidas dependerá da qualidade do diálogo e negociação com entidades sindicais, do respeito aos limites legais e constitucionais e da capacidade da empresa de alinhar estratégias de gestão de pessoas às dinâmicas internacionais. Assessoria jurídica especializada é de fundamental importância neste cenário crítico.

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