A recente regulamentação da Lei 15.122/2025, conhecida como Lei da Reciprocidade Econômica, acendeu um sinal de alerta para a segurança jurídica e o futuro dos investimentos em inovação no Brasil. Embora o objetivo declarado seja proteger a competitividade brasileira contra medidas unilaterais adotadas por outros países, a lei introduz um mecanismo de retaliação arriscado e de efeitos imprevisíveis: a possibilidade de suspensão de direitos de propriedade intelectual.
Essa medida, mesmo que temporária, paira como uma espada de Dâmocles sobre setores que dependem de pesquisa intensiva, como o farmacêutico, o de biotecnologia e o de tecnologias da informação. Empresas que investem bilhões no desenvolvimento de novos medicamentos ou soluções tecnológicas contam com a previsibilidade jurídica das patentes para garantir retorno. A simples ameaça de suspensão desses direitos já é capaz de afastar investimentos e comprometer a transferência de tecnologia.
Com notícias da Anvisa e da ANS, o JOTA PRO Saúde entrega previsibilidade e transparência para empresas do setor
A legislação autoriza o Poder Executivo a adotar contramedidas econômicas com países cujas práticas sejam consideradas discriminatórias ou contrárias aos interesses comerciais do Brasil. Essas medidas podem incluir desde tarifas alfandegárias até, em caráter excepcional, a suspensão de obrigações relativas à propriedade intelectual.
Embora o processo preveja etapas de transparência e deliberação, com a participação da Câmara de Comércio Exterior (Camex), a inclusão da suspensão de patentes como possível resposta levanta preocupações. O Brasil, ao adotar tal postura, corre o risco de ser percebido como instável do ponto de vista regulatório — o que vai na contramão das obrigações assumidas no Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS), da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Além disso, a medida afeta não apenas empresas estrangeiras, mas também o ecossistema nacional de inovação. Startups brasileiras de biotecnologia que buscam parcerias internacionais para pesquisa conjunta, universidades públicas que licenciam tecnologias desenvolvidas em seus laboratórios e empresas nacionais que dependem de acesso a inovações estrangeiras para agregar valor aos seus produtos podem ser diretamente prejudicadas.
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É fundamental que o Brasil utilize com parcimônia esse novo instrumento legal. A própria lei o classifica como medida de exceção, e assim deve permanecer; caso contrário, poderá afastar o país dos principais fluxos de pesquisa e desenvolvimento globais — especialmente em um momento em que o mundo disputa ativamente talentos, investimentos e cadeias produtivas baseadas em tecnologia.
A melhor resposta a disputas comerciais continua sendo o diálogo e a diplomacia. A proteção à propriedade intelectual não é um entrave à soberania ou ao desenvolvimento, mas sim uma das bases para a construção de um ambiente propício à inovação, à geração de empregos qualificados e à inserção do Brasil na economia do conhecimento. Transformar a proteção à inovação em ferramenta de barganha política é um risco que o país não deve correr.