A recente visibilidade do setor de minerais críticos e estratégicos, alavancada pela crise internacional entre Brasil e Estados Unidos, deve levar para o PL 2780/2024 o debate sobre a necessidade de incentivos econômicos para o setor.
O objetivo inicial do texto era criar a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos (PNMCE), com governança própria, e incluir a atividade no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi).
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Mas o JOTA apurou que o relator, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), deve ampliar o escopo. O objetivo é que os incentivos econômicos beneficiem as três etapas da cadeia de mineração — prospecção e pesquisa, lavra e a transformação mineral —, sigam a lógica de mercado e fiquem de fora de contingenciamento orçamentário.
Também há previsão de que os mecanismos tenham um valor teto e com data para terminar, semelhante ao formato de regimes especiais criados recentemente. É o caso do hidrogênio, que teve o texto relatado pelo próprio Jardim no ano passado.
O relatório ainda está em elaboração, com previsão inicial de ser publicado na segunda quinzena de agosto. A ideia é tentar acelerar sua tramitação na Câmara. O autor da matéria, deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), tenta costurar um acordo com a presidência da Casa para aprovação da urgência e celeridade na votação.
A matéria tem potencial de atender às principais demandas de empresas menores que exploram minerais críticos e estratégicos — conhecidas por junior minings.
Diferentemente das grandes mineradoras, que geralmente têm acesso a incentivos, as pequenas e médias empresas do setor encontram dificuldade para conseguir financiamento com condições mais atrativas.
O BNDES criou no início deste ano uma linha de crédito para a atividade, mas com alta taxa de garantia que ainda se torna custosa para empresas menores.
As companhias também pressionam por um regime especial, além do Reidi, que possa fomentar o sistema produtivo, o que deve demandar uma análise de cadeias prioritárias.
O Brasil tem reservas significantes de muitos minerais considerados essenciais para a transição energética, como o lítio, cobre, nióbio, cobalto e terras raras. São elementos usados para fabricação de baterias, imãs e outros componentes do setor de tecnologia.
Participação do governo
O Ministério de Minas e Energia (MME) tinha uma proposta semelhante de criar um regime especial para minerais críticos e estratégicos dentro do seu Programa Mineração para Energia Limpa. A ideia, porém, foi deixada de lado pela dificuldade orçamentária.
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O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem dito em recentes entrevistas que uma política para o setor é indispensável e indicado apoio para uma mineração sustentável. A pasta trabalha na edição de um decreto com diretrizes mais gerais sobre a iniciativa antes da realização da COP30, que será realizada em Belém do Pará.
Ainda assim, não tem agradado muito ao setor produtivo. Agentes do mercado minerário ouvidos pelo JOTA criticam a falta de prioridade do ministério com a agenda de minerais críticos. A agenda está presente no MME desde 2023, mas só agora passou a ter maior tração.
Para evitar uma disputa de versões, a saída deve ser absorver parte do conteúdo proposto pelo governo no futuro relatório do projeto de lei. O entendimento entre deputados é de que a tramitação da matéria tem ganhado mais relevância.
Os trabalhos em relação à matéria contam com a participação do MME e da equipe econômica, mas não há, por enquanto, interlocução com o Planalto ou o Ministério de Relações Exteriores sobre o cenário internacional.
Há dúvidas sobre como os desdobramentos da crise entre a relação Brasil e Estados Unidos podem impactar o texto. O ministro da Fazenda chegou a dizer na última segunda-feira (4/8) que o governo brasileiro estaria disposto a conversar com a gestão de Donald Trump para buscar um acordo que envolvesse terras raras.
Outros problemas
A questão econômica deve ser o cerne do projeto de lei, mas há outros pontos que orbitam as discussões sobre a matéria.
O Brasil já tem uma política voltada para minerais estratégicos. A Pró-Minerais Estratégicos foi criada a partir de um decreto em 2021, na então gestão do governo Jair Bolsonaro, com objetivo de aumentar as reservas e a produção nacional.
Ela estipula quais são os minerais considerados estratégico e um comitê ligado à política aprova projetos. Eles estão passam a ter ajuda da Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (SE-PPI) no processo de licenciamento ambiental e na atração de investimentos
Uma das principais dúvidas é como ficará a interlocução da iniciativa já existente com a futura política de minerais críticos e estratégicos, caso seja aprovada.
A definição do que é o mineral estratégico é um dos pontos em que as políticas podem se sobrepor. Além disso, critérios que vão embasar os incentivos para determinados projetos podem variar entre as duas políticas.
O licenciamento é também um dos problemas levado pelo setor produtivo. O Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) tem defendido que é um dos principais riscos da atividade, que atrasa prazos e torna investimentos mais caros.
Outras empresas entendem que a atuação de órgãos como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) também tem dificultado o processo de licenciamento.
Embora o texto original do projeto de lei previsse programas de apoio ao licenciamento, é pouco provável que o marco legal de minerais críticos e estratégicos aprofunde as iniciativas nessa área.
O governo sancionou recentemente a Lei Geral do Licenciamento, aprovada pelo Congresso Nacional, e deve continuar o debate acerca dos vetos, do novo PL e MP enviados pelo governo.
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Uma das lacunas existentes na legislação de atividades minerárias é a taxonomia do setor. Ou seja, a definição do que são os minerais críticos e estratégicos e quais minerais podem ser considerados aptos a cada categoria.
Conceitualmente, minerais críticos têm oferta vulnerável e possível dependência de outros países, enquanto minerais estratégicos são cruciais para o desenvolvimento econômico e tecnológico do país. A lista de minerais que constam em cada categoria, portanto, varia a cada país.
É uma etapa que abre espaço para que determinados setores pressionem pelo reconhecimento de minerais importantes para sua cadeia produtiva.
A Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan), por exemplo, quer garantir que o urânio seja contemplado no projeto. Na prática, poderia beneficiar a exploração do mineral e teria impacto positivo para o setor de geração nuclear.