Juíza nega liminar para suspender multa de R$ 12,5 mi imposta à Netflix pelo Procon-SP

A juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, negou o pedido liminar em que a Netflix Brasil requeria a suspensão de uma multa de R$ 12,5 milhões imposta pelo Procon-SP em 2023. Para impor a multa, o órgão de defesa do consumidor afirma ter identificado várias cláusulas abusivas existentes nos termos de uso da plataforma de streaming, como alguns pontos das medidas adotadas para evitar o compartilhamento de senhas com outras pessoas, por exemplo. Ao negar a liminar, a magistrada considerou não haver plausibilidade do direito alegado nem perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo.

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No mérito, a empresa busca a a declaração de nulidade do auto de infração que levou à aplicação da penalidade milionária. Segundo a Netflix, caso a conclusão do auto de infração seja mantida, a empresa estaria sujeita a “verdadeira e intolerável insegurança jurídica”, visto que existem decisões judiciais em sentido oposto ao que foi concluído pelo Procon-SP.

A Netflix Brasil acionou o Judiciário por causa da multa milionária aplicada pelo Procon-SP contra a plataforma, em processo administrativo aberto a partir de reclamações de consumidores em relação ao streaming, e que tinha como finalidade investigar questões relacionadas à ferramenta ‘Assinante Extra’, disponibilizada em maio de 2023, e às medidas adotadas pela Netflix em relação ao compartilhamento irregular de contas de terceiros.

Quando impôs a multa de R$ 12,5 milhões, o órgão de defesa do consumidor alegou falta de informações ostensivas nos Termos de Uso na página inicial da Central de Ajuda ou do site da Netflix sobre o conceito de Residência Netflix, em como definir a Residência Netflix, como compartilhar a conta, e nos procedimentos para acessar a plataforma por assinantes que viajam com frequência para o mesmo lugar, têm mais de uma residência ou ficam longe de sua residência por longos períodos.

Além disso, segundo a apuração do Procon-SP, a plataforma estipula em contrato cláusulas abusivas que a isenta de suas responsabilidades, bem como subtrai do consumidor a opção de reembolso da quantia paga, colocando-o em desvantagem exagerada. Ainda de acordo com o órgão, além do conceito de residência Netflix não constar dos termos de uso que disciplinam a relação jurídica, as informações descritas, que guardam estreita relação com a fruição dos serviços, estão disponíveis na Central de Ajuda do site somente mediante a formulação de perguntas pelo consumidor, não possuindo assim atalhos para estas informações na página inicial da Central de Ajuda da plataforma.

Segundo a plataforma de streaming, no entanto, as infrações que lhe foram imputadas são baseadas  em leitura deturpada das cláusulas dos Termos de Uso ou na má interpretação da legislação aplicável, além de afrontar a jurisprudência, o  cenário fático e a inexistência de prejuízo ao consumidor.

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Também afirma que a regra de restrição ao compartilhamento da conta com pessoas que não moram com o assinante titular também é informada na Central de Ajuda e ressaltada no momento da contratação do serviço. “O assinante pode acessar sua conta em qualquer lugar, sem restrições físicas ou geográficas, inclusive por dispositivos que não integrem a Residência Netflix, bastando que realize um simples processo de verificação e confirme a autenticidade do seu acesso”, pontua.

A decisão da magistrada

Ao negar o pedido liminar, a juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti ressaltou que a autuação teve como base a falta de acesso imediato às informações essenciais sobre bens e serviços, que devem estar em local de destaque, de fácil visualização. Na avaliação dela, impor ao consumidor um caminho longo, cheio de subtópicos para ter acesso aos itens mencionados é uma prática que não se coaduna com o disposto no art. 31 “caput” do CDC, segundo o qual as informações sobre o serviço devem ser claras, ostensivas, isto é, de fácil visualização.

De acordo com Casoretti, como foi apontado na manifestação do Procon-SP, após pesquisas realizadas no site da plataforma em 13, 14 18 e 31 de julho de 2023, foi constatado que a Netflix não disponibilizava de forma ostensiva instruções sobre o conceito de Residência Netflix, sobre como defini-la, bem como sobre como compartilhar sua conta e os procedimentos para acessar a plataforma aos assinantes que viajam com frequência para o mesmo lugar, têm mais de uma residência e ficam longe da residência Netflix por longos períodos de tempo.

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Na visão da magistrada, atualmente é possível verificar que no site da Netflix, no final da página, existe o tópico “Central de Ajuda” que, ao ser acessado, mostra os tópicos “Conta e Faturamento”, “Corrigir um Problema”, “Reproduzir e Assistir”, “Introdução” e “Atalhos”. Ocorre que, segundo ela, para saber onde estão as informações sobre como usar a plataforma fora de casa, o consumidor precisa realizar o seguinte caminho: “Central de Ajuda”, “Reproduzir e Assistir”, “Recursos e Configurações” e, somente no final da página, na aba de “Usar a Netflix Fora de Casa”, é possível encontrar um tópico “Artigos Relacionados”.

A partir desta aba, segundo ela, aparecem os subtópicos como: “O que é uma residência Netflix”; “Como definir ou alterar uma residência netflix”; “O que fazer quando recebe uma mensagem ‘Sua TV não faz parte da residência Netflix desta Conta’”. “Como o consumidor pode saber que somente nas abas ‘reproduzir e assistir’ e ‘recursos e configurações’ é possível obter informações sobre ‘usar a Netflix fora de casa’?”, questionou. Para ela, as informações não estão disponíveis de forma fácil e ostensiva, fato este que dificulta a prévia ciência sobre as condições da prestação do serviço que se quer contratar.

A magistrada também considerou ser nula de pleno direito a cláusula contratual que “retira do consumidor a opção de reembolso da quantia já paga (art. 51, II, do CDC), porque configura prática abusiva, ocasiona o desequilíbrio contratual, uma vez que o consumidor pode deixar de continuar com o serviço durante todo o mês contratado e deve ter o direito ao reembolso pelo período não utilizado”.

Ela também aponta que o fato de disponibilizar os serviços por parceiros, como a Vivo e a Claro, não significa que a Netflix está livre de qualquer responsabilidade nestes casos.  “Ao contrário, é responsável pelos serviços de streaming que disponibiliza por meio de seus parceiros, pois todos estão inseridos na mesma cadeia de fornecimento. Para ampliar as vendas a autora contratou parceiros, empresas de telefonia, motivo pelo qual deve assumir os riscos de sua atividade empresarial sem se furtar aos seus deveres como fornecedora. Todas as empresas envolvidas na cadeia de consumo têm responsabilidade objetiva e solidária pela prestação de serviços”.

Em relação ao suposto excesso na aplicação da multa levantado pela Netflix, a magistrada afirmou que não é possível aceitar o argumento inicial, uma vez que a penalidade foi aplicada com “total observância aos limites do art. 57 do CDC, considerando não só o porte econômico da autora, mas também a gravidade das infrações”. Sendo assim, a magistrada indeferiu a tutela solicitada pela Netflix Brasil. Tendo em vista que o valor da multa foi depositado, Casoretti determinou a suspensão da exigibilidade do débito e que o Procon-SP se abstivesse de adotar medidas de cobrança ou execução, conforme postulado pela Netflix.

Procurado pela reportagem, o Procon-SP disse em nota que “lavrou multa em face da Netflix no ano de 2023, entre outros assuntos, por identificar várias cláusulas abusivas existentes nos seus respectivos termos de uso, as quais descumpriam o Código de Defesa do Consumidor”.

Segundo o órgão de defesa do consumidor, “a empresa teve oportunidade de apresentar defesa e de recorrer da decisão; porém, como a sanção foi mantida, deveria realizar o pagamento”. “Mas a Netflix ingressou com ação judicial para anular a multa aplicada pelo Procon-SP e agora o seguimento deste processo será determinado pela Justiça”, afirmou.

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O JOTA também procurou a Netflix Brasil, mas até o momento do fechamento da reportagem a plataforma de streaming não se manifestou. O espaço segue em aberto.

O processo tramita com o número 1069149-33.2025.8.26.0053 no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP).

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