O governo brasileiro abre no próximo dia 28/7 a consulta pública da Estratégia Nacional de Mitigação (ENM), documento que servirá como bússola para operacionalizar a redução das emissões de gases de efeito estufa até 2035.
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A proposta estabelece uma meta de corte de 48% nas emissões líquidas em 2030 em relação a 2005 – ano que marca o pico histórico das emissões nacionais –, e uma redução de 92% até 2035. A consulta ficará disponível até 18 de agosto e marca mais um passo do governo para apresentar, na COP30, um pacote de políticas climáticas com financiamento viável.
A ENM, coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), é descrita pelo governo como o “mapa de rota” para o Brasil alinhar desenvolvimento econômico e redução de carbono. É o documento que amarra metas setoriais, instrumentos financeiros e mecanismos regulatórios para consolidar o Plano Clima – uma das principais políticas públicas sobre o tema no país.
Metas setoriais: a aposta na floresta e o peso do agro
A estratégia distribui os esforços de mitigação entre sete setores. O agropecuário, responsável por mais de 30% das emissões nacionais, aparece com uma meta de redução líquida robusta: 122 MtCO₂e (milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente) até 2030, significando redução de 36% em relação ao valor de 2005. A previsão é que ações de baixa emissão no campo – como recuperação de pastagens e integração lavoura-pecuária-floresta – ajudem a reduzir o impacto de atividades como pecuária e uso de fertilizantes.
No extremo oposto, o setor de uso da terra e florestas é apontado como a maior aposta para remoção líquida de carbono. A meta prevê capturar 490 MtCO₂e até 2030, com base principalmente no combate ao desmatamento ilegal e na ampliação de áreas de regeneração florestal.
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É um número de carbono ‘negativo’, com um corte de 734% de emissões em relação aos números de 20 anos atrás. Essa escolha estratégica coloca a conservação ambiental como pilar central da política climática, mas também aumenta a dependência de medidas de governança e fiscalização – tradicionalmente pontos frágeis da política ambiental brasileira.
Já o setor energético, diferentemente do esperado em planos anteriores, tem margem espaçosa para crescimento líquido de 33% das emissões até 2030. A ENM reconhece o desafio de conciliar a expansão da oferta de energia – necessária para sustentar o crescimento econômico – com a descarbonização. Por isso, aposta mais na redução de intensidade de carbono por unidade de energia produzida do que em cortes absolutos. A indústria e os transportes aparecem com metas intermediárias, enquanto resíduos sólidos têm previsão de redução modesta.
Todos os setores têm, além dos números de meta para 2030, já indicativos para a meta de 2035. Os valores, porém, consideram cenários conservadores e ambiciosos de redução de emissões – uma margem que vai balizar o planejamento setorial.
Essa arquitetura tem relação direta com a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil no Acordo de Paris, estabelecida em MtCO₂e. Embora ambas as estratégias compartilhem a meta geral de neutralidade até 2050, a ENM detalha o caminho interno para atingi-la.
Estratégia será base para precificação
A ENM também é a plataforma que sustentará o Mecanismo Nacional de Precificação de Carbono. Na prática, o documento define os limites setoriais de emissões que servirão de referência para o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), aprovado em 2024 e que ainda aguarda regulamentação. O objetivo é viabilizar um mercado de carbono regulado capaz de atrair investimentos privados e dar previsibilidade para empresas que precisam ajustar suas operações.
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Para isso, a estratégia prevê a implantação de sistemas de monitoramento, relato e verificação (MRV) rigorosos. Esses instrumentos são fundamentais para dar transparência às reduções de emissões e para garantir que créditos de carbono vendidos no mercado tenham lastro em cortes reais.
O plano cita instrumentos financeiros e econômicos como catalisadores da transição. Programas como o EcoInvest, criado para fomentar linhas de crédito verde e alavancar recursos privados através de blended finance, fazem parte do esforço do Executivo para transformar intenções em ações financiáveis. Para o governo, um bom sinal no terreno de financiamento é o Fundo Clima, que aprovou em 2025 R$ 11,2 bilhões em investimentos. O BNDES, que opera a iniciativa, prevê alcançar R$ 10 bilhões até o final deste ano.
Vitrine para a COP30
O Plano Clima – e a ENM, como um dos seus braços operacionais – é a aposta do governo Lula para ajudar a consolidar o protagonismo internacional nas negociações climáticas. Com a COP30 programada para novembro em Belém, o Executivo quer chegar ao evento com um pacote fechado de políticas que demonstre capacidade de implementação e, principalmente, de financiamento.
As dificuldades para financiamento climático devem ser o eixo central da COP neste ano. A ideia brasileira é mostrar que é possível combinar investimentos públicos e privados para garantir a redução de emissões, sem abrir mão do desenvolvimento econômico.
Dentro dessa seara, um dos principais desafios é garantir que os países desenvolvidos cumpram suas promessas de financiamento climático, que foram consideradas insuficientes na COP29. Economistas da ONU estimam que os países em desenvolvimento precisem de US$ 1,3 trilhão por ano para lidar com as mudanças climáticas.