A estrada parecia totalmente pavimentada para Tarcísio de Freitas (Republicanos) ser ungido pela centro-direita brasileira, com a anuência do mercado e do setor produtivo, o substituto de Jair Bolsonaro (PL) na disputa contra Luiz Inácio Lula da Silva em 2026. No meio do caminho, no entanto, foi colocada uma pedra e, para transpô-la, o governador de São Paulo terá de se decidir entre a defesa dos interesses do estado que escolheu comandar ou os interesses da família que o projetou politicamente.
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Precisa decidir se São Paulo é um trampolim eleitoral, um estágio em sua trajetória administrativa. A política paulista não é para amadores. Na virada do século 19 para o 20, a oligarquia “13 listras”(pretas e brancas alternadas na bandeira de São Paulo) enfrentou, com a ajuda dos mineiros, é verdade, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Bahia e muitos outros estados para defender, com algumas décadas de grande sucesso, a economia cafeeira e os interesses de seus produtores. São Paulo, incluindo a capital, não costuma aceitar desaforos. José Serra (PSDB) perdeu uma eleição para prefeito em 2012 porque, em 2005, disse que jamais abandonaria a prefeitura, o que acabou fazendo em 2006. Deixou no eleitor a imagem de utilizar o cargo como “trampolim eleitoral”.
O dilema de Tarcísio, nascido e criado no Rio de Janeiro e com carreira política e administrativa desenvolvida em Brasília, não é pouca coisa. Os tempos são outros, mas, como deixou claro o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, a decisão de Tarcísio de negociar uma saída diplomática para o tarifaço imposto por Donald Trump foi interpretada como um “desrespeito” a algo valioso que a família conseguiu, a sanção que afeta diretamente a economia paulista.
Como funcionário público número 1 do estado, Tarcísio deveria se contrapor às medidas anunciadas pelo presidente americano. Porém, há uma máxima entre os marqueteiros políticos: o eleitor é capaz de aceitar tudo, menos a traição. Exemplos de que não se pode desprezar esse ensinamento são extensos. Para ficar no mais recente e restrito ao estado de São Paulo, o ex-governador João Doria pagou o preço por ter, na pandemia da Covid-19, rompido com os Bolsonaro.
Não é simples para Tarcísio se indispor com a chamada parcela “bolsonarista” do eleitorado. Simplesmente porque ela representa, segundo as pesquisas, algo em torno de 25% dos brasileiros. Tarcísio também conhece bem a fúria e o poder dos canhões virtuais da família Bolsonaro, além de jogos rasteiros que são travados nos bastidores, inclusive neste momento.
Da mesma forma que não é simples para Tarcísio virar as costas para a economia paulista, para os produtores do estado, e ser acusado em uma campanha de simplesmente usar São Paulo como “trampolim” para um projeto maior, a Presidência da República. Ou seja, Tarcísio terá de caminhar no fio de uma lâmina muito fina para sair da crise criada pelo trio Trump-Eduardo-Jair com o mesmo cacife que ostentava até o início deste mês.
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Tarcísio é jovem, tem ideias e projetos interessantes para a gestão pública. Seu governo, ao menos até agora, segue imune a grandes escândalos e crises. Seu único caminho para chegar muito forte à candidatura presidencial com apoio da família Bolsonaro é ter a benção do ex-presidente, neste momento, inelegível. O salto no trampolim da política ficou muito mais arriscado para 2026 com o tarifaço e a indisposição dos filhos de Bolsonaro. A segurança de concorrer ao Planalto em 2030 voltou a ter forte apelo entre o governador e seus aliados.
Tarcísio está sendo testado: ideologia ou economia? Interesses da família Bolsonaro ou o poderoso agronegócio paulista?. O que vai pesar mais? O ódio dos Bolsonaro ao “Xandão” (ministro Alexandre de Moraes, do Supremo) ou o bolso se esvaziando dos produtores paulistas?