Com o mercado de data centers em plena expansão no Brasil nos últimos anos, a conexão, atrelada ao fornecimento da energia, tem sido um dos maiores desafios para o crescimento dos negócios do setor no país. Isso é o que apontam os especialistas da área que discutiram a temática durante evento promovido pela Associação Brasileira de Data Center (ABDC), nesta quarta-feira (25/6), em São Paulo (SP), sobre os desafios energéticos para o setor de data centers no Brasil.
Marcela Martins, diretora de Gestão Energética da Ascenty, afirma que, em comparação a 2012, quando o mercado ainda estava engatinhando no Brasil, a disponibilização e a conexão com os centros de energia era de maior acesso via distribuidoras. Hoje em dia, segundo ela, esse acesso tem se tornando mais inviabilizado, visto que o setor atualmente opera com grandes data centers, de 100 a 150 MW de energia – o que ela classifica como um dos fatores que torna a conexão um dos maiores desafios para o setor.
Eduardo Shuto, diretor de Desenvolvimento Corporativo e Estratégia Latam da Equinix, compartilha da mesma visão. Atualmente, em seu ponto de vista, um grande desafio para o mercado de data center é o de assegurar e ter acesso à energia, principalmente no Brasil. “O problema maior não é nem a geração, é ter essa conexão com a energia”, pontuou. Esse desafio de acesso, segundo Shuto, inclusive começa a levantar questionamentos acerca da garantia de energia aos projetos de 2029 em diante, visto que o ciclo de desenvolvimento para o setor é de 3 a 4 anos para garantia do acesso energético.
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Para Eduardo Sodero, CEO da Takoda Data Centers e presidente do conselho da ABDC, o tema da energia é super importante para a indústria de data centers, principalmente pela energia ser “o insumo mais importante do setor”. Sodero diz que, devido a essa importância, os operadores do mercado de data centers estão sempre buscando uma otimização e sustentabilidade dentro do setor, além de discutir as complexidades e desafios que surgem através dessa dinâmica com o setor elétrico.
Por outro lado, Joe Bergamaschine, COO da Atlantic Data Centers e CSO da Um Telecom, acredita que a conexão não é o único desafio a ser enfrentado pelo setor neste momento. Bergamaschine considera que as questões políticas também tornam o desenvolvimento do mercado de data centers desafiador no país. Por essa razão, considera ser necessário desenhar, em conjunto com os atuantes do setor e do governo, estratégias para transformar o Brasil em um grande polo de investimentos e de operação de data centers para o futuro.
Demora no processo de licenciamento para transmissão de energia
Um outro gargalo elencado pelos painelistas e que também acaba por afetar o desenvolvimento do mercado é o da demora no processo de licenciamento para transmissão de energia por parte do Operador Nacional de Sistema Elétrico (ONS).
Hoje, segundo os especialistas, o prazo mínimo do processo de solicitação de acesso à rede básica de energia é de 1 ano, com toda a tramitação do licenciamento podendo ser concluída entre 36 a 40 meses. De acordo com os palestrantes, a duração do procedimento pode ser onerosa aos investimentos e também para a competitividade do mercado nacional, principalmente em comparação com países menos populosos que o Brasil, como a Austrália, em que o campo de data centers é muito mais desenvolvido.
Apesar dos desafios mencionados, Bergamaschine considera que o Brasil se encontra em um momento de oportunidades de desenvolvimento e expansão do mercado de data centers. De acordo com ele, os obstáculos não são exclusivos do território nacional e, por isso, acredita no desenvolvimento do setor a longo prazo.
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Sodera também considera o momento oportuno, principalmente em razão do bom relacionamento que o mercado de data centers possui com os seus stakeholders. Segundo ele, esse “relacionamento forte” com os players do setor elétrico tem contribuído para que eles entendam melhor as necessidades de um campo de data center, bem como tenham maior vontade em colaborar para que os desafios do mercado sejam superados com mais celeridade.
Para o sistema de transmissão não ser um gargalo para os projetos de data centers no Brasil, Daniel Tavares de Souza, consultor-técnico da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), disse que o órgão tem realizado estudos prospectivos, considerando os potenciais projetos já mapeados. Segundo ele, apesar de a infraestrutura de transmissão ser robusta, ela não foi planejada para conectar em curto espaço de tempo grandes montantes de carga. “Tem casos, por exemplo, que equivale a uma antecipação de 10 anos do mercado de uma distribuidora”, afirmou.
Desse modo, mencionou que, para maior efetividade desses estudos, torna-se fundamental para a EPE ter maior previsibilidade de local e do montante de carga, também em conjunto aos futuros projetos de data centers. O consultor-técnico apontou que as cargas de grandes projetos de data centers tendem a ser da escala de centenas de MW, e que o fator locacional tem se mostrado relevante na decisão dos investidores.
”A gente quer viabilizar e o país acredita no setor de data centers. Estamos trabalhando para reduzir esse tempo de estudo, mas existem outras questões. O prazo de implantação e de fabricação, por exemplo”. Souza também disse que o Ministério de Minas e Energia (MME) também tem feito esforços para trabalhar em uma portaria que otimize o processo de transmissão de energia.
Ao concluir sua fala, o consultor-técnico da EPE ressaltou que a demora na fabricação e no acesso de energia são desafios mundiais, e que dificilmente os outros países tenham um processo mais rápido do que o Brasil. “Temos conversado com players de data center que têm colocado que, nos Estados Unidos, também não é tão simples assim, tanto em questão regulatória quanto em transmissão e implantação, que é mais alongável que o nosso. Na Alemanha, também. São dez anos para a linha de transmissão entrar em operação”, declarou.
Política Nacional de Data Centers deve ser anunciada em breve pelo Ministério da Fazenda
Em busca de investimentos internacionais no setor, Fernando Haddad, ministro da Fazenda, anunciou no início de maio, durante a a 28ª Conferência Global do Instituto Milken, em Los Angeles (EUA), a pretensão em antecipar os efeitos da reforma tributária para o setor de data centers, por meio do lançamento da Política Nacional de Data Centers. Segundo Haddad, a antecipação dos efeitos da reforma permitirá que todo investimento no Brasil, no setor de data centers, seja desonerado, e que toda exportação de serviços a partir dos data centers seja também completamente desonerada.
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Na ocasião em que adiantou a medida, Haddad destacou a meta em associar tecnologia à sustentabilidade no país. “Nós queremos que a economia digital seja simultaneamente digital e verde”, disse. O ministro da Fazenda ainda afirmou que o objetivo do governo é prover os data centers de energia limpa e processar os dados com segurança cibernética e jurídica, a fim de oferecer o “melhor tipo de serviço possível”.
De acordo com a Fazenda, a medida pretende atrair cerca de R$ 2 trilhões em investimentos no Brasil na próxima década. A expectativa era de que o o governo federal enviasse ao Congresso ainda em junho a proposta de isenção de tributos federais aos bens de capital ligados aos data centers. Contudo, até o momento não há previsão de lançamento da Política Nacional.