Tentativa de golpe: STF torna réus 9 militares e um PF, mas afasta acusação de general e coronel

Por unanimidade, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) tornou réus 10 dos 12 acusados por tentativa de golpe de estado no Brasil em 2022 no julgamento do chamado núcleo militar durante essa terça-feira (20/5). Dos quatro julgamentos da denúncia oferecida pelo procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet, essa é a primeira vez que dois acusados não viram réus. São eles o general Nilton Diniz Rodrigues e o coronel da reserva Cleverson Ney Magalhães.

Na avaliação dos ministros, não há justa causa para transformar os dois militares em réus, pois a PGR não conseguiu comprovar a participação dos dois na trama golpista. Para o relator, Alexandre de Moraes, “não há indícios mínimos de ocorrência criminal”. Para Flávio Dino, “não há standard [de provas] mínimo em relação a eles. O que há, é frágil”. Os dois foram citados em conversas, chegaram a ir em reuniões, mas não ficou comprovada a participação deles nos atos golpistas.

O grupo julgado nesta terça-feira é apontado pela PGR como o responsável por executar o plano golpista, como sequestro e morte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice, Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes. Dos réus, 9 são militares da reserva e da ativa, entre eles, membros das Forças Especiais, os chamados “kids pretos” e o único civil é o policial federal que participou da segurança de Lula, Wladimir Matos Soares.

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Na semana passada, a PF entregou um relatório com áudios de Soares que demonstravam a disposição do grupo em executar o golpe, inclusive com o uso de armas, com “poder de fogo elevado” para “empurrar quem viesse à frente”. No entanto, o relator, Alexandre de Moraes, informou que os áudios não seriam usados no julgamento porque foram adicionados recentemente aos autos.

Até o momento, o STF já tornou réus 31 dos 34 denunciados pela PGR — falta apenas o julgamento do recebimento da denúncia do influenciador Paulo Figueiredo, que mora fora do Brasil. Ele é neto do ex-presidente João Figueiredo, o último mandatário da ditadura militar, entre os anos de 1979 e 1985. Segundo a denúncia da PGR, o influenciador buscou forjar um cenário de coesão dentro do Exército Brasileiro sobre a necessidade da intervenção armada.

Os dez novos réus responderão pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima e deterioração de patrimônio tombado.

Viraram réus:

Bernardo Romão Correa Netto (coronel do Exército);
Estevam Cals Theophilo Gaspar De Oliveira (general da reserva do Exército);
Fabrício Moreira de Bastos (coronel);
Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel);
Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel);
Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel);
Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel);
Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel);
Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros (tenente-coronel); e
Wladimir Matos Soares (agente da Polícia Federal)

Recebimento da denúncia

Moraes justificou o recebimento da denúncia contra os indiciados por entender que houve uma organização criminosa visando um golpe de Estado para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder. Em sua avaliação, os núcleos trazidos na denúncia do PGR se complementam: os líderes, operacional, o das fake news e o militar.

Durante o voto, o relator criticou os juristas que apoiavam a interpretação do artigo 142 da Constituição no sentido de que haveria espaço para um poder moderador às Forças Armadas. “É sempre bom repetir: o artigo 142 não tem absolutamente nada a ver com Poder Moderador. E os juristas que assim escrevem, não são juristas, são golpistas”.

O presidente da 1ª Turma do STF, Cristiano Zanin, lembrou do julgamento de abril de 2024, em que, por unanimidade de votos, o plenário afastou qualquer interpretação de que as Forças Armadas exerçam o poder moderador entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. O relator da ação foi o ministro Luiz Fux.

Moraes afirmou que nem mesmo os militares acreditavam na fraude nas urnas e que o discurso era um “antídoto se perdessem eleições”. O ministro também criticou o uso excessivo de palavrões e ofensas nos grupos de militares. “Parece que a característica dos militares golpistas é a falta de educação aguda para poder ser promovido, talvez”.

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Durante o julgamento, o ministro Flávio Dino reforçou que as penalidades e crimes imputados aos réus foram aprovadas em uma convergência entre Executivo e Legislativo, durante a administração de Jair Bolsonaro.

Já a ministra Cármen Lúcia reforçou que nenhum advogado na tribuna negou o golpe. “Ninguém diz que não teve tentativa de golpe” e afirmou que a democracia venceu, tanto que os acusados estão podendo se defender, o que em uma ditadura não seria possível. Para isso, ela citou Sobral Pinto, advogado que chegou a ser preso durante a ditadura militar, em 1980.

Fazem parte da 1ª Turma os ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Luiz Fux.

Defesas

O advogado do general Nilton Diniz Rodrigues, Cléber Lopes, comemorou o fato de seu cliente não ter se tornado réu. “O Supremo agiu, como tem agido, fazendo sempre a ressalva que esse momento é um juízo de prelibação, análise provisória da acusação”. Questionado se o não recebimento da denúncia poderia ser interpretado como um bom sinal para os demais réus, Lopes disse:

“Não imagino que todos que tiveram a denúncia recebida, sejam, necessariamente condenados. A instrução pode mudar a perspectiva dos ministros, trazer uma informação que ainda não existia. O contraditório é sempre saudável para o esclarecimento dos fatos”.

Segundo o advogado, o militar participou da reunião do dia 28 de novembro de 2022, de cunho golpista, mas ele “não reagiu, não respondeu, não disse nada a ninguém, não influenciou, não tentou influenciar o comandante do Exército”, disse Lopes.

Segundo a PGR, a presença de Nilton se justificou porque, na ocasião, ele exercia a função de assistente do General Freire Gomes, comandante do Exército. Assim, a necessidade do apoio de Nilton se justificava exatamente por sua proximidade com Freire Gomes, que repelia ações intervencionistas.

O advogado de Cleverson Ney Magalhães, Luiz Mário Félix de Moraes Guerra, também comemorou o não oferecimento da denúncia, mas não acredita que a decisão do STF seja o reflexo da pressão sobre o julgamento da trama golpista e do tamanho das penas. “A decisão é absolutamente técnica e funda-se na insuficiência histórica mínima para efeito de formular uma acusação criminal”.

De acordo com a denúncia da PGR, a participação do coronel Cleverson Ney Magalhães na reunião do dia 28 de novembro seria importante para a consolidação do golpe por ele pertencer ao Comando de Operações Terrestres (COTER).

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