Anvisa avança no debate sobre o marco regulatório de medicamentos biossimilares

No último dia 28 de junho, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concluiu a avaliação das contribuições recebidas por meio do Edital de Chamamento 15/2022[1], que teve como objetivo entender os principais desafios para o desenvolvimento e aprovação de produtos biológicos utilizando a via de comparabilidade[2]. A partir desses resultados, no dia 31 de julho, por aproximadamente sete horas, a Anvisa recebeu representantes da indústria farmacêutica e autoridades governamentais para discutir medicamentos biossimilares no Brasil.

Oficialmente, foram revisados os prós e contras da isenção dos requisitos de estudos não clínicos e clínicos ao avaliar pedidos de registro de comercialização de biossimilares, intercambialidade e referências internacionais. Na prática, isso demonstrou o comprometimento da agência (e do governo federal) com a ampliação de acesso a medicamentos biossimilares e à capacidade do Brasil de competir nessa área.

Fabricantes públicos, a associações da indústria, bancos oficiais, instituições de financiamento, instituições acadêmicas e principais representantes dos ministérios brasileiros expressaram palavras substancialmente semelhantes sobre como estruturar e fortalecer uma verdadeira indústria brasileira de biossimilares. Embora vários atores relevantes não estivessem presentes, a pauta dos biossimilares demonstrou estar em ascensão. De acordo com estimativas, o mercado global de produtos biológicos atingiu US$ 348,03 bilhões em 2022 e deve ultrapassar US$ 620,31 bilhões até 2032.

O crescimento do mercado de biossimilares pode ser atribuído a diversos fatores. Primeiramente, há uma crescente demanda por medicamentos biológicos mais acessíveis. Isso é impulsionado pela necessidade de reduzir os custos com saúde e, ao mesmo tempo, oferecer tratamentos eficazes e mais modernos. Num dos países com o sistema de saúde universal mais extenso do mundo, o governo brasileiro está inclinado a aumentar os recursos destinados e o apoio regulatório para os biossimilares nacionais, segundo apontam os discursos das autoridades no encontro do dia 31.

Acredita-se que, em futuro próximo, o mercado experimentará uma maior aceitação dos biossimilares entre os profissionais de saúde e os pacientes. À medida que mais evidências surgem em relação à sua segurança e eficácia, os profissionais de saúde e os pacientes se tornarão mais dispostos a utilizar essas alternativas aos medicamentos biológicos de referência. Além disso, tendo em vista a evolução do perfil populacional, a prevalência de doenças e transtornos, especialmente condições crônicas, está aumentando, o que demanda tratamentos acessíveis e econômicos, que os biossimilares prometem oferecer.

A adoção de produtos farmacêuticos biossimilares no Brasil tem sido lenta em comparação com outros países. Mas, observando a experiência de países europeus e asiáticos a expectativa é de que esse avanço em breve ganhará velocidade.

A adoção limitada atual se deve a três fatores principais. Em primeiro lugar, os profissionais de saúde demonstram hesitação em mudar os pacientes do medicamento biológico de referência para um medicamento biossimilar. Em segundo lugar, os pacientes mostram relutância em fazer essa transição. Em terceiro lugar, o ambiente regulatório ainda precisa ser validado. A Anvisa aprecia essa situação e tem agido para desenvolver um modelo adequado.

No final de 2022, ao publicar o Edital de Chamamento 15/2022, a agência pretendia captar informações de mercado sobre os desafios críticos e dificuldades para o desenvolvimento e aprovação de produtos biológicos por meio da via comparativa, com o objetivo, justamente, de informar futuras atividades regulatórias. Entretanto, pode-se dizer que houve uma quantidade modesta de sugestões e comentários. A participação foi tímida, com apenas 18 contribuições – 2 de associações da indústria e 16 de empresas individuais.

Ao analisar as contribuições, pode-se mapear oportunidades e desafios, principalmente focados em (a) pedidos para a Anvisa expandir padrões de harmonização regulatória e contar com avaliações de agências internacionais certificadas e orientações da OMS; (b) reclamações sobre a falta de pacientes/participantes para estudos farmacocinéticos; (c) necessidade de diretrizes sobre o uso de Evidências do Mundo Real (Real Word Evidence – RWE), isto é, não se limitando a ensaios clínicos; (d) a possibilidade de utilizar (e importar) um produto biossimilar estrangeiro para estudos no Brasil; e (e) a intercambialidade automática, ou seja, um biossimilar que obtiver registro na Agência seria automaticamente intercambiável com o produto biológico de referência, o que não ocorre atualmente. A Anvisa revisará as regulamentações existentes para produtos biológicos (e biossimilares) entre 2024 e 2026. Esses e outros itens farão parte de sua agenda regulatória.

Os biossimilares são claramente uma prioridade do Poder Executivo para aprimorar a capacidade tecnológica das indústrias brasileiras. O governo tem o poder de facilitar a transformação estrutural por meio de capacidades institucionais e alinhamento pragmático com oportunidades de mercado. Atualizar-se sobre os planos brasileiros é indispensável no segmento onde o processo é o produto. Capacidade de produção local, suprimentos, desafios ambientais, capacidade laboratorial, equipamentos, dispositivos, inovação aberta, desafios renovados de propriedade intelectual e lacunas regulatórias são alguns dos aspectos que os envolvidos no setor farmacêutico devem abordar.

[1] ANVISA. MEDICAMENTOS: Anvisa divulga dados do edital sobre produtos biossimilares, 28/06/2023. Disponível em: <https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2023/anvisa-divulga-dados-do-edital-sobre-produtos-biossimilares>. Acesso em: 01/08/2023.

[2] Íntegra do Edital de Chamamento n. 15/2022 disponível em: <http://antigo.anvisa.gov.br/documents/10181/6511806/EDITAL+DE+CHAMAMENTO+N%C2%BA+15+DE+7+DE+NOV+2022+-+DOU+-.pdf/551e9f85-67e1-4e46-b238-af915745677f>.

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